Turquia: O povo contra Erdogan

Diversos membros da população turca criticam a resposta de Erdogan face ao terramoto que devastou o país.

Turquia: O povo contra Erdogan

Enquanto começam a ser detidos na Turquia diversos indivíduos ligados a más práticas de construção civil, o povo volta as suas atenções para o governo turco, criticando as respostas ao terramoto que abalou este país e a Síria, causando mais de 41 mil mortos.

«O sistema está errado da cabeça aos pés», disse o proprietário de um supermercado de 50 anos, Halil Ibrahim Çalıskan, à Al Jazeera. «Não podemos culpar o destino por tudo – as pessoas têm que fazer seu trabalho, elas têm que seguir as leis», lamentou.

Este homem viu o seu «ganha-pão», o seu supermercado, ser derrubado e destruído. Apesar de reconhecer que vivia numa zona propicia a terramotos, este defende que o caos que a Turquia está a enfrentar não pode ser apenas atribuído ao «azar».

«As pessoas são culpadas por fazer edifícios fracos», afirmou Çalıskan, que apenas conseguiu resgatar alguns produtos das suas arcas frigoríficas exteriores para os devolver aos seus fornecedores e reduzir a sua dívida. Segundo os seus cálculos, terá perdido cerca de 1 milhão de liras turcas (cerca de 50 mil euros). «Dias difíceis estão por vir», confessou ao meio de comunicação.

Mas as críticas ao governo não surgem apenas do povo que sofreu perdas inimagináveis. Os voluntários envolvidos nos trabalhos para apoiar as vítimas condenam a falta de apoios que estão a receber.

«Conseguimos carregar 18 camiões e mandá-los para a zona do terramoto. Eles estão cheios de cobertores, roupas, mas há uma necessidade mais urgente de alimentos. Independentemente, de como podermos enviar, não interessa. As pessoas precisam de comida», disse uma estudante de 18 anos, Emrihan Korkmaz, citada pela rádio norte-americana NPR.

Na Turquia, todas as escolas foram fechadas para os estudantes, professores e trabalhadores poderem fazer o luto pelas vítimas, mas também para oferecerem assistência no terreno.

Outra estudante, Irim Nur Soleymez, de 20 anos, também entrevistada pela rádio, foi questionada se achava que o governo do Presidente Recep Tayyip Erdogan tinha feito o suficiente para ajudar as vítimas.

«Eles fizeram o que puderam», disse, acrescentando que «não era hora de falar sobre política». «É hora de ajudar as pessoas que precisam», sublinhou.

Detenções por

‘publicações provocatórias’

Face às críticas por parte da população, a polícia turca anunciou, esta quarta-feira, que prendeu 78 pessoas acusadas de criar medo e pânico ao «partilhar publicações provocatórias» sobre o sismo passada nas redes sociais.

Esta informação foi partilhada pela Reuters, que acrescentou que 20 dos detidos estão em prisão preventiva, mas ainda existem mais 613 pessoas identificadas, revelou a Direção-Geral de Segurança da Turquia.

O parlamento da Turquia adotou, em outubro do ano passado, uma lei que declara que jornalistas e utilizadores de redes sociais podem ser presos até três anos por espalhar ‘desinformação’.

A lei levantou preocupações entre grupos de direitos humanos e países europeus em relação aos problemas relacionados com o controlo da liberdade de expressão, especialmente antes das eleições presidenciais e parlamentares, marcadas para este verão.

Estas eleições já estavam a ser consideradas um desafio difícil para Erdogan, que se encontrava numa posição sensível devido à inflação descontrolada que tem afetado a economia do país. A postura face a este terramoto é mais um ponto negativo no seu mandato.

O governo tem sido alvo de duras críticas devido à resposta ao terramoto, nomeadamente em relação à preparação do país para enfrentar este desastre.

Depois de um terramoto no noroeste da Turquia, em 1999, que fez mais de 18 mil vítimas mortais, o governo criou um imposto que deveria ser destinado a arrecadar cerca de mil milhões de euros para ser investido em prevenção e alívio destes desastres naturais.

Além disto, devido à forma centralizada como o governo de Erdogan está organizado, foram colocadas diversas restrições na forma como as cidades e organizações de ajuda podem atuar, o que está a dificultar as operações de resgate.