Orçamento pretende “iludir os portugueses”, acusa Eugénio Rosa

Economista diz que falta de medidas contribui para que SNS continue a “degradar-se” e leva portugueses “a sofrerem devido à passividade e incapacidade do Governo”.

“No momento da nomeação de Manuel Pizarro como ministro da Saúde, António Costa caracterizou-o como um ‘político’. Esqueceu-se de dizer que o novo ministro era palavroso e que iria ‘resolver’ os graves problemas que enfrenta o SNS com palavras e não com medidas adequadas, adiando as soluções, uma característica do atual Governo”. A crítica é de Eugénio Rosa, que aponta o dedo ao valor destinado para este setor no Orçamento de Estado para o próximo ano, considerando que “é enganador e insuficiente”, o que levará, no seu entender, a uma maior degradação do Serviço Nacional de Saúde  (SNS), conclui num estudo a que o i teve acesso.

O economista recorre ao valor da receita estimada para este ano e considera que, face a 2003, representa um aumento de  apenas 4%, contrariando a subida anunciada pelo Executivo de 10,5%. E, além de ser mais reduzido do que foi anunciado, lembra também que, se a este montante forem retiradas as verbas dos fundos comunitários (751,8 milhões de euros em 2023), o “aumento da receita até diminui entre 2022 e 2023, 178,8 milhões de euros”.

E chama ainda a atenção para os “truques” usados ao nível da despesa. “Interessa separar a despesa corrente –­ aquela que é necessária para garantir o funcionamento do SNS – da despesa de capital, ou seja investimento. Isto porque o Governo empola o orçamento do SNS todos os anos com despesa com investimento que depois a maioria não é realizada”, dando exemplos: no Orçamento inicial do SNS de 2022 estavam previstos investimentos no montante de 589,3 milhões, mas até outubro só tinham disso realizados 140,4 milhões (23,8% do previsto), embora o Governo estime que, até ao fim de 2022, realizará 382 milhões, o que é duvidoso que o consiga fazer, pois é mais do dobro do que conseguiu realizar nos primeiros 10 meses de 2022”.

Segundo o economista, o cenário repete-se com a despesa corrente. “Em 2022 estava estimado 13 322,8 milhões e para 2023 está previsto 13 822,7 milhões , o aumento é de apenas 3,8% (+499,9 milhões ), ou seja, pouco mais de metade da inflação prevista pela OCDE para Portugal em 2023 (6,6%)”.

Eugénio Rosa também lamenta o aumento que se verifica ao nível da despesa com pessoal, considerando que é ainda inferior, ao ser de apenas 2,9%. “Como é possível com um aumento de 2,9% na despesa com pessoal proceder a uma justa valorização das remunerações dos profissionais de saúde que continuam a perder poder de compra e assegurar carreiras dignas que é fundamental para impedir a continuação da degradação grave do SNS que está a causar enormes prejuízos em termos de saúde à população e a agravar ainda mais as desigualdades?”.

E deixa mais uma farpa: “O investimento de 941,1 milhões previsto no Orçamento do SNS para 2023 em grande parte é para ‘inglês ver’, pois não se realizará como aconteceu em anos anteriores”.

 

Dívida a privados agrava-se

Eugénio Rosa fez também as contas às dívidas a fornecedores e garante que, entre dezembro de 2021 e outubro de 2022, a dívida total do SNS a fornecedores aumentou de 1548 milhões para 2350 milhões de euros, o que representa uma subida de 51,7% (800,7 milhões). E chama a atenção para o facto de estar a ser “ocultado este enorme aumento da dívida total do SNS nos primeiros 10 meses de 2022, em que o Governo no documento que distribuiu aos deputados no debate do Orçamento do Estado para 2023 só referiu uma parte desta dívida , isto é, a dívida vencida que era 1292 milhões de euros, em agosto de 2022 (quando o total era 2194 milhões de euros).  Ocultando 45% da dívida total à própria Assembleia da República.

No entender do economista, este enorme aumento da dívida deve-se ao subfinanciamento crónico do SNS, “que tem de se endividar para poder funcionar”, garantindo que o Orçamento do SNS para 2023 “não contém verbas para resolver este enorme endividamento”.

Ainda assim, admite que os problemas que enfrenta o Serviço Nacional de Saúde não se reduzem, nem se resolvem apenas com dinheiro. “As enormes deficiências a nível de organização, de gestão, de responsabilização, de falta meios humanos e materiais, causados por uma tutela incapaz e por um diretor executivo que, apesar de nomeado, está ausente, e por leis anacrónicas, asfixiantes, burocráticas (a ADSE enfrenta as mesmas dificuldades de que tenho experiência vivida) também determinam a grave situação do SNS. Mas a falta de financiamento adequado é também um problema grave que o orçamento de 2023 não resolve, pelo contrário, vai agravar ainda mais”, conclui.