Os sismos são assim tão inesperados?

Vivemos com o mito da ‘gaiola pombalina’, mas a realidade é que só na década de 80 o país passou a ter um regulamento antissísmico verdadeiramente eficaz.

por David Pereira
Presidente da APROSE – Associação Nacional de Agentes e Corretores de Seguros

Vivemos com o mito da ‘gaiola pombalina’, mas a realidade é que só na década de 80 o país passou a ter um regulamento antissísmico verdadeiramente efic

Vamos diretos ao assunto: o célebre seguro multirriscos não é assim tão ‘multi’. Na realidade, é quase impossível fazer um seguro, contra riscos sísmicos, a um imóvel anterior a 1950. Especialmente se esse imóvel estiver numa zona de risco. Como Lisboa. O que deixa de fora grande parte do edificado nacional. E, estranhe-se, a responsabilidade não é (só) das seguradoras.

Vivemos com o mito da ‘gaiola pombalina’, mas a realidade é que só na década de 80 o país passou a ter um regulamento antissísmico verdadeiramente eficaz. E só há um par de anos passámos a ter requalificação sísmica dos edifícios. E só em alguns edifícios. Acresce a isso o facto da maior parte do país estar numa zona sismologicamente sensível. O que faz deste tipo de seguros uma espécie de aposta. Um enorme risco comercial que poucas (ou quase) nenhumas companhias estão dispostas a correr. E, se olharmos com objetividade para os factos que acabei de referir, compreende-se. A sustentabilidade financeira das seguradoras é um tema sério.

Mas apesar destes factos, apesar dos números, a situação não causa estranheza. O caso não é muito discutido e preocupa pouco e poucos. É considerado normal. Porquê? Porque em caso de uma calamidade contamos sobretudo com o Estado. Mas o Estado, numa situação dessas, pode não chegar para todos. Nem a todos. E vivemos bem assim. Fingindo que o tema não é tema. Para evitar o ‘alarmismo’.

Mas há uma outra hipótese: encontrar soluções.

Noutros países de elevado risco, e com as mesmas dificuldades, foi adotada a solução de um Fundo. É um caminho, entre muitos outros. Mas seja qual for a solução adotada, uma coisa é certa: tem que ser discutida e criada à mesa com os principais atores neste tema: as seguradoras, que constroem os produtos, os mediadores, que compreendem os consumidores, os engenheiros, que conseguem mapear e radiografar os riscos e os reguladores, que supervisionam todo o sistema. E é preciso começar. Agora. Todos sabemos que encontrar uma solução é uma necessidade, a cada ano que passa, cada vez mais urgente. Nós, os mediadores, como mandatários dos consumidores e interpretes dos consumidores, estamos disponíveis para fazer a nossa parte.