Os dois polos!

Putin está a arrastar a Rússia para uma posição cada vez mais irrelevante economicamente como ator mundial e a colocá-la numa posição subalterna em relação à China, restando-lhe o poder nuclear.

Carlos Bonifácio, Mestre em Estratégia
e
João Barreiras Duarte, Consultor e Gestor de Empresas

Há alguns meses numa conferência empresarial em Moscovo, Putin produziu um longo e delirante discurso, em completo estado de negação, afirmando que a operação especial na Ucrânia foi concebida para alterar a ordem mundial que a intervenção não é contra a Ucrânia, (por a considerar como um território e um mesmo povo da ‘grande Rússia’) mas contra o ocidente onde reside a fonte de todos os males. Justificou também a intervenção na Ucrânia como respaldo na defesa dos países mais vulneráveis a que a Rússia quer dar voz contra um ocidente explorador. Putin conclui assim nessa conferência que depois desta intervenção emergirão dois polos fortes no futuro, ignorando ou desconhecendo que nesses dois polos não está a Rússia mas a China e os EUA.

Em consequência desta invasão a Rússia está mais débil. Apesar de ser o maior país do mundo em dimensão ocupava antes da invasão da Ucrânia o 11.º lugar no ranking mundial dos países com as economias mais desenvolvidas em Produto Interno Bruto, resta saber como vai ficar no fim desta agressão.

Com o novo status quo’que estava em construção mesmo antes da invasão, já se tinha constatado que a Rússia não tinha peso suficiente para representar esse papel como ator global. A Rússia é um país que assenta a sua economia essencialmente nos seus recursos energéticos e não tem uma indústria tecnológica relevante na economia mundial.

A China há muito que vem ocupando este novo estatuto a par com a maior economia do mundo que são os EUA. A China continua a ser o país que mais cresce no mundo exercendo nas duas últimas décadas uma forte influência económica, social e política. Preocupante para a segurança mundial é o modo agressivo como a sua política de um só país com dois sistemas aplica a sua doutrina internamente em todas as regiões sem dar espaço a outras correntes de opinião ou recurso a manifestações e greves.

A China procura um maior protagonismo na cena internacional nomeadamente nas principais organizações mundiais onde se destaca a ONU. Outro dos seus objetivos é o reforço do seu papel militar e a aposta na prontidão das suas forças armadas em paralelo com o domínio da tecnologia espacial.

De acordo com vários observatórios internacionais é possível que em 2028 a China passe os EUA como a economia mais pujante no mundo. O mesmo pode suceder com a Índia em relação ao Japão que poderá em 2030 alcançar a terceira posição. Confirma-se assim que Putin está profundamente errado e que a sua agressão à Ucrânia para além de criar dificuldades reais ao Ocidente, está a arrastar a Rússia para uma posição cada vez mais irrelevante economicamente como ator mundial e a colocá-la numa posição subalterna em relação à China, restando-lhe o poder nuclear – do qual se encarrega sistematicamente de relembrar ao mundo.