Ensino superior. Precariedade e instabilidade após entrada em vigor do regime jurídico

Publicado em 2007, devia ter sido revisto em 2012. SNESup culpa “inércia dos sucessivos Governos”. 

O Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) dá cartão vermelho à aplicação do regime jurídico das instituições de ensino superior, em 2007. A presidente da estrutura sindical lembra que estava previsto que a legislação fosse avaliada cinco anos depois, ou seja, em 2012, o que não aconteceu até à data. De acordo com Mariana Gaio Alves, essa avaliação nunca foi feita “por inação sucessiva dos vários Governos” e isso está a contribuir para um aumento da precariedade entre docentes e investigadores, defende a responsável ao i. Esta é uma das conclusões do estudo realizado pelo sindicato, que foi apresentado ontem ao Ministério.

“Estamos a assistir a um crescimento da contratação a prazo e a tempo determinado de muitos docentes e investigadores. Por exemplo, as instituições privadas sem fins lucrativos contratam pessoas ao abrigo do código de trabalho, sem que possam fazer parte dos órgãos das instituições de ensino superior público, mas são pagas através do financiamento publico para a ciência e cujo trabalho também reverte para os resultados que as instituições de ensino superior que depois apresentam como sendo seus resultados. Isto significa que as pessoas estão permanentemente numa situação de instabilidade e precariedade”, revela a dirigente.

Outro problema diz respeito à questão do regime para o pessoal docente e investigador do ensino superior privado. “Está previsto que fosse publicado um decreto de lei que regulamentasse as normas de contratação, de trabalho e de carreira no ensino superior privado e isso nunca aconteceu. Também por inação dos sucessivos Governos”, lembrando que, nestes casos, há uma ausência de regulamentação sobre contratação. “Isto tem sido muito prejudicial para os docentes investigadores do ensino superior privado que se confrontam com estas situações. Por exemplo, num semestre têm um x número de horas de aulas e no semestre seguinte podem ter mais ou menos conforme o número de alunos inscritos e as turmas que têm”.

Mariana Gaio Alves diz ainda que, ao mesmo tempo, a docência no ensino superior requer que as pessoas desenvolvam atividades de investigação. A esmagadora maioria dos docentes e dos professores não têm no seu horário previsto o pagamento de horas para estas atividades de investigação. “Isto é também extremamente injusto, no sentido em que as pessoas para serem contratadas e para estarem nas instituições têm que fazer investigação, mas é como se fosse qualquer coisa que não é remunerada pelas próprias instituições. É uma espécie de pro bono, em que têm a obrigação de ter artigos publicados, de terem projetos, de terem atividade cientifica mas depois não são remunerados por isso. É uma exigência que não é admissível”. 

Para a presidente do SNESup, a solução para este problemas passa por publicar a regulamentação para o ensino superior privado. Além disso, defende que é importante encontrar um rumo para as políticas do ensino superior e ciência. “O que aconteceu nos últimos 15 anos foi um aumento exponencial daqueles que são contratados precariamente. É preciso inverter esta tendência. É preciso consolidar e reforçar os quadros de investigadores e docentes nas instituições de ensino superior. De outro modo corremos o risco de ver ocorrer neste setor aquilo que já vimos a acontecer na saúde e também no ensino básico e secundário com falta de profissionais no setor público”, avisa.

Apesar destes problemas, Mariana Gaio Alves considera que a qualidade de ensino não tem sido prejudicado. “Até agora temos tido muitos bons resultados do ponto de vista da qualidade da investigação, que é reconhecida internacionalmente. Também basta ter em conta que muitas das pessoas e dos diplomados do ensino superior português trabalham nos mais diferentes países e nas mais variadas empresas, onde é reconhecida a sua qualidade de formação”. Ainda assim, “é preciso fazer alguma coisa para que a qualidade do ensino e da investigação em Portugal que é notária não seja posta em causa, como parece estar. Não podemos continuar nesta rota em que aumentamos exponencialmente a precariedade. Por outro lado, estamos a assistir a um envelhecimento etário nestes grupos profissionais”, aponta.

Já em relação ao estudo divulgado ontem que revela que os portugueses com habilitações superiores que emigram chegam a ganhar três vezes mais, a responsável assume que o sindicato tem manifestado a sua preocupação. “O que sabemos é que em Portugal ainda temos muito poucos diplomados do ensino superior quando comparado com a média europeia e é preciso criar politicas de emprego que valorizem a qualificação. É preciso apostar em novas empresas e em novas dinâmicas económicas que permitam beneficiar deste conhecimento avançado que vai existindo”.