Tom Waits. A origem de uma lenda

O álbum de estreia de Tom Waits, ‘Closing Time’, celebra 50 anos. É considerado um dos melhores álbuns de todos os tempos.

Seja pela sua inconfundível voz grave e rouca, pela sua escrita irreverente ou até em cima de palco ou na tela grande do cinema, a presença de Tom Waits é impossível passar despercebida.

Considerado uma das personalidades mais icónicas e carismáticas da cultura popular moderna, a lenda deste artista começou há 50 anos. Mais precisamente a 6 de março de 1973, quando lançou o seu disco de estreia, Closing Time.

Com uma grande inspiração em Bob Dylan, mas ainda sem a técnica vocal e a personalidade que se tornaria numa das suas imagens de marca, o artista assinou o início da sua discografia com um álbum que se tornaria um objeto de culto, com músicas que viriam a ser adaptadas por artistas como Tim Buckley, Bette Milder, Meat Loaf, Screamin’ Jay Hawkins ou Jon Bon Jovi.

Depois de uma juventude em que, nas suas palavras, adquiriu a reputação de ser «um delinquente juvenil amador», interessado em «travessuras maliciosas» e infringir a lei, Waits abandonaria o ensino secundário, aos 18 anos. Uma decisão inspirada pelos seus heróis, escritores da geração Beat, como Jack Kerouac, Allen Ginsberg e William S. Burroughs.

Após abandonar os estudos, trabalharia numa pizzaria e num restaurante local – cujos clientes terão servido como inspiração para algumas das suas músicas -, mas também como bombeiro no serviço florestal e na guarda costeira.

No entanto, em 1969, enveredaria na Southwestern Community College, na Califórnia, para estudar fotografia, chegando a pensar que seria nesta área que faria o seu futuro, mas uma velha paixão intrometeu-se pelo caminho: a música.

Apesar de já ter tido uma banda na escola, os The Systems, descrita como uma «banda de rapazes brancos a tentar alcançar o som de Motown», o seu primeiro contacto mais profissional com a música aconteceu no Heritage (um café de dia e clube de noite), onde, para além de trabalhar como porteiro, também atuava, apresentando versões de músicas de artistas como Bob Dylan.

Mas foi no ano seguinte que a sua carreira musical encontrou uma maior estabilidade, passando a atuar todas as segundas-feiras no The Troubadour, com um set que, para além das habituais covers de Dylan, já continha canções originais, e que viriam a entrar no alinhamento de Closing Time, como Ice Cream Man, Virginia Avenue, Ol’ ‘55, I Hope That I Don’t Fall in Love with You.

Foi neste espaço que a sua carreira foi lançada, tendo sido descoberto por David Geffen, que contratou Waits para fazer parte da sua editora, Asylum Records, após ter ficado arrebatado pela performance da música Grapefruit Moon.

Assim que assinou o contrato, Waits começou a trabalhar em Closing Time, com a ajuda de Jerry Yester, antigo membro da banda de rock Lovin ‘Spoonful.

O par tinha uma visão diferente do que deveria ser o disco: Yester, que serviu como produtor de Closing Time, pretendia que este fosse um álbum de folk, mas Waits pretendia adicionar um toque de jazz, com instrumentos como o contrabaixo a tingir o som das músicas.

Apesar de algum desapontamento inicial de Waits, que conduziu a novas sessões para adicionar novos elementos ao disco, e de um atraso de um ano para o lançamento de Closing Time, em 1973, este foi muito bem recebido por parte da crítica devido à grande variedade de estilos musicais.

«Closing Time estabelece o pano de fundo para a primeira de uma variedade díspar de identidades que Waits viria a assumir ao longo de sua carreira, começando com a do pianista de jazz desamparado e encharcado em álcool, perdido no tempo e tocando noite após noite em um bar quase vazio», pode ler-se no blog Culture Sonar.

«Esteticamente, o disco é, essencialmente, música lounge envolta numa nuvem de fumo de charuto e embebida em uísque barato», refere o artigo escrito por Cameron Gunnoe, acrescentando que este disco ainda não tem o tom de voz característico e que marcou a carreira do cantor.

«Alguns dizem que o compositor bebeu e fumou até ao esquecimento, outros acreditam que é simplesmente uma inflexão escolhida para transmitir uma mensagem artística. De qualquer forma, durante Closing Time, havia poucos vestígios da vocalização áspera que estava por vir. Na verdade, até ao seu terceiro álbum, Nighthawks at the Diner, quando o som de Waits começou a indicar o que estava por vir», explicou o jornalista.

O álbum conta com algumas das mais belas canções da discografia do artista, nomeadamente, Martha, considerada por Tom Taylor, da Far Out Magazine, como uma das «mais belas canções alguma vez escritas» e «que oferece coesão à obra-prima que é Closing Time, um dos maiores álbuns de todos os tempos».

«É um hino que mergulha na verdade agridoce de que a vida segue em frente», escreve. «A manter este sentimento está a impressionante performance vocal de Waits, muitas vezes classificada, simplesmente, como rudemente única, esquecendo-se da sua qualidade surpreendente dentro dos seus limites imperfeitos», conclui.

Desde que foi lançado, Closing Time tornou-se um dos mais acarinhados discos do cantor, sendo, por exemplo, reinterpretado num álbum tributo, que contou com artistas como o vocalista dos Wilco, Jeff Tweedy, e Andrew Bird, e é também considerado um dos melhores álbuns de todos os tempos, sendo incluído em diversas publicações de melhores discos de sempre.

Para assinalar o 50º aniversário do álbum de estreia de Tom Waits, este irá ser relançado pela editora Anti-Records, no dia 2 de junho.

Estas celebrações acontecem depois de, no ano passado, os seus discos Alice e Blood Money, que celebraram ambos 20 anos, terem sido também relançados em vinil.