Homens de palavra!

Nem no Estado Novo se construiu tão pouco, porque como muito bem refere MBP, na pior década (1930/40) a construção social foi de 206 casas por ano. 

1. A palavra é um dom precioso e a sua utilização deve ser parcimoniosa e incisiva. Observamos um bom exemplo deste princípio quando ouvimos Cavaco Silva pronunciar-se sobre qualquer que seja o assunto. As suas frases são ouvidas, a sua opinião é respeitada, dado o seu passado na política, sobretudo pela sua Obra que ainda hoje perdura em tantos aspetos.

Desta vez, falou sobre a habitação e o PS tremeu, não demorando a responder, quer pela voz de João Torres, atual secretário-geral adjunto e antigo líder da Juventude Socialista, quer pela atual ministra da Habitação, Marina Gonçalves, ambos demonstrando enorme imaturidade e inexperiência de vida. Respostas contundentes, frases feitas nos laboratórios de comunicação, afinal dando eco à intervenção de Cavaco Silva em que este arrasou a política governamental. Noutro patamar, a ministra Vieira da Silva, de quem se desconhece obra feita e atualmente a supervisionar a execução do PRR que regista atrasos significativos, veio referir, com a leveza própria da juventude, que ‘as críticas ficam com quem as faz’. De certeza que Cavaco Silva indulgentemente sorriu.

Passemos por cima dos detalhes ideológicos tanto criticados por Cavaco Silva e, já agora, da constatação por tantos efetuada (até por Marcelo que se relembrou dos seus tempos de faculdade em que existiam as chamadas ‘Lei-cartaz’ elaboradas ‘para inglês ver’) de que o Governo não tem meios para executar as políticas que a partir de agora pretende colocar em prática. Passemos apenas a citar estes factos:

(i) Cavaco Silva foi responsável por um PER há 30 anos, agora recordado, que retirou milhares de barracas dos grandes centros urbanos; hoje, infelizmente e demonstrado em reportagens televisivas, as barracas estão a regressar em força, sobretudo nas periferias; 

(ii) no passado dia 2 de março, em artigo no Observador, Margarida Bentes Penedo (MBP) limitou-se a compilar números sobre a realidade da construção em Lisboa e ficámos a saber que «entre 1974 e 1980, o Estado construiu 1.055 casas por ano; na década de 80, a média foi de 982 casas por ano; na década de 90, construiu 1.151 casas por ano. No século XXI, desde 2000 a 2010, a média foi de 991 casas por ano e, entre 2011 e 2020, o Estado construiu 17 casas por ano».

Nem no Estado Novo se construiu tão pouco, porque como muito bem refere MBP, na pior década (1930/40) a construção social foi de 206 casas por ano. Impressionante como a troika Costa, Medina e Gonçalves, todos com enormes responsabilidades num legado que os deveria envergonhar, tamanha a incapacidade demonstrada de erigir uma política social elementar, vem de repente debitar novas regras, todas de âmbito revolucionário, seguindo pela via facilitista de sobrepor o direito à habitação ao direito de propriedade, demonstrando que o atual Partido Socialista nem precisa do Bloco para governar porque tem no seu interior uma nova ‘geringonça’, mais forte e mais sólida que a original.

2. Todos sabemos que os militares são pessoas formatadas a executar muito e falar pouco. Devemos às forças armadas a nossa democracia e ficamos estupefactos com tantos sinais de falta de respeito, sobretudo como tantos atualmente se lhes dirigem e comentam de forma depreciativa as suas ações, curiosamente provindo de apoiantes de partidos que louvam regimes ditatoriais.

Gouveia e Melo é um exemplo típico de um militar, como foi Ramalho Eanes e tantos outros. Confrontado com uma insubordinação militar que extravasou as portas da Armada de forma nada inocente, teve de vir à liça explicar os princípios doutrinários dos militares. As avarias no navio Mondego aduzidas como razões pelos 13 marinheiros têm de ser obviamente verificadas e nem duvido da pertinência das suas críticas, ditadas por razões financeiras que tanto caracterizam os nossos governos que soltam a conta-gotas os euros necessários à manutenção das forças armadas.

Mas não sejamos inocentes, porque estou convencido que haverá muita política por detrás deste movimento, com objetivos claros de fragilizar o Almirante, putativo candidato à Presidência, já para não falar na coincidência de se tratar de acompanhar um navio russo a atravessar as nossas águas. Os 13 marinheiros terão sido instigados à recusa de embarcar e acreditaram que nada de mal lhes iria acontecer, certamente mal aconselhados e inebriados pelas suas razões.

Infelizmente, pelas experiências pessoais que irão viver, vão compreender que estar na tropa é algo diferente de estar na vida civil e provavelmente hoje já estarão arrependidos dos seus atos. Quando um Comandante garante que não há risco e, se houver, jamais colocaria em risco a vida dos seus subordinados, ou há confiança ou não há tropa. Foi na Marinha, mas fosse no Exército ou na Aviação, era igual. Uma coisa tenho a certeza, se alguém pretendeu enfraquecer o Almirante Gouveia e Melo, o tiro saiu pela culatra e saiu reforçada a sua imagem junto da opinião pública. 

3. Tenho raízes alentejanas e só não vou lá mais vezes porque nem sempre a minha vida se proporciona, mas são muitas décadas a encontrar a minha paz, entre a família que ali continua. Quantas conversas ouvi dos meus avós e dos meus tios sobre as dificuldades dos alentejanos, tantas famílias a viver de uma agricultura incerta e de uma pecuária que umas vezes dá e outras tantas sofre de doenças que tudo atira abaixo.

Entre essas conversas, ouvi muitas vezes falar de Rui Nabeiro e, raramente na minha vida, ouvi tanta unanimidade, nos seus méritos empresariais, na sua responsabilidade social. A minha família cruzou-se com a dele em mais que uma geração, pelo que ouvi estórias contadas na primeira pessoa, onde o respeito e admiração predominavam.

Acidentalmente, também me cruzei com ele e percebi como a personalidade era ímpar, um exemplo de capitalismo social. Deixa um legado nos ombros da família, no seu neto Rui Miguel que já conheci num fórum privado onde explanou uma visão de futuro, entre raciocínios claros e modernos. Assim o consiga, também para que seu avô descanse em paz e sinta orgulho não só da obra que deixa, mas também da sua família que a soube continuar.