Água do Alqueva tem de assegurar a diversidade das culturas

Esta indesejável reorientação para monoculturas mais defensivas na utilização de água tem de ser combatida.

Por Pedro do Carmo, Deputado, Presidente da Comissão de Agricultura e Pescas

Mesmo os projetos estruturais e impulsionadores de novas dinâmicas nas atividades humanas e nos territórios têm necessidade de se ajustar para assegurar a sua razão de ser. O Alqueva é um projeto estrutural fundamental para a região e para o país, mas as circunstâncias da conjuntura impõem redobrada atenção e ação para que as opções de gestão não se desalinhem da missão e de atividades essenciais para a afirmação da capacidade produtiva do nosso Mundo Rural e da soberania agroalimentar do país.

O aumento significativo do preço da água do Alqueva, na ordem dos 120%, sobretudo por consequência dos custos da energia, coloca novos obstáculos à produção agroalimentar, que pode levar a uma reorientação estratégica para monoculturas mais competitivas, como o amendoal, a vinha ou o olival, em prejuízo dos cereais, dos prados e das hortícolas, por exemplo.

Esta indesejável reorientação para monoculturas mais defensivas na utilização de água tem de ser combatida. A chave é o equilíbrio e este consegue-se com a diversidade das culturas e o uso eficiente da água. A água do Alqueva tem de ser um fator de promoção da diversidade das culturas e da sustentabilidade, em linha com o interesse geral do país. É também esse o sentido do Alqueva como projeto de fins múltiplos, com uma gestão integrada da sua reserva estratégica de água. É preciso agir no combate à escalada do preço da água ao produtor em todas as dimensões.

• Tem de haver um reforço do aproveitamento fotovoltaico de painéis no espelho de água do Alqueva, sem bloqueios burocráticos de centros de decisão desfasados das realidades das pessoas e dos territórios.

• Deve haver um maior apoio ao uso eficiente da água e à investigação sobre soluções para assegurar uma boa gestão desse recurso vital para os seres vivos.

• Tem de se ponderar a possibilidade de renegociar o contrato de concessão com a EDP à luz dos enormes lucros resultantes do aproveitamento hidroelétrico da barragem, assegurando que parte da riqueza gerada é reinvestida na capacidade produtiva do Alentejo.

• Devem ser avaliadas todas as possibilidades técnicas de reutilização da água utilizada na produção de energia elétrica com água do Alqueva.

• Se necessário, para salvaguardar a diversidade de culturas, o preço da água pode ser diferenciado em função das culturas que devem estar alinhadas conjugando as opções dos produtores, o mercado e o reforço da soberania alimentar de Portugal. O caminho faz-se caminhando. O recente lançamento do concurso público da Empreitada de construção do Circuito Hidráulico de Ligação à Albufeira do Monte da Rocha e do Bloco de Rega da Messejana deve ser motivo de inspiração para continuar a agir positivamente perante as dificuldades e a construir soluções positivas, envolvendo todos os que contribuem para a produção nacional e a sustentabilidade das comunidades e dos territórios.

A diversidade das culturas é fundamental para a sustentabilidade e a soberania alimentar não pode ser delapidada pelo aumento dos mais um dos custos de produção, o preço da água do Alqueva.

No Alentejo, há muito que nos habituámos a enfrentar adversidades, mitigando os impactos negativos e gerando soluções alternativas, procurando erradicar as fatalidades. Era só o que faltava que um impulso positivo de transformação da região, de valorização do potencial produtivo e de sustentabilidade, que tanto trabalho deu a concretizar, se convertesse em mais um fator de adversidade. 

Só há um caminho, a água do Alqueva tem de assegurar a diversidade das culturas.