Natal revisitado

O Natal é gratidão pelo que foi, pelo que somos, pelo que temos e esperança no que virá. É não só o encontro da família, mas o reencontro de nós próprios ao longo dos anos, de quem fomos, quem somos, quem temos e tivemos ao nosso redor.

Cada Natal é único, mas não é um acontecimento singular, é o resultado de tantos outros Natais que vivemos e mesmo daqueles que não presenciámos, mas que chegaram até nós. Cada ano traz consigo a memória dos Natais passados e também das histórias e costumes contados ou herdados de geração em geração. E é também por isso que é tão carregado de emoções, o que faz com que os sentimentos em relação a esta quadra variem muito de pessoa para pessoa. Há quem a viva com um enorme entusiasmo e alegria, mas também quem a evite, chegando a preferir que não existisse, porque traz à memória momentos menos bons que querem ser esquecidos ou momentos muito felizes que são difíceis ou impossíveis de repetir. Momentos que os anos levaram.

Sem dúvida que é na infância que o Natal é mais especial, quando a inocência o carrega de magia, em que se acredita no impossível e os olhos jubilam com as luzes e enfeites nas ruas. É a altura em que o vamos descobrindo ano após ano, em que mais o ansiamos e o vivemos com maior intensidade. Guardo memórias muito queridas dos Natais em criança. Das folhas em que fazia as minhas contagens decrescentes para o grande dia, dos bonecos que ganhavam vida e tocavam bateria e guitarra nas montras dos Armazéns Grandella, da família reunida em casa da minha avó, de ir apanhar musgo com a minha tia para fazermos o presépio, de colocar cuidadosamente as figuras que tinham passado o ano bem guardadas numa caixinha que me parecia mágica, de apagar as luzes da sala e me sentar em frente à árvore de Natal para ficar a ver as luzes de todas as cores a piscar no meio da escuridão, de acordar muito cedo com a minha irmã para irmos buscar os presentes à chaminé e de os abrirmos juntas… E tantos Natais se repetiram desde então, todos tão diferentes, mas com tanto em comum: a alegria da quadra, a casa decorada, a memória dos Natais passados, as histórias recontadas, as tradições que mantemos como um fio condutor da família e dos anos que vão passando. 

A família vai aumentando e diminuindo, como se uns tivessem de dar lugar a outros, mas o nosso coração vai esticando e há sempre lugar para todos. No Natal estamos sempre todos reunidos, atentos e sensíveis a quem já não está, mesmo a quem não chegámos a conhecer, mas que chegou até nós através das lembranças partilhadas, e todos permanecem em nós com o que fomos deixando uns nos outros, pelas tais memórias que passam a fazer parte de nós, mesmo que já não possamos estar todos sentados a mesma mesa.

Mas, além de passado, o Natal é também presente e futuro. Traz consigo as memórias antigas, mas junta-lhe as novas e cria histórias que daqui a muitos anos os mais novos recordarão e que guardarão consigo entre os momentos mais queridos. O Natal é gratidão pelo que foi, pelo que somos, pelo que temos e esperança no que virá. É não só o encontro da família, mas o reencontro de nós próprios ao longo dos anos, de quem fomos, quem somos, quem temos e tivemos ao nosso redor. É tempo de agradecer, de dar importância ao que é realmente importante e de celebrar a vida.
Um Santo e Feliz Natal!