Forças desarmadas

A soberania também se mede pela capacidade dos países fiscalizarem, explorarem e fruírem os seus territórios.

Por Nuno Melo

Abandonadas pelo Governo, sem investimento capaz e com militares profundamente desmotivados, as Forças Armadas Portuguesas não conseguem assegurar atualmente muitas das missões internas e dos compromissos internacionais do país. O facto é absolutamente chocante.

O compromisso alcançado entre os países que da NATO, para um investimento na Defesa de pelo menos 2% do PIB, foi muito claro e deveria ser levado a sério. Sucede que entre 30 países, Portugal é o 9.º que menos investe, tendo atribuído à Defesa em 2022 um valor de apenas 1,38% do PIB, depois de 0,8% do PIB em 2021.

Exatamente por isso, não é de estranhar que a embaixadora dos Estados Unidos para a NATO tenha pedido a Portugal para fazer muito mais, reforçada pelo Secretário Geral da mesma organização Jens Stoltenberg, que defende que existe “um novo sentido de urgência” face à “nova realidade de segurança”, designadamente à luz da invasão da Ucrânia pela Rússia.

 

Seja como for, independentemente das alterações geopolíticas à escala global, não é aceitável, desde logo, que um País com 1.727,408 km2 de Zona Económica Exclusiva – a terceira maior da União Europeia e a vigésima maior do mundo -, não assegure às Forças Armadas meios essenciais ao desempenho das suas funções. A soberania também se mede pela capacidade dos países fiscalizarem, explorarem e fruírem os seus territórios. Apesar disso, o Governo mantém a Marinha e a Força Aérea – que a par da Autoridade Marítima Nacional, Polícia Marítima e da Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos têm de vigiar e patrulhar um imenso Mar – quase na penúria.

O incidente registado no NRP Mondego, que tanta polémica gerou, pela evidência pública de atos de insubordinação, foi apenas um exemplo, do estado lamentável com que as Forças Armadas são obrigadas a operar todos os dias. Que alguns marinheiros se tenham recusado a cumprir ordens da hierarquia, é grave. Mas que duas semanas depois o navio tenha ficado parado no mar devido a falha de energia, com um motor a fumegar e um gerador incapacitado, é revelador. O primeiro-ministro e o ministro da Defesa são os primeiros responsáveis pelo que sucedeu, manchando o brio e a honra de tantos militares briosos.

 

Noutro exemplo, dos 37 tanques Leopard A6, comprados aos Países Baixos em 2008, a maior parte não funciona. De efetivos, a equipamento decente, passando pela manutenção, armas e munições, nos diversos ramos das Forças Armadas, falta quase tudo. Compreensivelmente, a desalento é total.

Acresce outra circunstância. Depois de 7 anos sem investimentos relevantes, recuperar o tempo perdido, compensando tantos problemas que se foram acumulando, resultará mais difícil. Acontece que enquanto os países europeus da NATO concordam que é necessário aumentar esforços na atual conjuntura, a Comissão Europeia propôs a reabertura dos procedimentos por défice excessivo na primavera de 2024. Significa que o governo poderá ter desperdiçado uma ocasião de ouro para decidir o que, provavelmente, já não conseguirá no futuro próximo.

 

Se as Forças Armadas são fundamentais e até identitárias para Portugal, o estado em que se encontram, por culpa de quem governa, é motivo de justa indignação.