Jesus, amo-te!

Avaliar Bento XVI a partir da sua inteligência, da sua renúncia ou das polémicas geradas à sua volta é, no fundo, continuar a olhar para a realidade espiritual a partir de uma grelha de leitura muito reduzida.

As últimas palavras de Bento XVI, segundo o enfermeiro que o acompanhava, foram dirigidas não a um deus desconhecido, mas ao próprio Messias – Jesus! E, curiosamente, aquele que foi objeto do seu pensamento, ao longo da vida, agora, no fim da vida, é objeto do seu amor. A boca fala da abundância do seu coração, diz São Paulo. Assim, o Conhecimento de Cristo fez aumentar em Bento XVI o seu amor por Ele.

Avaliar Bento XVI a partir da sua inteligência, da sua renúncia ou das polémicas geradas à sua volta é, no fundo, continuar a olhar para a realidade espiritual a partir de uma grelha de leitura muito reduzida. Bento XVI nem sequer foi um Papa que renunciou, mas um Ungido de Deus para levar os homens à comunhão com Cristo, deixando-se iluminar por Ele. Porque o Papa é só um, apesar de terem sido muitos homens a sentar-se na cadeira de Pedro.

É evidente que o lugar do Papa pode e deve ser visto como um lugar político, isto é, como aquele que situa a Igreja na polis, na cidade, na própria sociedade. No entanto, o serviço do Papa tem na base uma promessa feita por Jesus a Pedro: «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela». Esta promessa feita a Pedro diz respeito à Igreja e não tanto a um homem apenas. É a partir desta promessa que devemos pensar o Papa Bento XVI.

Olhar para Bento XVI como conservador – que continuo a dizer que não o era – em oposição aos progressistas, é não procurar ler o seu serviço à Igreja a partir desta promessa. A Igreja não é edificada sobre o homem, mas sobre uma pedra, uma rocha firme. Tal rocha é, em última análise, Cristo, sobre o qual a Igreja repousa e contra a qual as portas do inferno nunca terão qualquer poder.

É assim que gosto de ver o Papa Bento XVI e é, também, assim que gosto de ver o Papa Francisco. Assim, também, cresci e aprendi a ver o Papa João Paulo II, como herdeiro desta rocha firme sobre a qual está alicerçada a Igreja.

Há um mês, movido por uma inquietação interior sobre a minha própria vida e a minha situação na Igreja, decidi pegar no carro e, com um amigo, seguir até Valência para poder falar com o monge Cartuxo que, há trinta anos, me levou para o seminário. Este homem de Deus, um português, de Lisboa, é hoje o prior da Cartuxa de Valência e concedeu-me uns dez ou quinze minutos do seu tempo. Há muito que não o via…

Confessando-lhe as minhas inquietações e o que me tinha levado a empreender estes três mil quilómetros, o monge diz-me estes mesmas palavras: Edgar, a promessa que Jesus fez a Pedro – «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela» – é uma promessa válida também hoje para nós.

Estas palavras do monge produziram em mim uma paz e uma tranquilidade enorme. Nessa altura percebi a serenidade que habitava o Papa Bento XVI apesar de todas as lutas e pressões de dentro e de fora da Igreja. Ele tinha, realmente, a certeza de que a Igreja não era dele nem de nenhum bispo ou padre ou mesmo de qualquer leigo… a Igreja é, pois, de Cristo e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.

Será mesmo? Estará mesmo a Igreja protegida do poder do inferno? Como explicamos os cismas eminentes ou o fenómeno inimaginável da pedofilia ou até mesmo a apostasia silenciosa existente no povo de Deus e até numa parte significativa de sacerdotes?

A verdade é que o corpo de Cristo foi rasgado pelos cravos, suspenso no madeiro da cruz. As portas do inferno pareciam ter prevalecido contra o Messias, levando-O à morte, fazendo-o descer às portas da morte. Porém, o poder de Deus, por meio do seu Espírito, ressuscitou-O de entre os mortos. Assim, a Igreja não depende do Papa Bento XVI, como também não depende do Papa Francisco, mas de Cristo.