MotoGP. As corridas estão a ficar perigosas

Pela segunda vez este ano, Miguel Oliveira foi parar ao hospital em consequência de uma queda provocada por outro piloto. Fraturou o úmero e pode falhar a próxima corrida em Le Mans.

MotoGP. As corridas estão a ficar perigosas

por João Sena

Os pilotos sabem e aceitam que os desportos motorizados têm riscos, o que não se compreende é que sejam os próprios a aumentar esse risco com manobras kamikazes. O Mundial de MotoGP ainda está no início – em Jerez de La Frontera realizou-se a oitava de 42 provas – e já há muito para dizer sobre o comportamento de alguns pilotos.

O início das corridas tem sido marcado por constantes toques e manobras agressivas, quais gladiadores em circo romano, que acabam, invariavelmente, com quedas mais ou menos graves. Em Portimão, Miguel Oliveira (Aprilia) foi abalroado pela manobra suicida de Marc Márquez e teve de ser assistido no hospital do circuito devido às lesões provocadas pela queda. Agora, em Jerez, foi Fabio Quartararo (Yamaha) a forçar a passagem no meio do pelotão e a provocar a queda de Marco Bezzechi (Ducati) e do piloto português que embateu com extrema violência na ‘airfence’, o que causou o “deslocamento do ombro esquerdo, que foi recolocado no lugar”, disse o médico Franco Peroni à Sport TV. O acidente só não teve consequências mais graves para o piloto porque essas proteções insufláveis amorteceram e absorveram o impacto contra a barreira.

Miguel Oliveira esteve várias horas em observação no centro médio e a receber oxigénio e analgésicos para o manter confortável. O piloto foi depois transportado para um hospital em Jerez para realizar exames mais completos de forma a despistar qualquer tipo de lesão. Um dia depois do acidente, vieram as más notícias. “Os exames complementares realizados num hospital em Jerez de La Frontera revelaram que as lesões foram maiores do que o esperado e o piloto fraturou o úmero do ombro esquerdo na sequência da queda Grande Prémio de Espanha”, podia ler-se na conta do Twitter da RNF Aprilia. A equipa adiantou ainda que Miguel Oliveira vai ser submetido “a mais exames esta semana e a sua presença na próxima prova, a 14 de maio, em França, está comprometida”. O piloto foi declarado “não apto” pela equipa médica, mas poderá submeter-se a nova prova na quinta-feira antes da corrida francesa.

 

Alvo fácil

Miguel Oliveira já reagiu ao acidente nas redes sociais para reconhecer para este início de ano está longe daquilo que idealizou e, com alguma ironia, disse: “Hoje [ontem] a sorte bateu à porta outra vez e como resultado desloquei o ombro. Efetuarei mais exames para entender a extensão da lesão. Fé e paciência na recuperação e olhar em frente”.

O piloto português tem sido o alvo preferidos dos adversários. Tendo em conta dados estatísticos do MotoGP, Miguel Oliveira sofreu 12 quedas desde 2019, primeiro ano na categoria rainha do motociclismo, sete delas provocadas por toques de adversários. Desta vez, Quartararo foi acusado de condução irresponsável e sancionado com uma volta longa em Jerez de La Frontera, o que não é nada quando comparado com as imagens de ver um piloto a ser assistido pela equipa médica e a ser retirado da pista em maca.

Razlan Razali, responsável da equipa RNF onde corre Miguel Oliveira, foi claro ao afirmar que “foi novamente ‘arrumado’ por outro piloto. Estamos felizes que o Miguel não esteja tão mal quanto parecia no momento do acidente. Desejamos-lhe uma rápida e completa recuperação nos próximos dez dias antes de Le Mans”.

Já antes, Paolo Campinoti, responsável da Pramac, afirmara ao Canal+ que “o MotoGP não é um rodeo e que há limites que devem ser respeitados”, e Massimo Rivola, diretor da Aprilia, referiu sobre o acidente de Portimão que “ao não serem severamente penalizados isso é um péssimo exemplo para os mais jovens”. O antigo piloto Dani Pedrosa participou na corrida com um ‘wild car’ da KTM e falou com conhecimento de causa: “São corridas muito mais agressivas do que aquilo que me lembrava. Quanto mais se arrisca, pior. Em todas as corridas há bandeiras vermelhas, quedas e lesões, isto deve servir para abrir um debate”. A imprensa internacional também deu conta de “excessos” cometidos por alguns pilotos esta temporada.

Alguns continuam a pisar linhas vermelhas sem que a Federação Internacional de Motociclismo (FIM) tome uma posição dura para evitar que aconteça um acidente mais grave. Quartararo defendeu-se afirmando: “Não vi nada de estranho. Foi uma questão de tentar fazer a curva. Toquei nas motos do Bezzecchi e do Miguel porque não tinha espaço. Não havia razão para ser penalizado, porque estava a tentar fazer o meu melhor. O nosso ritmo era bom”, afirmou o francês. Dito isto, somos levados a concluir que, desde que o ritmo seja bom, vale tudo para tentar ganhar um lugar nos primeiros metros de corrida quando o pelotão segue compacto. Se é este o mind set dos atuais pilotos de MotoGP, então a época vai ser escaldante dentro e fora das pistas. Será preciso acontecer uma tragédia para a federação castigar os pilotos com penas pesadas para que deixem de ser gladiadores do século XXI?

É que, além deste acidente, a primeira volta fervilhou com a luta e os toques entre vários pilotos. Já no dia anterior, a prova sprint tinha ficado marcada por toques, penalizações e uma interrupção após o violento acidente na primeira volta. Na próxima corrida em Le Mans está marcada uma reunião entre os pilotos e a Comissão de Segurança da FIM, pode ser que sirva para alguns acalmarem e perceberem que não se ganham corridas na primeira volta.

 

Prova de campeão

A corrida foi interrompida devido a esse acidente e no recomeço foram os pilotos da KTM que saltaram para a frente. Depois de duas quedas nas corridas da Argentina e dos Estados Unidos, Francesco Bagnaia (Ducati) teve uma performance de campeão, conseguiu evitar o caos que foi a corrida, com inúmeras quedas, fez grande pressão sobre Brad Binder e a quatro voltas do fim ultrapassou o piloto da KTM e venceu o Grande Prémio da Espanha com 0,2 s de vantagem. Foi mais uma grande demonstração do campeão do mundo Bagnaia que a meio da prova forçou uma ultrapassagem e foi obrigado pela direção de corrida a ceder a posição ganha, mas de imediato recuperou esse lugar e venceu. Bagnaia aproveitou a desistência de Bezzechi para assumir a liderança do campeonato, com 22 pontos de vantagem sobre o compatriota.

Na corrida sprint realizado no sábado, Brad Binder (KTM) venceu e Miguel Oliveira terminou na quinta posição.