Expectativas em alta com novo presidente

Luís Rodrigues, até aqui presidente da SATA, já é visto como o ‘Paulo Macedo da aviação’. A ideia é usar a fórmula que usou na companhia área açoriana: aplicar plano de reestruturação e criar paz social na empresa até que a companhia seja privatizada. Apesar das polémicas, tudo indica que os três grupos continuam interessados.

Por Sónia Peres Pinto e Daniela Soares Ferreira

A polémica em torno da TAP continua ao rubro, mas agora os olhos postos estão no próximo CEO da companhia aérea. Luís Rodrigues, até aqui presidente da SATA, vai tomar as rédeas da empresa de aviação. Várias fontes ligadas ao setor admitem ao Nascer do SOL que é uma «espécie de Paulo Macedo, na aviação». E tem como objetivo fazer o mesmo que já fez na empresa açoriana, desde 2020: cortar nos custos e criar paz social na empresa com vista à sua privatização.

Ainda esta semana, o Governo dos Açores revelou que o caderno de encargos da privatização da Azores Airlines, que pertence ao grupo SATA, prevê uma alienação no «mínimo» de 51% e no «máximo» de 85% do capital social da companhia. Duarte Freitas disse também que a publicação do anúncio do concurso para a sua privatização está prevista para entre 15 e 17 de março e que a entrega de proposta vai decorrer entre 15 a 17 junho.

Em relação à data de alienação da TAP ainda não são conhecidos detalhes. O ministro das Finanças disse apenas que será conhecido em breve o processo de alienação da empresa, pelo que tudo indica que Luís Rodrigues será administrador a curto prazo. 

Ricardo Penarróias, presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), vê com muito bons olhos esta escolha. «É acertada, porque conhece muito bem o meio, a indústria e tem resultados em várias companhias, incluindo a SATA, o que é muito importante». O responsável sindical lembra que Luís Rodrigues conseguiu com a SATA «garantir uma paz social» e espera que a sua saída não seja prejudicial para a companhia aérea dos Açores.

Os elogios continuam: «Tem algo que ao longo destes meses sempre fomos alertando e questionando o que é cultura TAP. Ele já conhece a TAP e é fundamental que alguém que venha não seja um paraquedista e que não conheça, como era a CEO e outros diretores da área que não conhecem a sua realidade, nem conhecem as especificidades da companhia, algo que Luís Rodrigues, nesse propósito, está muito mais à frente porque já conhece muito a cultura da empresa».

Também o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) aplaude a escolha do novo gestor, referindo que tem «provas dadas de excelente profissionalismo».

Privatização da TAP

Questionados se estas polémicas e ‘dança de cadeiras’ (ver páginas 6/7) poderão pôr em causa o processo de alienação, vários especialistas contactados pelo Nascer do SOL acreditam que não há motivos para preocupação. Para Sérgio Palma Brito, a página só será virada quando a TAP for privatizada a 100% «e deixar de ter influência política, que está na origem de toda esta trapalhada». Considera todos estes acontecimentos «uma nota de rodapé» e «apenas mais um argumento para o Estado sair de uma empresa cuja gestão competitiva é incompatível com a presença do Estado». E continua: «A TAP atua num dos mercados mais competitivos que há no mundo, foi estabelecido pela regulação europeia, concebida para empresas privadas ágeis em adaptar-se no mercado. E uma empresa onde está o Estado é tudo menos ágil».

Muito crítico da situação atual, Palma Brito atira: «Toda essa trapalhada só porque foi preciso substituir uma administradora numa sociedade anónima cotada em bolsa. Qualquer um dos grupos que está interessado já conhece Portugal, já teve um consultor que lhe explicou de certeza que Portugal é um pais sui generis com muitos sindicatos, muita opinião pública, muito Governo a meter o bedelho».

No que diz respeito à possível compra por parte do grupo Iberia, Sérgio Palma Brito fala numa «confusão desgraçada», explicando que o grupo IAG «resulta da fusão da Iberia com a British Airways, Aer Lingus e a Vueling». Ou seja, a TAP, a ser adquirida, é pelo grupo IAG – nunca pela Iberia. E aí há duas nuances. «Se for integrada no grupo, a TAP passa a ser uma empresa operacional cujo CEO participará no board do IAG. O status poderá ser pago em parte por ações do IAG e a TAP tem que responder às exigências da gestão do IAG. A outra possibilidade que acho que seria má em qualquer dos casos é o grupo entrar apenas como gestor, que é mais ou menos o esquema que o grupo Lufthansa está a utilizar na italiana. Isso seria manter o Estado. Agora também digo que não partilho dessa história do argumento da padeira de Aljubarrota».

Defendendo que o IAG «é o grupo mais bem gerido da Europa e é por isso que eu gosto dele», o especialista acha que esta aquisição podia ser boa para a TAP. «Esse grupo tem uma estratégia que é clara e pública desde há anos, que é fazer de Madrid um hub europeu ao nível da Holanda, etc. Este desígnio estratégico não é compatível com o hub de nicho. Lisboa é um hub de nicho. Não é incompatível com um hub de nicho em Lisboa para as rotas Brasil, até porque há uma coisa que é preciso pensar: as rotas Brasil são operadas pela TAP porque esta foi indicada pelo Governo português como uma das companhias que pode operar ao abrigo do acordo bilateral Portugal-Brasil».

E nota que, normalmente, quando um grupo adquire uma empresa nessas circunstâncias, não é para destruir valor, é para criar valor. Mesmo assim, defende que o negócio «exige algumas boas cláusulas de salvaguarda no contrato de aquisição, mas não garante que o hub é perpétuo ou vitalício, disparates esses que se fizeram durante a privatização de 2015. Também é preciso alterar sobretudo o acordo de empresa».

Alteração radical que se verificou em todas as empresas do IAG, para vencer os poderes sindicais acumulados durante anos e anos de Estado. «Isso vai dar um conflito intenso como, aliás, deu em 1993. O que tem que haver aí é uma estratégia muito clara – por enquanto o Governo não a tem mas pode ser que venha a ter por facilitação do novo CEO – é preciso ter uma estratégia muito clara, uma firmeza muito grande entre o acionista e a gestão e, por fim, haver sindicalistas que percebam que o futuro, se eles querem ter um futuro, não é manter privilégios absurdos, é entrando num novo modelo de operação das companhias aéreas da Europa». Outro desafio que o novo líder da TAP tem pela frente é, considera, justamente aproveitar as oportunidades. 

Ricardo Penarroias diz não saber se as recentes polémicas poderão ou não prejudicar a privatização. E justifica: «Se olharmos bem para todo o processo em si, mesmo bilateral e paralelamente, a verdade é que os interessados são sempre os mesmos, independentemente de haver ou não covid. Sempre disse que não é seguramente pelos gestores da empresa que a companhia é atrativa, ela é atrativa pelo seu know-how, pela sua capacidade, muitas vezes, de se regenerar ao longo dos seus 77 anos, pelos seus slots, pela sua posição geoestratégica. A companhia sempre esteve envolvida em muita polémica e isso não são fatores de desinteresse por parte de possíveis compradores».

Já Pedro Castro, também especialista em aviação, diz que, para já, o grupo IAG sabe que este processo da Air Europa não está seguro. «O IAG tem um cenário que é o cenário de o negócio avançar, o cenário B em que diz este negócio vai avançar mas com muitas restrições (que são os remédios que a AdC dá e que muitas vezes não são economicamente bons) ou o negócio não avança de todo». Não sabendo qual é o cenário de desfecho, o IAG não pode descartar já a TAP. 

Mesmo que tendo uma hegemonia muito grande em Madrid, nada impede que «o IAG não queira fechar o ciclo aqui», continua Pedro Castro. «Quando digo fechar o ciclo é ter um domínio muito grande do comércio para a América Latina no seu todo e nos hubs mais naturais para esse tipo de voos». O responsável lembra que é preciso não esquecer que o IAG tem uma penetração em África bastante limitada e não tem nenhum hub europeu natural para isso. «Portanto, há ainda vários parâmetros que podem continuar a interessar numa outra perspetiva o grupo IAG». Quanto ao argumento de que estes grupos não têm hubs distantes de menos de 900km entre si, diz que não simplesmente não é válido. «Geralmente estes grupos funcionam ainda melhor quando os hubs estão próximos uns dos outros», e dá como exemplo a Lufthansa, em que todos os hubs na Europa, Bruxelas – Frankfurt, Munique, Zurique e Viena – estão todos eles a uma distância muito curta, abaixo dos mil quilómetros.