O PS de António Costa, a falta de casas acessíveis, e os outros graves problemas dos portugueses que não são ricos…

Desde que vivemos num regime “socialista”, a única coisa que realmente conta é a imagem – ou seja, o que importa é publicitar eficazmente uma fantasia desejável e vencer eleições, em lugar de resolver os problemas concretos das pessoas, isto é, governar bem o país.

Por António Silva Carvalho

Portugal era um país muito diferente do que é hoje, antes de Sócrates e Costa obterem o poder absoluto.

A mudança começou a notar-se no tempo em que Sócrates, o “animal feroz” – e também “o menino de ouro do PS” –, quis e quase conseguiu controlar e mandar em tudo.

Foi nessa altura que certos vícios do regime tiveram início, quando muita gente, em especial no PS, passou a achar normalíssimo, e até vantajoso, que um primeiro-ministro tivesse certos traços de personalidade um tanto amorais, e modos de exercer o poder por vezes incompatíveis com democracia, ofensivos e merecedores de denúncia pública.

A forma como, por exemplo, ele lidava com os jornalistas fez com que muitos deles entrassem em confronto com essa poderosa criatura – o que acabou por vir a ter, paradoxalmente, um efeito salutar, na medida em que a nossa comunicação social, tão atreita a não fazer suficiente uso da liberdade de expressão e de escrutínio que o 25 de Abril possibilitou, ao sentir-se atacada, humilhada e prejudicada, levou bastantes jornalistas a, finalmente, terem vontade, ânimo e coragem para actuar profissionalmente como é suposto actuarem sempre, nos países em que existe essa possibilidade sem se correr o risco de prisão ou morte: com muita atenção à realidade, isenção e sentido crítico, e sem nenhuma complacência ou receio face aos poderosos.

Lembremo-nos que, no primeiro governo de José Sócrates, António Costa era o seu nº 2 e, entre outras áreas, tutelava o sector dos arrendamentos urbanos, ou seja, os problemas da habitação (tendo, como secretário de Estado, o seu grande amigo Eduardo Cabrita, esse espantoso político…).

E foi precisamente nessa matéria que Costa começou a revelar as características que iriam torná-lo célebre como governante: sobretudo, prometer e anunciar façanhas dificílimas e imprescindíveis que, uma vez feitas, muito beneficiariam imensos portugueses – e, depois, acabar por mandar fazer tudo ao contrário do que havia prometido e anunciado – sempre sorridente e de consciência tranquila, isto é, sem qualquer crítica por parte da comunicação social.

Foi assim que a maioria dos media tiveram, ao longo de quase vinte anos, um papel determinante nas suas vitórias políticas, fizesse ele as asneiras que fizesse, dissesse ele as mentiras que quisesse e julgasse mais úteis para si – por outras palavras, a maioria dos jornalistas e comentadores actuaram, até há pouco tempo, como se fossem seus cúmplices, ou como agentes interessados em favorecê-lo politicamente. (É esta, pelo menos, a minha percepção de tudo o que fui vendo na televisão e lendo nos jornais).

Até que – e não sei precisar quando nem porquê, só sei que foi há alguns meses –, constatei que acontecera no país uma nova mudança de ‘clima’, bem maior do que a ocorrida no tempo de Sócrates, ao aperceber-me de que grande parte dos media tinham passado a escrutinar e criticar tanto o discurso, como a acção de António Costa e do seu governo.

A partir daí, essa entidade supostamente encarregada de governar o país iniciou um processo de esboroamento e de óbvia degradação, como se, na verdade, Portugal tivesse deixado de ser governado por gente minimamente preparada, responsável, e credível.

Mais: a generalidade dos portugueses pôde, finalmente, dar-se conta deste apodrecimento e incapacidade da instituição Governo, não porque se tratasse de algo de novo, mas só porque muitos media nacionais tinham, por fim, e mais intensamente do que outrora, decidido cumprir aquilo que é, e sempre foi, a sua função social primeira: informar o povo com verdade, isenção e espírito crítico sobre o que se vai passando, e comentar com total liberdade.

Desde que essa mudança mediática ocorreu, Costa começou por ficar desorientado: perdeu a cabeça e reagiu dizendo e fazendo os disparates e as brutalidades que a sua personalidade gera. Depois, como tem a habilidade política que todos lhe reconhecem, soube controlar o seu discurso, e pareceu revelar alguma sensatez. Porém, sendo o governante medíocre e sem ideias que também é, a sua acção política e as suas decisões não se alteraram em nada, pelo menos que eu tenha notado.

Podia falar, a propósito da evolução havida, de muitos casos e situações – que se têm passado em áreas como a Saúde, a Educação, a Justiça, as chamadas Infraestruturas, etc., etc. –, mas o exemplo que me surge como mais paradigmático da incapacidade deste governo é, de novo, o que diz respeito aos problemas da habitação sob a batuta de António Costa e do PS – tema sobre o qual, aliás, me interessei e escrevi já longamente para jornais, desde há cerca de 18 anos.

O ‘problema da habitação’ e o modo como o governo de António Costa promete solucioná-lo.

Juntamente com outros falhanços que enxameiam diversos sectores, o problema de não haver casas a preços acessíveis à grande maioria dos que querem viver no nosso país tornou-se, no Portugal contemporâneo, e em especial nos últimos tempos, um dos assuntos de que mais se fala na comunicação social, mas igualmente um dos problemas mais difíceis e complexos de analisar com seriedade e rigor, de debater sem indignações histéricas, e de solucionar sem que isso implique o extermínio de nenhum grupo social.

Por outro lado, trata-se também de um dos problemas que acarreta maiores perplexidades e angústias ao cidadão comum que procura casa e não é abastado, já que, apesar de vivermos em democracia, a palavra de cada um conta pouco ou nada para moldar as leis que vão vigorando para o sector.

Conheci bastante bem este universo nas épocas em que vivi como adulto – o Estado Novo e o regime que teve início em Abril de 1974 -, tanto do ponto de vista teórico (i.e., as sucessivas legislações aplicáveis), como em termos práticos (modos de relacionamento entre senhorios e inquilinos, funcionamento dos tribunais, etc.).

Justamente pela sua grande complexidade, e devido à multiplicidade dos aspectos que engloba, seria irrealista pretender que num artigo de jornal fosse possível fazer-se uma análise completa e abrangente deste tema; o presente artigo terá de ser, portanto, um texto assumidamente parcelar e sucinto, limitado aos aspectos que melhor conheço e que julgo serem os mais cruciais na presente conjuntura.

Uma das razões que tornam especialmente difícil a análise crítica deste tema, tem a ver com a inexistência de paralelismo entre a situação económico-financeira da maioria dos portugueses e, por outro lado, a decisão que cada cidadão toma de morar em casa própria ou arrendada – algo que faz do Portugal moderno (pois no tempo do Estado Novo havia uma situação oposta à de hoje) um caso singular e dificilmente compreensível aos olhos, por exemplo, de um estrangeiro bem documentado. 

Outra das razões para a falta de clareza e de inteligibilidade da situação portuguesa nesta área, é o facto de, ao longo de quase cinco décadas, sucessivos governos democráticos terem produzido, e mantido em vigor, leis sobre o arrendamento urbano que, em termos de racionalidade económica e social, não podiam deixar de causar graves consequências à maior parte da população e ao próprio Tesouro Público – e, no entanto, duma ponta à outra do espectro político, os partidos terem actuado como se concordassem todos com as leis adoptadas; e, por seu turno, a comunicação social, perante tão anómala e grave situação, ter também funcionado, quase unanimemente, como se fosse cega, surda e muda.

Ainda outra razão para os paradoxos existentes nesta matéria, foi o facto de essas leis determinarem coisas que, em seguida, o Estado democrático de direito foi, ele próprio, transgredindo por sistema, e sempre impunemente, sem que qualquer entidade ou instituição (desde os presidentes da República aos tribunais), pusesse em questão tais práticas ilegais, e até inconstitucionais. 

Nos últimos tempos, muitas pessoas têm associado a falta de casas a preços acessíveis nas duas principais cidades (tanto para quem pretende arrendar, como comprar) e a progressiva subida de preços, ao facto de o turismo e a imigração de estrangeiros ter crescido imenso, para números nunca antes vistos ou sequer imaginados, havendo mesmo quem acuse este inédito “boom turístico” de representar, não uma enorme vantagem para o país (em termos económicos sobretudo), mas sim um mal para a maioria dos portugueses, e contra o qual a esquerda ‘exige’ medidas muito mais restritivas.

O que quase ninguém refere é que os actuais preços das casas (sobretudo) nas duas maiores cidades, e a preferência cada vez maior dos senhorios pelos alugueres de curta duração (a turistas e a estudantes principalmente), são uma consequência lógica das sucessivas legislações para o sector aprovadas desde 1974, todas elas erradíssimas – e, por outro lado, decorrem do facto (que muitos portugueses lamentam até hoje) de não termos passado a viver, após o 25 de Abril, submetidos a um regime totalitário de tipo soviético, em que os cidadãos comuns ficariam privados de liberdades, nomeadamente a de expressarem opiniões contrárias às de quem manda, e a de possuírem a sua própria casa.

Quem queira mesmo entender como as coisas evoluíram nesta matéria não deverá esquecer que, entre 1974 e 2011, os partidos políticos tudo fizeram para que no nosso país deixasse de poder funcionar com normalidade um verdadeiro mercado de arrendamento; também importa não esquecer que, desde meados da década de 80, tudo foi feito pelo poder político para convencer os portugueses (fosse qual fosse a sua situação profissional e económica) da conveniência que tinham em serem donos, e não inquilinos, das casas onde morassem.

O regime nascido em 1974 nunca hesitou em legislar no sentido de asfixiar economicamente os antigos senhorios (numa época de altas inflações), e de fazer com que o crédito hipotecário para compra de casa (e não o crédito a empresas produtivas) se tornasse o negócio prioritário da banca em Portugal. Chegou mesmo a parecer (e a ser legítimo suspeitar-se) que os legisladores, ao fazerem leis para o sector do arrendamento, não estavam realmente interessados em favorecer e compatibilizar os legítimos interesses de inquilinos e senhorios, mas sim dispostos a beneficiar apenas alguns dos interessados nesta questão: os inquilinos (fossem eles ricos ou pobres), e os bancos (que, por sua vez, só queriam que os cidadãos comprassem casas por meio de crédito hipotecário, sendo-lhes indiferente, ou até desejável, o eventual desaparecimento do mercado de arrendamento).

Alegadamente, tudo isto foi feito ‘a fim de proteger os cidadãos mais desfavorecidos’; mas, na realidade, o que essas leis de facto fizeram foi manter por tempo indefinido os privilégios de que já gozavam (entre outros) os próprios legisladores que tinham a condição de inquilinos, sem que ninguém se lembrasse que havia que prevenir os ‘efeitos colaterais’ nefastos que, das ditas leis, poderiam resultar para as pessoas verdadeiramente desfavorecidas.

Na verdade, e em larga medida, os políticos envolvidos conseguiram o que pretendiam: Portugal passou a ter uma percentagem de ‘proprietários de imóveis’ muito superior à que existe nos países europeus mais ricos (Alemanha, Holanda, etc.), e uma situação francamente “próspera e saudável” do seu sistema bancário, tal como antes nunca houvera no País, sobretudo durante a “longa noite do fascismo”…

Em termos económicos, a situação que existiu em Portugal entre 1974 e 2011/12 e, mais especificamente, desde a nossa adesão à CEE até ao resgate pela troika, pode ser caracterizada, em suma, do seguinte modo: todos os sectores de actividade económica puderam funcionar de acordo com as leis e regras de uma economia social de mercado – todos, menos o do arrendamento urbano. Os agentes económicos puderam beneficiar das vantagens que sabidamente decorrem da circunstância de estarem a actuar num contexto de sã e livre concorrência – todos, à excepção dos antigos senhorios.

Em 2011, a iminência da 3ª bancarrota pública desde 1974 e a recusa dos bancos em continuar a conceder empréstimos a um Estado endividadíssimo e já incapaz de honrar as suas dívidas, forçaram o então primeiro-ministro socialista, José Sócrates, a solicitar ajuda financeira aos nossos credores externos – os quais, entre outras exigências, impuseram como condição para o resgate algo de inédito entre nós: uma reforma séria da lei do arrendamento que incluísse o fim das rendas congeladas.

Sem essa imposição do exterior, a ruína progressiva de milhares de imóveis em Lisboa e no Porto teria prosseguido, sem que ninguém (nem mesmo os fundos de investimento internacionais) mostrasse o menor interesse na respectiva reabilitação; e só um reduzido número de estrangeiros viria visitar-nos, tal como acontecera até então, curiosos que estavam por ainda existir, na Europa e no séc. XXI, um país tão ‘pitoresco’ que deixava arruinarem-se, e ficarem desabitados, os centros históricos das suas principais cidades, sem que as autoridades públicas (nacionais e municipais) se esforçassem por resolver essa anómala situação – muito pelo contrário.

Também importa recordar que os dirigentes do Partido Socialista, e muito em particular António Costa como ministro de Sócrates, foram, ao longo de décadas, os responsáveis políticos mais apostados em dar cabo do mercado de arrendamento, tendo mesmo havido um, João Cravinho, a afirmar na TV, ao jornalista Mário Crespo, que apenas o passar do tempo (isto é, só a morte de todos os envolvidos na situação, senhorios e inquilinos) tornaria possível pôr fim às gravíssimas distorções, injustiças e demais efeitos perversos resultantes de tantos anos de rendas congeladas – mas, disse-o ele também, o PS, por si, decidira nada fazer no sentido de alterar, em termos substanciais e não só cosméticos, a lei das rendas então em vigor.

Por conseguinte, faz o papel de hipócrita ou cínico quem hoje – a não ser que desconheça tudo isto – se diz surpreendido, ou até escandalizado, pelo facto de os agentes económicos em questão (os antigos senhorios), que o actual regime prejudicou e empobreceu deliberadamente durante tanto tempo e de forma tão ilegítima, estarem agora, após todos estes anos, procurando finalmente colher algum benefício económico, pelo facto de aquela exigência da troika lhes ter permitido, pela primeira vez na vida, funcionar de acordo com as regras de uma economia de mercado, e tentando ressarcir-se, em parte, das enormes perdas que durante décadas foram forçados a suportar, impostas de forma arbitrária e despótica pelo poder político (e que, aliás, constituem um caso de discriminação e exclusão social sem paralelo na nossa história colectiva).

Também não devia espantar ninguém que esses cidadãos tenham deixado por completo de acreditar e confiar num Estado, dito de Direito, e que apregoa sempre ser “pessoa de bem”, mas que relativamente a eles se portou sem dúvida de modo mais fascista do que o próprio ditador Salazar.

São estas as verdadeiras razões que estão na base da situação hoje existente, em Lisboa e Porto, no que se refere ao uso que é dado aos edifícios de particulares, aos preços praticados no mercado imobiliário, e aos consequentes ‘problemas da habitação’ que, pelos vistos, parecem preocupar tanto o PS, e os seus parceiros da ex-geringonça.

E só quem seja ingénuo ou pobre de espírito, ao ponto de acreditar nas falácias dos nossos políticos mais vocais (sobretudo quando prometem ‘mundos e fundos’, como agora), pode ainda permitir-se supor que quem foi responsável activo pela criação e manutenção desta situação indesejável esteja, também, disposto, habilitado e apto a solucionar, de modo democrático e decente, os problemas e as dificuldades que hoje em dia existem no sector da habitação.

Tendo este regime as características ‘ideológicas’ que mantém, e na actual conjuntura, se eu fosse potencial senhorio e tivesse uma casa disponível, decidiria não aceitar nenhum inquilino – punha a casa à venda ao ‘preço de mercado’ e recusar-me-ia a vendê-la por valor inferior.

Arrendar, nem pensar! Já que o governo da maioria absoluta de Costa continua a tratar os senhorios como gente a abater (não obstante finja o contrário), eu por mim preferiria actuar no sentido de contribuir para o desaparecimento do simulacro de ‘mercado de arrendamento’ que ainda existe, e tem enganado tanta gente.

Isto, para já nem falar dos muitos imóveis pertencentes ao Estado, que se encontram em vários níveis de conservação e devolutos há anos, sem que a opinião publicada dê sinais de considerar tal situação questionável, menos ainda intolerável, num país governado por “socialistas”.                                                                      

Desde que vivemos num regime “socialista”, a única coisa que realmente conta é a imagem – ou seja, o que importa é publicitar eficazmente uma fantasia desejável e vencer eleições, em lugar de resolver os problemas concretos das pessoas, isto é, governar bem o país.

Foi este equívoco que levou o PS de Costa a obter maioria absoluta nas últimas eleições legislativas. A generalidade dos eleitores ainda não tinham percebido aquilo de que o PM é capaz, e aquilo de que ele é incapaz: António Costa é um político muitíssimo habilidoso, mas é medíocre como governante. Ele sabe o que é preciso dizer às multidões para que votem nele. Mas não parece fazer ideia do que seja governar bem, pois não sabe o que fazer para resolver os problemas concretos de milhões de pessoas – em todas as áreas da governação.

Mesmo assim, arranjou maneira de contratar Luís Paixão Martins, o perito em comunicação e imagem que conseguiu que três candidatos – Cavaco Silva, José Sócrates e António Costa – ganhassem eleições com maiorias absolutas. Só que, infelizmente para Costa, Paixão Martins não pode ajudá-lo a governar bem, só o ajudou a ganhar as eleições. Ainda assim, já lhe fez um favor extra nesse sentido, ao dizer recentemente, na televisão, que se a TAP continuar a ser um problema estatal, o PS perderá as próximas eleições. Ou seja, Costa não deixará de mandar vender a TAP – seja como for – porque o seu PS não pode correr o risco de não vencer eleições… era o que faltava!

E é nestes termos que os portugueses têm sido tão desgovernados desde há mais de sete anos – com ou sem PRR, isto é, com ou sem “bazuca”, que é o nome que o PM deu a esse generoso plano, quiçá por um lapso freudiano, pois, como é sabido, a bazuca é uma arma de guerra portátil, um lança-granadas, e é ou era usada por militares para matar inimigos. Ora, não sendo ele estúpido nem a tal ponto ignorante, terá de haver alguma razão obscura que possa justificar este ‘cognome’ que ninguém esperava. Por outras palavras: quem serão os inimigos que António Costa está interessado em matar, a pretexto da “implementação” do PRR?

Há alguém que saiba esclarecer este mistério semântico?