Governo de Costa recupera paixão de Sócrates

O projeto de alta velocidade vai ser dividido em três fases. Ainda há dúvidas em relação ao seu financiamento, mas uma das hipóteses poderá passar pelo modelo PPP. 

Depois de muito impasse, o projeto de alta velocidade foi finalmente apresentado, mais uma vez, pelas mãos de um Governo socialista. José Sócrates foi um dos grandes defensores do ‘famoso TGV’ que acabou por nunca sair da cartola. Já em 2009, o ex-governante afirmava: «Oiço para aí muita gente dizer que devemos adiar. (…) Isto é altura não para discutir de novo, nem para adiar, este é o momento justamente para o fazer», frisando que o país não pode correr o risco de não avançar com o TGV, pois «os custos de não fazer são custos que Portugal não deve suportar». No ano seguinte considerou que «desistir do TGV seria contra os interesses nacionais».

Agora é a vez de o Governo de António Costa ressuscitar o projeto. Depois de ter dito em 2018 que o projeto de alta velocidade era um «tema tabu», esta semana foi conhecido em pormenor, mas não agrada a todos. O autarca de Faro não poupa críticas ao projeto ao considerar que o Governo se esqueceu «mais uma vez» do Algarve na apresentação da ligação rápida Porto-Lisboa, lamentando que os políticos só se lembrem da região nas férias de verão. Também o presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve, José Apolinário, defendeu a necessidade de criar uma linha ferroviária de alta velocidade entre Faro e as cidades espanholas de Huelva e Sevilha.

O responsável disse ainda que era «urgente avançar com os projetos de modernização da linha ferroviária entre Tunes e Terra Vã», estimando que a intervenção necessita de um investimento de 253 milhões de euros e que iria «uniformizar a velocidade do comboio ao longo de todo o trajeto» entre Faro e Lisboa.

Já para o presidente da Câmara de Guimarães, Domingos Bragança, a localização ideal para a futura estação do comboio de alta velocidade seria a freguesia bracarense de Escudeiros, vizinha da freguesia vimaranense de Leitões. «Traria equidistância entre Braga, Guimarães e Famalicão», afirmando que está a trabalhar com o Governo «o tramo para a ligação ferroviária do concelho à nova estação da rede de alta velocidade». 

O que foi oficializado? A ligação entre Porto e Lisboa em apenas uma hora e 15 minutos, sem paragens. Um projeto que será construída em três fases. Pedro Nuno Santos falou mesmo em «revolução», enquanto António Costa preferiu garantir que o país tem «condições financeiras» para avançar com o projeto, com «tranquilidade» e sem «sobressaltos que o ponham em causa».

De acordo com o primeiro-ministro, o projeto de alta velocidade é «essencial» para responder às «necessidades de desenvolvimento» do país e tem «potencial para o futuro» de Portugal. Os investimentos levados a cabo por este Governo, defendeu, são «soluções para o futuro e não problemas que ficam para outros resolver». Uma das soluções em cima da mesa poderão passar pelas famosas Parcerias Público Privadas (PPP). 

Já o ministro das Infraestruturas garantiu que o Executivo quer que «mais pessoas escolham o transporte coletivo e deixem o carro em casa», daí falar em revolução, revolução essa que «teve um primeiro momento de recuperação e estabilização. Era preciso travar a queda», sublinhou, dando como exemplo alguns dos passos já realizados na ferrovia, nomeadamente as carruagens recuperadas que estão a circular.

«Esta transformação começa pela forma como vemos o transporte ferroviário numa sociedade moderna. O que todos desejamos e aquilo para que trabalhamos é para que mais pessoas escolham o transporte coletivo e deixem o carro em casa. O comboio é a peça central de qualquer rede de transportes coletivos», acrescentou, reconhecendo que para isso é preciso dar «confiança» às pessoas.

Em cima da mesa
A linha de alta velocidade Lisboa-Porto vai permitir triplicar a oferta, disponibilizando 60 serviços diários – 17 serão diretos, nove vão ter paragens em estações intermédias e 34 serão serviços mistos, isto é, usam, em parte, a linha de alta velocidade e noutra a linha convencional. Também a oferta deverá subir. A garantia foi dada pela Infraestruturas de Portugal (IP), que prevê que o número de passageiros passe de seis para 16 milhões. «A nossa expectativa é que passemos a ter 60 serviços na linha de alta velocidade», afirmou Carlos Fernandes, . E acrescentou: «Esperamos triplicar a oferta na rede no eixo entre Lisboa e Porto e a procura irá reagir bem a este tipo de oferta, uma vez que esperamos também triplicar a procura». 

O total do projeto está avaliado em 4.900 milhões de euros até 2030. A primeira fase, o troço entre Porto e Soure, que deverá ficar concluído até 2028, tem o tempo de percurso estimado de uma hora e 59 minutos. O valor de investimento é de três mil milhões de euros.

Já o segundo troço, entre Soure e Carregado, que irá custar 1.900 milhões de euros, verá luz ao fim do túnel em 2030. Este trajeto prevê diminuir o tempo de percurso para uma hora e 19 minutos. Por seu lado, a terceira fase, entre Carregado e Lisboa, será construída mais tarde e permitirá atingir a duração final de uma hora e 15 minutos de toda a ligação.

Em relação à velocidade, a nova linha Porto-Lisboa irá circular a 300 km/h. «Esta velocidade foi selecionada de entre vários cenários de forma a permitir um tempo de viagem que seja claramente competitivo com o transporte aéreo e que permita também ligações competitivas entre um leque maior de cidades, que inclui Leiria, Coimbra e Aveiro, mas também Braga, Guimarães, Évora, Faro, Figueira da Foz ou a Guarda, para dar alguns exemplos», disse o Governo, na sua nota explicativa.

E quanto aos preços dos bilhetes, a decisão caberá aos operadores. «No entanto, tendo em conta que os custos operacionais não serão superiores aos atuais, os bilhetes deverão ter um custo médio semelhante ao dos bilhetes do serviço Alfa».

Já em relação ao plano de concretização dos projetos de alta velocidade, Carlos Fernandes adiantou que os objetivos passam por «finalizar os estudos prévios e de impacto ambiental» e «fechar» os documentos para lançar os concursos públicos.

Os estudos prévios e o Estudo de Impacto Ambiental relativos ao primeiro troço serão submetidos à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) até ao final de outubro e os documentos relacionados com o segundo troço até ao final de novembro, referindo que «com estas entregas nestes prazos, esperamos ter as declarações de Impacte Ambiental até ao final do primeiro semestre do próximo ano», lembrando que estes instrumentos são fundamentais para o lançamento dos concursos públicos.