O diálogo entre os bispos sobre a pedofilia

‘Temos é de perdoar aos padres que caíram em tentação. Nem imagino o que eles devem estar a sofrer com esta pressão toda’ – diz o bispo C

Os bispos estão reunidos em Fátima em Assembleia Plenária da Conferência Episcopal Portuguesa para anunciar medidas em resposta ao relatório sobre a pedofilia. O ambiente é de grande tensão. Os próprio anjos que os seguem para todo o lado estão ansiosos.

Dom José Ornelas abre a sessão.

«Irmãos, a Igreja enfrenta um grave problema».

«Sim, gravíssimo» – diz o bispo L. – e todos os restantes bispos assentem com a cabeça.

«Este relatório sobre os abusos de crianças é a maior ameaça dos últimos tempos. Temos de tomar medidas drásticas para acabar com isto» – diz Dom José Ornelas.

«Proponho que os excomunguemos» – diz o bispo M.

«As crianças?» –  pergunta Dom José Ornelas

«Não, os tipos do relatório. O Sampaio e o Strecht para começar» –  diz o bispo M.

«Não adianta, eles são ateus. E além disso, aquele inferno das chamas descrito no segredo de Fátima não é bem assim. A excomunhão não os assusta» – diz o bispo F.

«Então vamos falar da questão das indemnizações…»  – diz Dom José Ornelas.

«Está a falar das indemnizações à Igreja, não é assim? Nós é que deveríamos ser indemnizados pelos danos morais que nos estão a causar»  – diz o bispo P.

«E se puséssemos o Sampaio e o Strecht em tribunal? Toda a gente sabe que metade do relatório é falso ou exagerado» – diz o bispo H.

«Sim, e processamos também os católicos que andam a assinar petições contra nós, esses judas sem vergonha» –  diz o bispo V.

«Como dizia Salazar, peixinhos vermelhos a nadar em água benta» – diz o bispo M.

«Eles bem mereciam, mas a opinião pública não iria gostar» –  diz o bispo R.

«E desde quando é que nós nos preocupamos com a opinião pública? A opinião pública é que se preocupa connosco»  – diz o bispo H.

«Isso era dantes. Agora um tweet vale mais do que uma hóstia» –  diz o bispo E.

«Isso quer dizer que temos de nos actualizar e acabar com o celibato?» –  pergunta o bispo B.

«Claro que não. O celibato é fundamental para não haver heranças e mantermos o nosso património. E para que é que querem que os padres se casem, se, afinal, eles sempre tiveram mulheres?» – pergunta o bispo T.

«Eu não recomendo as bonecas insufláveis»  – diz o bispo R.

«Essa associação entre o celibato e o abuso de crianças não faz sentido» –  diz o bispo D.

«E além disso é preciso não esquecer que existem abusadores em todo o lado» –  diz o bispo G.

«Além de assassinos e canibais»  – diz o bispo A.

«Nós também temos assassinos e canibais?»  – diz o bispo R.

«Ai no passado tivemos de certeza» – diz o bispo P.

«Bom, se conhecerem alguns digam-lhes para se conterem durante uns tempos porque já temos chatices que cheguem» – diz Dom José Ornelas.

«A questão é esta: os nossos abusadores são uma minoria e, pelo menos, ensinaram alguma coisa de religião e moral às suas vítimas» –  diz o bispo C.

«Sim, esses catraios podem ter tido uma experiência menos boa, mas ficaram a conhecer os evangelhos. E não é isso o mais importante? Feitas as contas, não foram assim tão lesados quanto isso» –  diz o bispo T.

«E quanto àquelas serigaitas que foram apalpadas nas sacristias, enfim, como se fosse a primeira vez que alguém lhes passava a mão»  – diz o bispo N.

«Algumas eram espevitadas, aquilo era só hormonas e namorados, viam pornografia na internet. Umas sabidonas. Até devem ter gostado» –  diz o bispo A.

«A maioria já se tinha esquecido dessas brincadeiras. O Strecht e o Sampaio é que os instigaram a acusar-nos» –  diz o bispo O.

«É gente sem compaixão» –  diz o bispo S.

«Que Deus lhes perdoe, que eu não consigo» –  diz o bispo R.

«Temos é de perdoar aos padres que caíram em tentação. Nem imagino o que eles devem estar a sofrer com esta pressão toda» –  diz o bispo C.

«Eu já perdoei a dois e depois mandei-os para outra paróquia» – diz o bispo D.

«Que exagero. Bastava rezarem um terço e duas ave-marias»  – diz o bispo F.

De repente, o bispo L levanta-se e abre os braços.

«Olhem, estamos no tempo da lampreia e eu já estou farto disto».

«Eu também»  – dizem vários bispos.

«Conheço um restaurante ali prós lados de Coimbra que faz uma bordalesa divina»  – diz o bispo N.

«Eu levo as garrafas de vinho» –  diz o bispo T.

«Vamos lá embora, só espero que não haja rapazinhos a servir à mesa» – diz o bispo C.