“Taxa-se como país rico, mas produzimos como país pobre”

Portugal sobe para a nona posição no ranking das cargas fiscais sobre o trabalho mais altas da OCDE. Especialistas alertam para os riscos desta tendência.

Os números não são positivos: Portugal é um dos países com a carga fiscal mais elevada do conjunto dos 38 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Esta é uma das principais conclusões do relatório anual Taxing Wages – que coloca Portugal em 9.º lugar, à frente de países como Espanha, Luxemburgo, Grécia, Países Baixos e Irlanda.

Questionado sobre os riscos desta conclusão, Paulo Rosa, economista do Banco Carregosa, explica que «o fator capital é muito mais flexível que o fator trabalho, este bem mais rígido, mas esta tendência tem diminuído nas últimas décadas, impulsionada pela visível melhoria dos meios de comunicação e transporte», acrescentando que a pandemia «diminuiu ainda mais a rigidez do fator trabalho, permitindo a aceleração do teletrabalho e uma gradual flexibilidade do fator trabalho, que procurará no futuro geografias capazes de oferecerem uma otimização fiscal».

Além disso, destaca o economista, «há uma correlação positiva entre a carga fiscal e o nefasto efeito crowding out na economia. Ou seja, à medida que a carga fiscal sobe, aumenta também o indesejável efeito crowding out (diminuição dos recursos financeiros disponíveis para o setor privado, sendo cada vez mais absorvidos pelo crescimento do Estado)».

Já Henrique Tomé e Vítor Madeira, analistas da XTB, defendem que uma carga fiscal maior «cria um desincentivo ao trabalho, ao investimento e ao desenvolvimento». Portanto, acrescentam, «aumenta o risco de existir uma maior a fuga de capitais dentro do país, sobretudo nas classes sociais mais altas, e em simultâneo, um aumento da economia paralela».

Assim, dizem os analistas da XTB, o excesso de carga fiscal «afasta o investimento privado, tanto nacional como estrangeiro». A juntar a tudo isto, «a atual carga fiscal também penaliza o crescimento do próprio país. Há menos investimento privado e os trabalhadores qualificados que trabalham por conta de outrem muitas vezes preferem emigrar para procurar condições melhores de trabalho», explicam. E atiram: «Em Portugal taxa-se como um país rico, mas esquecemo-nos que produzimos como um país pobre».

Questionados sobre como controlar esta situação, dizem que este tema é «urgente» e que «tem de ser tratado». Assim, «a única forma de o resolver é aplicando uma reforma fiscal no país».

Segundo a OCDE, os dados relativos a Portugal comparam com uma carga fiscal inalterada na média da organização no caso dos trabalhadores solteiros (34,6%), e subidas entre agregados com dois titulares de rendimentos e famílias monoparentais. Quais as consequências destes agravamentos? «As consequências serão que se o estado não conseguir fazer bom uso desses rendimentos das famílias, levará a que as mesmas sejam mais pobres, menos motivadas com a produção e em alguns casos pode até mesmo incentivar a que emigrem», dizem Henrique Tomé e Vítor Madeira.

Dívida Pública atinge 90,3% do PIB

Ainda esta semana, o Conselho das Finanças Públicas (CFP) estimou que a dívida pública deverá atingir 90,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2027, uma projeção mais favorável do que a apresentada pelo Governo no Programa de Estabilidade. Sobre este assunto, o economista Paulo Rosa diz que «uma descida do rácio da dívida pública para cerca de 90% do PIB em 2027 é exequível, tendo em conta uma inflação elevada por mais algum tempo e mantendo-se a atual tendência de aumento da carga fiscal».

Já os analistas da XTB apontam que «fica difícil saber» qual das previsões estará mais perto da realidade, «mas olhando para essas projeções conseguimos perceber que períodos de grande inflação são vantajosos para países com montantes de dívida elevados, como é nosso caso».