O progressismo é uma má criação liberal

Já não nos regemos pela ética, pelos nossos tesouros culturais, nem pela fé ou pela razão.

 O progressismo é uma deformação do progresso. Há quem atribua as suas linhas mestras a um alegado marxismo cultural e à esquerda pós-moderna, mas erram: este é liberal.

Há três linhas distintivas nesta mundividência, liberal progressista.

– O ato em si de escolher livremente é considerado superior àquilo que se escolhe e esse é o maior dos bens da sociedade liberal. Precisamente o contrário da necessidade da defesa obrigatória das ‘coisas permanentes’.

– "Cada indivíduo pensa que é a fonte dos seus julgamentos e concede-se o direito de decidir por si mesmo o que estima ser bom ou mau, justo ou injusto", como escreveu  João Paulo II na encíclica Splendor Veritas.

– As nossas escolhas morais devem ser unicamente ou pelo menos principalmente expressões do que cada um sente que é correto ao tomar uma decisão.

Linhas que Stuart Mill, padroeiro progressista resumia na seguinte ideia: "Não cabe à sociedade enquanto sociedade determinar como erróneo qualquer coisa relacionada com o indivíduo".

O primado da vontade individual e da subjetividade substituíram a ideia de uma sociedade virtuosa, e até mesmo a ideia de sociedade.

Uma sociedade virtuosa acredita na objetividade dos bens morais, no que mais importa como humanos e nos comportamentos que devemos ter para que esses bens sejam património da comunidade.

Nas sociedades pós-virtuosas os indivíduos têm de facto um aparente maior grau de liberdade de pensamento e ação, valorizando-se uma ideia de liberdade individual absoluta e irrestrita que transforma a sociedade num agregado de desconhecidos que perseguem o seu interesse próprio sob um mínimo de limitações.

O ódio ao passado, à nossa história e ao que somos, a substituição da ética e da moral pelo direito, a negação de valores absolutos e universais, a rejeição da comunidade, do bem comum e das obrigações e valores que não escolhemos pessoalmente, a técnica como a resposta otimizada para os problemas humanos são alguns dos sintomas da nossa mutilação antropológica.

Uma visão egoísta, reativa e infantil do mundo é uma das consequências dessa antropologia do desenraizamento da amoralidade egótica.

 Podemos denominar de progressista esta moral sem moral que é a do liberalismo contemporâneo. E este progressismo assinala sem qualquer dúvida uma nova idade das trevas e barbárie, embora repleta de luz artificial e mundos virtuais. O que é a barbárie senão a destruição da cultura, da história, dos valores, não já tanto de um povo mas do próprio humano.

 A destruição dos valores e da ética foram o fundamento das guerras culturais, os três pontos acima indicados fazem parte desta nova ‘revolução cultural’, da longa marcha liberal. E não, o liberalismo do presente já não é o mitificado liberalismo clássico.

Já não nos regemos pela ética, pelos nossos tesouros culturais, nem pela fé ou pela razão, e como refere o filósofo Alasdair MacIntyre e Rod Dreher que me orientam nesta reflexão, a identificação com o tipo de comunidade civil e o tipo de simulacros de valores que predominam já não é possível. MacIntyre na obra After the Virtue fala de um regresso a São Bento, à construção de novas formas de comunidade nas quais se possa continuar uma vida moral de tal modo que a moralidade e a civilidade sobrevivam neste tempo de barbárie e obscuridade. A nova Roma caiu e ou desaparecemos com ela ou construímos um outro futuro.