Falta de raspadinhas desespera jogadores

Tabacarias, papelarias e jogadores veem-se a braços com a falta de raspadinhas ou com menor quantidade. Vendedores dizem que a causa principal serão os atrasos na distribuição. Santa Casa da Misericórdia de Lisboa diz que se registaram alguns ‘atrasos pontuais’ que estarão resolvidos este fim de semana.

Passa pouco das oito da manhã e em Entrecampos já não há raspadinhas. O cenário, passado esta segunda-feira, era assim há algum tempo. As raspadinhas até estavam a chegar mas chegavam em pouca quantidade e, mesmo antes da abertura da tabacaria, já havia fila à porta para levar os poucos jogos de sorte e azar que chegavam. A pouca oferta faz com que, atualmente, esgotem com muita rapidez.

Mas este não é caso único. «Há pelo menos duas semanas que não têm a raspadinha que costumo comprar». Quem o diz é Maria que pelo menos três vezes por semana tenta a sua sorte na zona de Queluz. Era a única pessoa para comprar raspadinhas nessa altura, talvez por ser hora de almoço. Mas o que acontece a Maria tem sido recorrente, pelo menos um pouco por toda a região de Lisboa.

«As raspadinhas têm chegado com atraso e quando chegam, chegam em pouca quantidade. Alguns clientes ficam irritados, outros percebem. É uma situação que nos ultrapassa», diz ao Nascer do SOL o proprietário desse mesmo espaço em Queluz.

Na Amadora, uma tabacaria que vende jogos da Santa Casa confirma também que as raspadinhas têm chegado em menos quantidade, às vezes muito menos do que era suposto. «Até já cá veio um fiscal da Santa Casa mas parece que isto é um problema de distribuição», diz o proprietário do espaço que também não sabe dizer muito bem o que se terá passado mas que refere ter tido várias ‘queixas’ por parte das pessoas que todos os dias se deslocam ao estabelecimento para tentar a sua sorte. A maior parte, clientes habituais.

O caso não é muito diferente em Alfragide. «Raspadinhas ainda vai havendo, há pelo menos uma semana que não consigo comprar a pé de meia que é aquela onde costumo jogar mais. Vou jogando outras e tentando a minha sorte», diz um sexagenário que confessa até gastar algum dinheiro neste tipo de jogo. Mas não se perde, garante. Vai apenas tentando a sua sorte. O proprietário também não sabia bem responder ao que terá acontecido, garantindo apenas que se tratariam de problemas de distribuição. Aqui, as prateleiras estão quase vazias e as raspadinhas contavam-se pelos dedos das mãos. Mas a falta de raspadinhas traz outros problemas: «Se não temos, não vendemos. E isso também afeta o nosso negócio», lamenta.

O problema acontece também em Benfica onde o proprietário de um espaço nos conta que tem dois fornecedores para as raspadinhas e que ambos estão com atrasos nas entregas.

Em Oeiras, o cenário repete-se: problemas de distribuição deixaram a prateleira vazia. Mas isso foi da primeira vez que o Nascer do SOL visitou o espaço. À segunda, esta quinta-feira, as prateleiras já tinham ganho outra cor. «Chegaram hoje», adiantou o proprietário do espaço. Ainda assim, apesar do problema estar agora resolvido, foram mais ou menos duas semanas de atraso. «Há locais que estão abertos ao domingo e que fazem os pedidos nesse dia. Como não estou, só fiz na segunda-feira e na sexta ainda não estavam cá», explicou ao nosso jornal.

Na margem Sul, em Alfarim e na zona de Sesimbra, também foram registados atrasos e falta de raspadinhas, conforme relatos que chegaram ao nosso jornal. «Tive de comprar outra raspadinha que não costumo comprar. A minha habitual já não existe há algum tempo», conta-nos um jogador.

No entanto, é preciso ter em conta que ver papelarias com as prateleiras quase vazias e sem raspadinhas não é caso inédito. Diz-se que é costume acontecer por altura do Natal. Um jogador confessou mesmo ao Nascer do SOL: «Pelo Natal acontece algumas vezes, penso que enviam menos nessa altura para venderem mais a Lotaria de Natal», defende. 

Recorde-se ainda que, em outubro de 2019, por exemplo, este problema repetiu-se mas devido à insolvência da Urbanos Express. Nessa altura, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) assegurou que a partir dessa altura, os CTT fariam a distribuição dos jogos pelos mais de cinco mil pontos de venda que existiam em território nacional.

O Nascer do SOL tentou perceber junto da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa o que está a causar estes atrasos mas a entidade referiu apenas que estão a ser registados «alguns atrasos pontuais, mas no fim de semana estarão resolvidos». 
 
Lucros e vendas
O Nascer do SOL questionou a Santa Casa sobre os lucros com os jogos no ano passado mas não teve resposta até ao fecho desta edição. No entanto, é preciso ter em conta que as contas desse ano ainda não foram feitas.

No entanto, no último Relatório & Contas disponível no site, que diz respeito ao ano de 2020 – ano de pandemia – os números mostram que, no final desse ano, o efeito da pandemia nos Jogos Santa Casa traduziram-se numa queda de vendas de 17,6%, o que correspondeu a 591 milhões de euros, «invertendo abruptamente uma trajetória já longa de sucessivos records anuais de vendas».

No que diz respeito aos resultados de exploração e à sua distribuição, «o choque foi igualmente significativo, equivalendo a uma redução de resultados líquidos de 20,4%, ou seja, menos 158 milhões de euros do que os gerados no ano anterior».

É que, por essa altura, lembram os Jogos Santa Casa, «a imposição do confinamento levou a uma variação de procura, também inédita, mas, desta feita, positiva, nas vendas dos canais digitais. Ainda que à sua dimensão, dado que as vendas dos canais digitais representavam 2,5% do total dos JSC antes do período pandémico, este aumento de procura atenuou a queda global de vendas, tendo representado um montante de 23 milhões de euros».

No final do ano, as vendas nos canais digitais corresponderam a 4% do total de vendas dos JSC.

A Raspadinha continua a ser a ‘rainha’ dos jogos sociais ao atribuir cerca de 2,8 milhões de prémios semanais em 2020. Segue-se o Euromilhões que ocupa o segundo lugar com quase 340 mil prémios por semana, o que representa mais de 5,6 milhões de euros entregues a apostadores portugueses.

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa chegou a indicar ao i que o dinheiro ganho «é devolvido à sociedade quase em 100 por cento (do valor obtido em receitas), seja através de prémios (a principal fatia), das receitas distribuídas pelos vários beneficiários dos jogos sociais da Santa Casa (estabelecido por Decreto-Lei), Imposto do Selo e pagamento aos cerca de 5000 mediadores dos Jogos Santa Casa, na sua maioria pequenos negócios locais (cafés, quiosques, papelarias, etc)». 

Quando ao dinheiro distribuído aos beneficiários dos jogos sociais, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e o Ministério da Saúde ficam com as maiores fatias. O valor depende todos os anos do lucro obtido com o jogo.