Marcelo fartou-se das fontes de Belém

Reconheçamos que em Portugal só há duas personalidades que mal abrem a boca deixam o tal meio país à deriva: Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho. 

A política, vista de fora, está mais divertida. Acabou a pasmaceira da covid, onde só a Iniciativa Liberal se mostrou contra os confinamentos e afins, e agora estamos numa fase em que vale tudo e estão todos contra todos. Para quem está no jogo como espetador, reconheçamos que tem razões para sorrir.

Olhemos para Cavaco Silva, o homem fala e metade do país – aquele que não votou nas suas maiorias absolutas, seja no Governo ou na Presidência da República – fica a caminho do psiquiatra. A reação epidérmica dos adversários de Cavaco deve deixar o antigo Presidente da República com aquela expressão facial celebrizada quando foi apanhado a comer bolo-rei. Isto é, deve achar que alguma coisa caiu mal, mas não sabe bem o quê. Já António Costa, um verdadeiro artista da política, não foi meigo no contra-ataque a Cavaco, depois deste ter dito do programa Mais Habitação o que Marcelo não diz do almirante Gouveia e Melo. «O sábio dos sábios» com as suas cavaquices não diz nada de novo, sentenciou o atual primeiro-ministro.

Reconheçamos que em Portugal só há duas personalidades que mal abrem a boca deixam o tal meio país à deriva: Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho. Têm um dom especial de irritar a rapaziada, e se o primeiro recebe os epítetos de velho e de ‘múmia’, já o segundo é apelidado de D. Sebastião que ninguém quer voltar a ver na política. Só que, mais uma vez, esse ninguém diz respeito a meio país…

Também é verdade que há uma terceira personalidade que se está a intrometer entre Cavaco e Passos, no que diz respeito à animosidade criada sempre que aparece ou fala. Gouveia e Melo, o almirante sem medo, e com sonhos de entrar por Belém adentro a bordo de uma navio presidencial, provoca urticária em muito boa gente. Populista, demagogo, entre outros mimos, é assim que o classificam aqueles que ficam doentes ao imaginar que o homem das vacinas pode chegar a Presidente da República. Quanto mais o atacam, mais o almirante sobe na onda da popularidade. A ingenuidade daqueles que não o suportam não deixa de ser divertida. Mas, calma. O homem ainda vai estar três anos nos submarinos e nas fragatas e pode ser que se esqueçam dele… 

Já Marcelo Rebelo de Sousa, o mais divertido da política portuguesa, que é capaz de se fintar a si próprio, tem dado sinais, nas últimas semanas, de que se cansou das fontes de Belém. Essa coisa de fazerem notícias a citar fontes de Belém já teve dias melhores, porque o próprio decidiu, entretanto, dar a cara e não se refugiar nos heterónimos de Belém.

Vai daí, aparece na televisão a dar uma entrevista onde diz do Governo o que as fontes de Belém não dizem do almirante, e sempre que agora aparece em público deixou os heterónimos na gaveta. Marcelo agora é Marcelo, não há espaço para lelés da cuca. Fartou-se de ver a desgovernança do Governo e optou por marcar terreno. Se o PRR não for cumprido, Marcelo aparecerá a dizer que bem o avisou e não foram as fontes de Belém que o previram. Se o Mais Habitação avançar, o Presidente já sentenciou que leva com um veto em cima. Reconheçamos que é um jogo perigoso, pois as fontes de Belém sempre o resguardavam. 

Perante tudo isto, não se pode dizer que não há animação na vida política portuguesa. Eu que o diga, pois queria ter escrito sobre os novos nazis e comunistas que comandam as bibliotecas inglesas e que decidiram esconder os livros de Enid Blyton, não vão os meninos ficarem com ideias erradas. Eu, que li Os Cinco todos, apesar de não me lembrar de nenhum deles, acho isto o fim da liberdade, num país que tanto lutou por ela. Estes fascistas do pensamento sonham, sem qualquer dúvida, com uma noite das facas longas.
vitor.rainho@nascerdosol.pt