Mudam-se os tempos, muda-se a arquitetura

No ramo da arquitetura, tal como em muitos outros, sabemos que existem os modelos ‘pronto a vestir’ e os ‘fatos feitos à medida’.

Por Miguel Chuva Gomes, Arquiteto

Atualmente, talvez fruto do imperial avanço tecnológico, onde de dia para dia são ultrapassadas barreiras outrora inimagináveis, o ritmo de vida é bastante veloz. Antigamente, levava-se tempo a saborear determinados pensamentos, projetos, paisagens; mas, hoje, isso é considerado uma perda de tempo. Tudo é monetizado, feito rapidamente e contabilizado ao máximo com o mínimo de perdas. Tudo são perdas e ganhos. Tudo são ficheiros de Excel com controlos de horas de trabalho. Tudo é veloz, de consumo rápido, instantâneo. Sobretudo muito pouca coisa é saboreada, sentida, refletida e verdadeiramente intemporal.

Em arquitetura, os projetos são frutos da época. E, tal como em tudo no século XXI, também os desenhos têm que ser feitos a velocidades impensáveis com repercussões impiedosas em qualquer falha. O que ainda não foi compreendido é que o melhor investimento num empreendimento imobiliário (privado ou público, de habitação, equipamento ou planeamento) é no projeto de arquitetura. O tempo, neste caso, deverá ser visto como um investimento necessário, fundamental e precioso para consolidar uma proposta e permitir que o desenho seja feito à medida e com todos os detalhes que o tornarão único.

No ramo da arquitetura, tal como em muitos outros, sabemos que existem os modelos ‘pronto a vestir’ e os ‘fatos feitos à medida’. Se a primeira opção pode ser justificável nos casos de falta de meios financeiros, certos tipos de projeto ou mesmo urgência imperativa, a segunda opção não deixa qualquer margem de dúvidas. Não podemos apressar um alfaiate ou exigir o seu trabalho ‘para ontem’. Ele necessita de tempo para entregar a sua arte com os níveis de qualidade que lhe são reconhecidos. Se no privado poderemos encontrar a primeira opção (em âmbito particular e não de investimento), no público ou com promotores imobiliários só deveríamos ver considerada a segunda. Esta é a que está a moldar verdadeiramente as nossas cidades e a construir as nossas paisagens urbanas (e paulatinamente avançando pelas rurais também).

A arquitetura deve ser compreendida como uma arte que precisa de maturação. Mesmo sendo desenvolvida ao longo de todo processo de conceção (e muitas vezes durante a obra e pós-obra também) necessita nas suas fases iniciais da tranquilidade que as novas eras não permitem e que outrora era quase obrigatório. É fundamental regressarmos um pouco a essa tranquilidade de ação passada, com os olhos postos no futuro para que nos possamos todos vestir com ‘fatos feitos à medida’. Talvez assim todas as cidades pudessem ser lugares de melhor fruição.