OE: o que muda para empresas e famílias

O Governo multiplicou-se em anunciar medidas, mas há silêncio em torno da TAP. Executivo remete explicações para mais tarde. Veja o que muda no orçamento das famílias e empresas. 

Por Daniela Soares Ferreira e Sónia Peres Pinto

Uma das grandes novidades do orçamento para o ano que vem diz respeito à tributação em 28% dos investimentos em criptomoedas. Também há mais apoios para fazer face à inflação e a promessa de rever o cálculo das pensões. A habitação não escapa e há compensações para senhorios e benefícios fiscais para quem tem crédito à habitação. Para as empresas há a garantia de que imposto sobre lucros excessivos avança ainda este ano, mas mantêm-se as contribuições extraordinárias para energia e banca. Dividendos do Banco de Portugal e Caixa Geral de Depósitos continuam a encher cofres do Estado. 

FAMÍLIAS

IRS
Os escalões do IRS vão ser atualizados em 5,1% em 2023. O limite do primeiro escalão de rendimentos coletável avança de 7.116 euros para 7.479 euros anuais, uma subida de 363 euros face ao valor atual. Já o escalão seguinte, com uma taxa de 23% e que atualmente está balizado entre os 7.116 e os 10.736 euros, passa a aplicar-se à franja de rendimentos que oscilam entre os 7.479 euros e os 11.284 euros. O limite do 3.º e 4.º escalões passam, respetivamente para 15.992 euros (mais 776 euros do que o atual) e 20.700 euros (mais 1.004 euros). Nos dois escalões seguintes, sobre os quais incidem taxas de 35% e 37%, o acréscimo do limite máximo seria de 1.279 euros (para 26.355) e de 1.875 euros (para 38.632 euros).

No 7.º e 8.º escalões (com taxas de 43,5% e 45%, respetivamente), o limite superior sobe para, seguindo a mesma ordem, 50.483 euros e para os 78.834 euros, passando também a ser este o valor a partir o qual os rendimentos passam para o 9.º e último escalão e são sujeitos à taxa mais elevada do IRS, que é atualmente de 48%.
Feitas as contas, as famílias vão poupar 500 euros todos os anos a partir de 2023, considerando as alterações ao IRS que foram introduzidas desde 2018. Vai também aumentar para 900 euros a dedução de IRS a partir do segundo filho, desde que não tenha mais de seis anos.

A proposta prevê ainda reforçar o benefício fiscal associado ao IRS Jovem, reforçando a parcela de rendimento isenta de imposto e respetivos limites, durante cinco anos. Ou seja, os trabalhadores que cumpram os critérios vão beneficiar de uma isenção de imposto sobre 50% do seu rendimento no primeiro ano, de 40% no segundo ano, de 30% no terceiro e quarto anos e de 20% no quinto ano. O Executivo prevê também a não aplicação da retenção na fonte às primeiras 50 horas de trabalho extraordinário dos trabalhadores não residentes.

Pensões
Confirma-se o aumento das pensões entre 4,43% e 3,53% em função do valor da pensão. A medida irá abranger cerca de 2,7 milhões de pensionistas. Mas os aumentos ficam abaixo da inflação prevista para o próximo ano, que é de 7,4%. No entanto, o Governo prometeu uma correção da atualização das pensões do próximo ano se a inflação em novembro, sem contar com o setor da habitação, for superior a este valor.

Apoios vs subsídio de desemprego
O aumento do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) vai ser atualizado em 8%, para 478,7 euros e está previsto beneficiar 1,6 milhões de pessoas. O custo estimado é de 155 milhões de euros. Já o valor do mínimo de existência será de 10.640 euros no próximo ano e vai passar, nos anos seguintes, a ser atualizado com base no IAS. Em causa está o montante mínimo de rendimento líquido que o Estado garante a todas as pessoas.

Já o valor mínimo do subsídio de desemprego sobe para 550,5 euros e o montante máximo para 1196,75 euros, devido à atualização do IAS. Ou seja, o valor mínimo do subsídio de desemprego, para quem tem como remuneração de referência pelo menos o salário mínimo nacional (que será de 760 euros em 2023), aumenta em 40,8 euros para 550,5 euros. No que diz respeito ao montante máximo sobe 88,75 euros para 1.196,75 euros.

Complemento Solidário 
Está prevista a reposição do valor de referência desta prestação social acima do limiar de pobreza, atualmente nos 554,4 euros mensais. A medida irá custar 53 milhões e abranger 170 mil.

Função Pública
O pacote de medidas para a Função Pública vai ter um custo de 1.320 milhões de euros, com um aumento mínimo do salário base em 52 euros por ano, até 2026. Esta medida traduzir-se-á numa valorização média de 3,6% dos salários de cerca de 742 mil funcionários públicos, valor esse resultantes de aumentos entre os 2% e os 8%, dos salários mais elevados e daqueles mais reduzidos, respetivamente. Já o subsídio de refeição sobe dos 4,77 euros para os 5,20 euros. Este aumento tem um impacto orçamental de 77 milhões de euros.

Rendas
O Governo vai impor um limite de atualização de 2% às rendas no próximo ano, mas para isso terá de compensar os senhorios através do IRS ou do IRC. Estas compensações vão custar 45 milhões de euros. Além disso, o Governo vai reforçar em mais sete milhões de euros para o Porta 65 Jovem. Este reforço prevê um aumento do apoio até um máximo de 300 euros por mês.

Habitação
Já as famílias com empréstimo à habitação vão poder beneficiar de uma redução da taxa do escalão de retenção na fonte do IRS. É uma medida de adesão voluntária e pode beneficiar até 1,4 milhões de pessoas, com um impacto na ordem dos 250 milhões de euros na receita do IRS. No entanto, para que possam beneficiar desta medida, os trabalhadores terão de possuir um empréstimo para uma casa de habitação própria e permanente e de auferir uma remuneração mensal até 2.700 euros.

Pré-escolar e colégios
O Governo vai reduzir no próximo ano as verbas disponíveis para os colégios e para o pré-escolar, que desde 2018 é de acesso gratuito para todas as crianças a partir dos 3 anos. O primeiro vai contar com menos 52,7 milhões de euros, enquanto o segundo terá um total de 653,9 milhões de euros, uma redução de 7,5%.

Criptomoedas
As mais-valias obtidas com criptoativos detidos por um período inferior a um ano passam a pagar uma taxa de 28%, «sem prejuízo da opção de englobamento». Já os lucros obtidos detidos por mais de 365 dias ficam isentos de tributação. 

Energia
Os consumidores vão conseguir poupar nove euros por ano com a redução do IVA na fatura da eletricidade de 13% para 6%, no que diz respeito às famílias com potências contratadas até 6,90 quilovolt-ampere. A medida vai abranger mais de cinco milhões de consumidores e terá um custo orçamental de 90 milhões de euros.

EMPRESAS

Imposto sobre lucros extraordinários
Depois de muita hesitação, o Governo sempre vai avançar com a criação de um imposto sobre os lucros extraordinários das empresas. Medida representará a implementação de uma Contribuição Temporária de Solidariedade (CTS), que terá uma taxa mínima de 33% e que vai recair sobre os setores do petróleo bruto, gás natural, carvão e refinação. E será aplicada já este ano. Para já, Medina não quis estimar quanto é que essa taxa poderá pesar nos cofres do Estado, mas dá como exemplo, a primeira versão que foi aplicada em Itália e que rondou os 10 milhões de euros.

Benefícios para quem sobe salários
As empresas que aumentem os salários em linha com o acordo de competitividade e rendimentos terão uma diminuição do IRC. Trata-se de uma majoração de 50% em todos os custos, quer remuneração fixa, quer contribuições sociais. São abrangidos os encargos relativos a trabalhadores com vínculos a tempo indeterminado e com remunerações acima da remuneração mínima mensal garantida do ano respetivo. A medida, de acordo com a proposta, irá beneficiar mais de 500 mil empresas, não sendo abrangidas as empresas «que agravem o seu leque salarial entre a maior e menor remunerações atribuídas aos trabalhadores num determinado ano». O custo é de 75 milhões de euros.

Taxa especial de IRC
O valor da matéria coletável sujeita à taxa especial de IRC das micro, pequenas e médias empresas e Small Mid Cap – que não reúne condições das anteriores – vai aumentar de 25 mil para 50 mil euros. Em causa está uma taxa de 17% aplicável às empresas que entram na classificação de micro e PME – e que é de 12,5% quando estão instaladas no interior do país – em relação aos primeiros 50 mil euros de matéria coletável. Acima deste valor aplica-se a taxa de 21%.

Prejuízos fiscais
As empresas vão deixar de ter um prazo limite para reportarem prejuízos fiscais, baixando de 70% para 65% da coleta o limite dedutível. A dedução a efetuar em cada um dos períodos de tributação «não pode exceder o montante correspondente a 65% do respetivo lucro tributável, não ficando, porém, prejudicada a dedução da parte desses prejuízos que não tenham sido deduzidos, nas mesmas condições, nos períodos de tributação posteriores».

Taxa extraordinária e adicional sobre banca
A contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE), criada em 2014, no Governo de Passos Coelho, com caráter temporário, vai manter-se em vigor no próximo ano. Esta contribuição extraordinária é paga pela REN – Redes Energéticas Nacionais, Galp e EDP. E também vai manter o adicional sobre a banca, prevendo, com isso arrecadar 38 milhões de euros no próximo ano. 

Benefícios para Interior
O Executivo continua a apostar no interior e quer melhorar o Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), através do reforço da dedução à coleta aplicável dos atuais 25% para 30% das aplicações relevantes, relativamente ao investimento realizado até ao montante de 15 milhões de euros, nas regiões Norte, Centro, Alentejo e Regiões Autónomas. A medida terá um custo de 25 milhões.