A Jornada Mundial da Juventude e a Encíclica do Papa Francisco

Em poucas palavras, com autoridade e sabedoria, o Papa desmantelou um edifício de perceções sociais e deixou mensagens graves às lideranças políticas. Palavras que ainda hoje ecoam em Cascais. Francisco não olha para os jovens como flores de estufa. Pelo contrário. Constata que têm poder. E apela a que tenham vontade e oportunidade para exercer…

por Carlos Carreiras 

Já faltam menos de 100 dias para a Jornada Mundial da Juventude e esta semana passaram oito anos da encíclica ‘Laudato Si’ – a primeira do Papa Francisco –, que nos convoca para a defesa do bem comum e o cuidar da casa comum. Esta convocatória questiona-nos sobre «que tipo de mundo queremos deixar a quem vai suceder-nos, às crianças que estão a crescer» e prossegue referindo que «esta pergunta não toca apenas o meio ambiente de maneira isolada, porque não se pode pôr a questão de forma fragmentária». Leva a interrogar-se e a interrogar-nos sobre o sentido da existência dos valores que estão na base da vida social. «Para que viemos a esta vida? Para que trabalhamos e lutamos? Que necessidade tem de nós esta terra; se não pulsa nelas esta pergunta de fundo?». Não basta que fiquemos apenas pelas nossas preocupações ecológicas, temos de reforçar a ecologia humana de outra encíclica do Papa Santo João Paulo II, para a defesa da ecologia integral do Santo Papa Francisco.  

Francisco afirma sem deixar dúvidas com eixos temáticos, analisados por uma variedade de perspetivas diferentes que lhe conferem uma fortíssima unidade: «A relação íntima entre os pobres e a fragilidade do planeta, a convicção de que tudo está estritamente interligado no mundo, a crítica do novo paradigma e das formas de poder que derivam da tecnologia, o convite a procurar outras maneiras de entender a economia e o progresso, o valor próprio de cada criatura, o sentido humano da ecologia, a necessidade de debates sinceros e honestos, a grave responsabilidade da política internacional e local, a cultura do descarte e a proposta dum novo estilo de vida».   

Se esta convocatória nos é dirigida a todos, aos jovens assume um apelo efetivo e demonstra-lhes no seu papado que têm um poder inimaginável, são criativos. O que se passa é que, na maioria das vezes, não têm líderes que os guiem, nem educadores que os formem. Os jovens não são o futuro, temos de corrigir essa ideia. Os jovens são o agora, são o hoje, são o presente. Se esperarmos que chegue a hora dos jovens, passa a hora e os próprios terminam domesticados, não deixando de ser meras réplicas. 

Em poucas palavras, com autoridade e sabedoria, o Papa desmantelou um edifício de perceções sociais e deixou mensagens graves às lideranças políticas. Palavras que ainda hoje ecoam em Cascais. Francisco não olha para os jovens como flores de estufa. Pelo contrário. Constata que têm poder. E apela a que tenham vontade e oportunidade para exercer esse poder transformador, tolerante e criativo. 

Para isso os jovens precisam de líderes. Líderes que escasseiam hoje em dia. Os políticos de hoje perderam a capacidade de dar um horizonte e sentido de propósito não só aos jovens como também à comunidade em geral. São gestores de conjuntura, distribuidores de benesses, gente sem força nem vontade, nem coragem de romper com os modelos instituídos de reprodução de desigualdade. Gente com medo da renovação, com medo de uma mudança que sabem não ser capazes de controlar. É por isso que o statu quo há de sempre olhar para os jovens como o futuro, nunca o presente. 

Quando o futuro for presente, diz-nos o Papa, os jovens deixarão de ser jovens. Serão o espelho domesticado da geração que os antecedeu. E aí, nessa altura, o seu poder transformador estará perdido para sempre. 

É preciso que os jovens dialoguem entre si, naquele que é um dos objetivos da sua fundação intercultural, inter-religiosa e interescolas. Mas é preciso mais: é preciso que dialoguem com os mais velhos. Os que vão pelo seu caminho sem dialogar com os mais velhos perdem as raízes, perdem o sentido da História, perdem o sentido de pertença. O dedo está apontado para a crescente atomização geracional, muitas vezes revestida da mais cruel desumanidade. 

Em Cascais percebemos muito bem o apelo de Francisco. E, com energia e força renovadas pelas suas palavras, trabalharemos para instituir um diálogo ‘mais fecundo’ entre jovens e jovens há mais tempo. 

Investiremos o nosso vigor político na preservação de uma sociedade em que a juventude e a senioridade, a irreverência e a sabedoria andem de mãos dadas na construção do futuro e no respeito pelo passado. 

Por estas razões, a Câmara Municipal de Cascais fomenta uma cultura de participação, facilita o acesso à informação específica e promove nos jovens competências que contribuem para o seu desenvolvimento pessoal e social num processo de autoconstrução capacitando para uma intervenção ativa nas esferas pública e privada, potenciando os jovens enquanto geradores de mudança e desenvolvimento. 

Acreditamos que este é o caminho e que a Jornada Mundial da Juventude pode ser um forte incremento para iniciarmos uma jornada gloriosa.