Ucrânia. Rápidos avanços em Kherson enquanto russos retiram

Recrutas russos cavam trincheiras na outra margem do rio, ao mesmo tempo que tropas mais experientes defendem a retaguarda. 

O governo da Ucrânia garante que não vai entrar precipitadamente em Kherson, não vá ser uma armadilha, mas não faltam sinais de que os russos estão de facto a retirar. Têm agarrado no que conseguem e cruzado o rio, para posições defensivas preparadas na margem leste, enquanto as forças russas mais experimentadas protegem a retaguarda, para evitar que ucranianos avancem e esta retirada se torne uma fuga caótica, semelhante ao que vimos a sudeste de Kharkiv. 
Logo no dia seguinte ao anúncio, forças ucranianas já se aproximavam dos arredores de Kherson. Primeiro recuperaram Snihurivka, uma localidade estratégica para cruzar o rio Inhulets, um afluente do Dnipro. Umas horas depois surgiam imagens de militares da 28ª Brigada Mecanizada a içar a bandeira ucraniana na aldeia de Kyslivka, a meros 15km do centro de Kherson.

Isso não implica que os russos já tenham saído da cidade. “Os comandantes russos certamente tentarão travar os avanços ucranianos e permitir uma retirada ordeira”, lia-se no mais recente relatório do Instituto para o Estudo da Guerra (ISW, na sigla inglesa). Não podem simplesmente fazer as malas e partir, retiradas sob fogo são consideradas das mais difíceis operações militares, requerendo bastante disciplina e capacidade de manobra – algo em que as forças russas não se mostraram particularmente capazes nesta guerra – para não se ser atingido pelo inimigo na retaguarda. “Algumas forças russas poderão ficar para atrasar as tropas ucranianas na cidade de Kherson”, continuava o ISW. “Mas estes combates poderão ser um meio com o objetivo de retirar tantas unidades russas quanto possível em boa ordem”. 
 
Retirada Desde há dias que se viam indícios do começo de uma retirada. Tinham chegado novas tropas russas a Kherson, mas muitos eram recrutas pouco experientes – parte dos 80 mil que o Kremlin assegurou ter forçado a voltar ao serviço com a sua mobilização militar parcial – e por vezes até atrapalhavam mais do que ajudavam.

“Eles são carne para canhão. Um deles foi à casa de banho a meio da noite usando uma lanterna. Identificámos a posição do tanque deles e destruímo-lo”, contou Oleh Zelinskiy, porta-voz da 63ª Brigada Mecanizada da Ucrânia, que foi colocada na frente de Kherson.

“Eles tentam abater os nossos drones com armas automáticas. Não compreendem que drones podem largar bombas. São idiotas”, garantira Zelinskiy ao Guardian, no dia anterior a ser anunciada da retirada. Mas os russos não contavam só com recrutas, tinham algumas tropas de elite, sobretudo paraquedistas, e combatentes veteranos das milícias de Luhansk. Estes iam estabelecendo posições defensivas cada vez mais a sul, segurando a linha da frente enquanto os recrutas cavavam trincheiras do outro lado do rio.

Entretanto, os russos já tinham saqueado o mais que podiam de Kherson, indicando vontade de partir. Houve relatos de que levaram material dos hospitais, carros, que confiscaram ou afundaram navios no porto, deixando blindados velhos a proteger a sua retaguarda enquanto os tanques mais recentes partiam.

Até os restos mortais do príncipe Grigory Potemkin, um famoso comandante russo do século XVII, amante de Catarina a Grande, foram roubados da catedral de Santa Catarina, há duas semanas, avançou agência RIA Novosti. Potemkin, que conquistara a região para a Rússia, é uma referência para Vladmimir Putin, que agora enfrenta a vergonha de perder uma das mais importantes cidades daquilo a que os seus antepassados chamavam de Novorossiya, “Nova Rússia”.