E a Europa ali tão longe?

Se na primeira entrevista de António Costa, a boa nova era apresentada com arrogância e mesmo como ameaça, na segunda o compromisso foi suave e cheio de promessas…

Afinal o primeiro-ministro António Costa não irá desempenhar nenhum dos três cargos cimeiros que dirigem os destinos da UE, pois afirmou (mais do que se comprometeu) que estará à frente dos destinos do Governo até ao fim da legislatura, ou seja até ao último trimestre de 2026.

Esta garantia decorre das declarações proferidas durante duas entrevistas que concedeu à revista Visão e à RTP, para comemorar o primeiro aniversário da maioria absoluta.

E se na primeira entrevista, a boa nova era apresentada com arrogância e mesmo como ameaça, já na segunda oportunidade, provavelmente como consequência de um inquérito à opinião pública desfavorável, o compromisso foi suave e cheio de promessas (com ênfase especial para a habitação) problema, sabe-se lá porquê, não houve tempo para resolver nos sete anos antecedentes.

Na política portuguesa, como dizia alguém, ‘o que hoje é verdade, amanhã é mentira’ e as circunstâncias nacionais podem mudar ou o humor do primeiro-ministro pode transfigurar-se de uma semana para a outra, como se viu com o estilo usado nas duas entrevistas já citadas.

Contudo, mesmo nessas circunstâncias, não será fácil conquistar nenhum desses lugares: a presidência do Parlamento, porque o primeiro-ministro não é deputado europeu e a Presidência da Comissão, porque será ocupado por Ursula von der Leyen que é a mulher certa no lugar certo, não só pelo que fez ao longo do atual mandato mas pela segurança que imprime na estabilidade das relações entre a UE e os EEUU e no protagonismo que representa no apoio europeu à martirizada Ucrânia.

Resta a Presidência do Conselho Europeu, que ficará livre no fim de 2024, sem hipóteses de renovação e não estava livre há cerca de um ano e meio quando alguns comentadores já anunciavam (ao serviço de quem?) a substituição de Charles Michel.

Só que a atribuição dos lugares cimeiros europeus tem uma lógica própria que depende essencialmente do resultado das próximas eleições europeias, mas nada impede que se possa gerar um consenso em volta de uma figura, experiente e conhecedora da realidade europeia (por exemplo Mario Draghi) o que, a concretizar-se, seria uma mais valia para a política europeia.

Resolvido (PM dixit) o problema da estabilidade (durabilidade) da legislatura, pelo menos até que surja um novo estado de alma, o que não é tão improvável como se possa supor, é altura de decidirmos sobre o futuro para Portugal.

 

É consensual que os últimos sete anos de governação (coincidentes com a experiência conhecida como ‘geringonça’) foram uma oportunidade perdida, apesar dos avultados recursos financeiros que obtivemos da União Europeia e do benefício de uma política monetária do BCE que eliminou um dos nossos principais constrangimentos, com a redução das taxas de juro e com a compra de dívida dos estados soberanos.

Apesar disso, a economia portuguesa só cresceu, no conjunto dos últimos oito anos, cerca de 17%, que corresponde a 2% anuais, o que foi manifestamente insuficiente e dramático quando se compara com o crescimento de países que estão no campeonato da nossa concorrência.

Segundo os últimos dados, Portugal está a ser o quarto país da Zona Euro com mais dificuldade para recuperar após a pandemia).

A propaganda oficial dirá que a riqueza nacional cresceu 6,7 em 2022 (embora esteja atualmente estagnada), depois de ter crescido 5,48 em 2021, mas oculta que diminuiu 8,3 % em 2020. É a chamada tortura dos números.

Até se pode afirmar que, nalguns anos, crescemos mais que a média europeia, mas isso só tem a ver com crescimentos percentualmente menores das economias mais desenvolvidas, que, obviamente, face ao desenvolvimento já alcançado, tem sequências completamente diferentes.

Por isso é que, apesar dos periódicos milagres estatísticos, Portugal tem vindo a ser ultrapassado por diversos estados membros, em PIB per capita e, nomeadamente, em paridades de poder de compra.

Ora este insuficiente desempenho, não é uma maldição, mas antes resulta de uma inevitabilidade que decorre da ausência, desde há vários anos, de políticas reformistas (no domínio social, mas também na desburocratização, na melhoria das infraestruturas de transporte e nos apoios justos à economia real).

Tudo se torna mais claro e é mais fácil de explicar, quando verificamos que Portugal ocupava em 2020 a posição 21, entre os 27 Estados-membros da UE, em produtividade por hora trabalhada (em 2000 era 17) e mantém uma carga fiscal total, de 2016 a 2022, com Costa como PM, equivalente a 34,7% do PIB, superior à média da OCDE e (pasme-se) também superior à média do Governo de Passos Coelho e da troika (33,4% entre 2011 e 2015).

Apesar de o Estado ter arrecadado no ano passado, por efeito da inflação, mais 3,7 mil milhões de euros foque o previsto, a situação dos portugueses mais desfavorecidos e da classe média é insustentável e está a ser sacrificada no ‘altar’ das contas certas que, a partir de certo nível, não pode ser um fim em si mesmo pois tem de ser uma alavanca ao serviço do desenvolvimento.

 

Resta o PRR e o novo quadro comunitário de apoio que, se não forem devidamente aplicados mas usados apenas como propaganda eleitoral (como recentemente temeu a Comissária Elisa Ferreira) nos colocará ainda mais longe da Europa que poderia estar ali tão perto e afinal cada vez está mais longe.