O que querem os professores? Um retrato do estado da educação

O ministro da Educação acredita que o “crescimento do Orçamento acontece ao mesmo tempo que há um decréscimo significativo de alunos no sistema”, mas os professores continuam descontentes. O que se passa?

No dia em que o ministro da Educação discutiu no Parlamento a proposta do Orçamento para o setor, aproximadamente 90% dos professores aderiram à greve convocada pela Federação Nacional dos Professores (Fenprof), a FNE, o Sindicato Nacional e Democrático dos Professores (Sindep), a Associação Sindical de Professores Licenciados (ASPL), o Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades (Spliu), entre outras plataformas.

Em declarações ao Fórum TSF, João Costa afirmou não ter dúvidas de que este “é um bom Orçamento”, com um “reforço da dotação para a Educação”. “Temos um crescimento do Orçamento que acontece ao mesmo tempo que há um decréscimo significativo de alunos no sistema”, indicou, prevendo a vinculação de mais 5 mil professores e até falando em dar “mais estabilidade aos professores e às escolas”.

“Queremos reduzir a dimensão e fixar os professores nestes quadros, conscientes de que existem assimetrias regionais”, explicou, declarando que quer apostar igualmente na “consolidação das carreiras” e no “alargamento de vagas para o acesso a mestrados de Ensino”, assim como na tentativa de “voltar a ter estágios remunerados, o que não acontecia há mais de 15 anos”.

“O Governo tem o compromisso sério de responder às reivindicações dentro de um quadro do que é possível em tempos de incerteza e num quadro do Orçamento que não pode comprometer o futuro”, constatou, adicionando que “as revindicações têm de ser equacionadas dentro do que é possível”.

De acordo com dados da Pordata, em 2021 existiam 150.127 docentes em exercício nos ensinos pré-escolar, básico e secundário, enquanto em 2011, exatamente dez anos antes, esse número era de 174.953. Neste quadro temporal, o ano em que houve menos professores foi o de 2014, no qual foram contabilizados 141.250.

Tendo em conta os mesmos níveis de ensino, no ano passado existiam 1 milhão 570 mil e 791 alunos, enquanto em 2011 eram 1 milhão 923 mil e 736. Logo, havia mais professores para mais alunos. Agora, tanto os professores como os alunos encontram-se em número menor nas escolas, segundo dados recolhidos e tratados pela Pordata.

Os principais problemas O subfinanciamento do setor é o principal problema na ótica dos professores, sendo que este, na ótica da Fenprof, “impede a melhoria das condições de trabalho nas escolas, a melhoria das condições de aprendizagem dos alunos e, no caso dos profissionais docentes, impede a tomada de medidas que confiram atractividade à profissão, levando os jovens professores a abandonarem, os jovens que concluem o secundário a não procurarem os cursos de formação de docentes e os mais velhos a ansiarem pelo momento da sua aposentação”, como é possível ler no seu comunicado de 20 de outubro.

Quem vai ao encontro desta perspetiva é Tiago Leitão, professor de História de 27 anos. Casos como o de Tiago começam a ser raros: de acordo com o Pordata, o índice de envelhecimento dos docentes em exercício nos ensinos pré-escolar, básico e secundário tem vindo a galopar, sendo de 1.505,7% em 2021 e 125,7% em 2011; se quisermos ter exemplos mais concretos, no passado mês de setembro, a média de idades dos professores do quadro ainda por colocar rondava os 57 anos, segundo o jornal Público. “Nos dias de hoje, o professorado não é atrativo devido a múltiplos fatores”, começa por explicar o jovem que inicia agora a sua carreira.

“Os ordenados são baixos e necessita-se de atualizar a tabela salarial”, avança. A tabela de vencimentos dos docentes, relativa a este ano, mostra que o ordenado líquido mínimo que ganham é de aproximadamente 1000 euros e o máximo de 2000.

“A distância da família, amigos e cônjuges não é, de todo, fácil e preocupa-nos pelas rendas elevadíssimas. Relativamente aos alunos, nota-se que têm muita dificuldade de concentração e que há falta de conhecimentos tácitos muito por causa da pandemia, já para não discorrer sobre a cada vez maior indisciplina. Há uma necessidade de mudança e de melhores condições num setor fundamental para uma sociedade tolerante, democrática e plural”, conta o rapaz.

“Há falta de professores e, se as condições salariais e de trabalho não melhorarem, não vejo o futuro com bons olhos”, confessa, exemplificando que na zona Norte do país, de onde é natural, se formam muitos professores e não tanto no Sul, onde há mais procura do que oferta. “O salário é muito baixo, não há ajudas de custo e assim não nos compensa ir para Lisboa. O ordenado seria para a renda de uma casa: e o que aconteceria no resto do mês?”, questiona, sendo que a FNE apelou à criação de estímulos para atrair professores para zonas mais desfavorecidas ou com falta de profissionais.

O Sindep, por sua vez, justificou o uso da “legítima arma da greve” com esperança de que o Ministério da Educação pense em “voltar à mesa para uma verdadeira negociação e não para um mero faz de conta que negociamos”, enquanto a ASPL não deixou de lembrar que tem de se investir na formação de alunos e na carreira docente. Por último, o Spliu salientou que “este é o momento de os educadores e professores retomarem a união e assumirem o seu descontentamento de forma unida”.

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