«Comoedia finita est»
Por Fernando Matos Rodrigues, antropólogo e investigador CICS_Nova e Univ. do Minho
1.A política nacional vive numa espécie de carnaval antecipado pela sequência de acontecimentos hilariantes que nos conduzem para uma percepção de que este governo já esgotou o seu prazo de vida. Os acontecimentos ditam essa percepção negativa de uma forma quase pornográfica. Porém, estes acontecimentos podiam funcionar como uma espécie de alavanca, em que o Primeiro Ministro levado por um gesto de coragem, implementa-se a renovação deste triste fado. Mas, tendo em conta o histórico dos últimos tempos, falar em renovação deve deixar o governo e o seu líder com os cabelos em pé e as perninhas a tremer de medo.
Os partidos políticos na oposição alinham nas mesmas críticas ao governo, com mais ou menos assertividade, de acordo com as nuances “ideológicas” e os tiques populistas que marcam a diferença no reportório mediático entre eles. Nenhum partido quer arriscar ir para eleições. Dizem, não é o tempo! Como assim, não é o tempo?
Mesmo a IL que apresentou uma “moção de censura ao governo” fê-lo na certeza de que o governo não chumbava na Assembleia da República. O PSD vive suspenso por causa dos casos de corrupção dentro daqueles que são muito próximos da actual liderança. Os outros partidos da direita à esquerda lutam pela coesão interna ou, pela consolidação em termos de representatividade parlamentar.
O governo pelo seu lado, encontra-se acantonado entre as tábuas da Assembleia da República e o berço de Belém. Com destaque, para o Primeiro Ministro que perdeu o pé e já não consegue suster o barco. Cada dia que passa significa um afundanço para o governo e para o partido socialista. Todos os dias aparecem notícias que associam o governo e seus titulares a situações de ilegalidade, de corrupção, de abuso de poder, de negligência na gestão política da res publica. Estas situações cortam o PS de cima para baixo e de baixo para cima. Um partido político sem ideologia, sem programa político que fez do seu mandato um instrumento ao serviço da burocracia neoliberal que se instalou nos diretórios da Federação Europeia contra os Estados Nação.
Estamos perante um mar de situações pouco claras que envolvem ministros, secretários de estado, adjuntos e assessores. O governo não consegue segurar o Norte nem o Sul da governação, vive em sobressalto permanente e não consegue apontar uma ideia nova, um desafio que possa mobilizar os portugueses. Nem o PRR que foi apresentado como a bazuca do futuro, consegue ser uma força de mobilização económica e social. Pelo contrário, está a transformar-se num pesadelo para este governo. Que fazer com tantos milhares de milhões. Será caso para dizer: tanto dinheiro é um pecado!
2. O governo é uma verdadeira paródia, transformou-se numa espécie de passagem de mascaras carnavalescas. Uns que saíram pelo pé, outros empurrados pelo Presidente da República e quase todos denunciados pelos media. Outros, que aguardam ordem de saída. Enfim, um rol de situações insustentáveis que impedem este governo de governar. O governo que vive suspenso e em estado de pânico.
Num registro pouco democrático o governo recusa dar ouvidos à sociedade civil. Recusa dialogar com os professores. Recusa dialogar com os agricultores. Recusa dialogar com os médicos e enfermeiros. Recusa dialogar com as forças de segurança pública. Recusa dialogar com os sindicatos. Recusa dialogar com os inquilinos. Enfim, um governo que só dialoga com os grandes santos do capital e do mundo financeiro. Um governo que promove a baixa política da intriga social, colocando uns contra os outros. Veja-se, o caso do Ministro da Educação que numa manobra de dispersão quis colocar pais contra professores, alunos contra professores. O Resultado dessa infeliz e pobre inteligência, duas grandes manifestações pela educação, onde participaram professores, auxiliares da educação, técnicos superiores de educação, pais e alunos.
As poucas intervenções do Primeiro Ministro realizam-se em espaços bem preparados e estudados, com público disponível para aplaudir e prestar culto ao líder socialista. Comícios com casa cheia, com abraços e beijos, com vivas e aplausos, com um primeiro ministro em “banhos de multidão”, uma espécie de colónia de afetos socialista para relançar a autoridade do Primeiro Ministro. Uma mediação que se torna forçada e artificial aos olhos dos portugueses, não é capaz de relançar a política e muito menos de garantir o retorno da autoridade perdida.
Um primeiro ministro sem força, sem criatividade, sem palavra, sem ideias novas e sem futuro. Que repete as mesmas ideias, as mesmas propostas para a habitação, a saúde, a educação e a agricultura. Estamos perante uma personagem cada vez mais isolada, triste, desesperançada, histriónica e conformada.
3.As entrevistas concedidas a dois canais diferentes de televisão foram um desastre. Na primeira entrevista tivemos o tigre da Malásia; na segunda, o porquinho feio da Disney. Aliás, confirma-se aquilo que Abélés (1992:17) identifica como a crise da legitimidade que afeta a vida política, referindo que a autonomia do político nas sociedades actuais é uma ilusão. Governar com maioria absoluta ou em minoria implica uma valorização continua das relações entre governantes e governados. A perda de legitimidade e de reconhecimento deste governo e deste Primeiro Ministro, por parte da sociedade portuguesa levou o Presidente da República a lembrar que sem legitimidade os governos são fracos mesmo de maioria parlamentar.
Um governo fraco, incapaz, incompetente e demagógico não garante a continuidade nem configura um selo de boa governação para o país. Por último, um governo que não garante uma governação pacifica, pode abrir a porta a alternativas populistas e demagógicas que coloquem em causa o regime democrático. Regressamos ao fantasma dos governos de Sócrates e de um PS mafioso e clientelar.
O problema central da política portuguesa não é só o da incompetência de um “governo morto”, mas a aposta em políticas que não se ajustam às necessidades de um país. Um país que na rua reivindica uma maior qualidade dos Serviços Públicos na Educação e na Saúde. É tempo de interromper as políticas neoliberais comandadas a partir de Bruxelas.
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