Um mês depois, há novo atentado. Desta vez, o alvo é a embaixada da Turquia e o protagonista Túlio Rosado, já reformado. As recordações agem no antigo elemento do Corpo de Segurança como um estimulante: quando fala, as suas mãos mantêm-se muito afadigadas, como se com elas trouxesse de volta o passado. Naquela quarta-feira de julho de 1983, Túlio escutou a fria risada da morte quando a metralha lhe rasou o corpo. Era o segurança do conselheiro Mustafá, o encarregado de negócios turco que substituíra nas férias o embaixador.
Ainda não seriam 11h00, quando o operacional decide ver se o movimento na rua está normal. Lembrara-se de um episódio do dia anterior que considerou uma ameaça plausível e que participara ao comando-geral. Mesmo à frente da embaixada, parara um Ford Escort branco e um rapaz, de fisionomia árabe, castigando a língua de Camões, mostrara-lhe um documento: «Visar passaporte, visar passaporte». O operacional pede-lhe o salvo-conduto, mas o outro arranca com o carro prometendo voltar no dia seguinte.
Agora, 24 horas depois, os alarmes tocam no seu cérebro, mal avista a viatura. Em segundos, um rosto conhecido salta do carro. Túlio puxa da arma e dispara na sua direção, enquanto o outro, acompanhando os seus reflexos, descarrega a metralhadora: «Ainda a estou a ver, com os carregadores colados um ao outro por fita-cola azul e amarela». Baixa-se, a rajada passa-lhe por cima do corpo atingindo as janelas, enquanto ele, coberto de vidro, entra pela porta blindada da embaixada. «Estou todo furado», pensou por segundos enquanto subia o lance de escadas que o levavam ao gabinete do conselheiro, gritando: «Terrorismo, terrorismo!».
De seguida, o condutor do Ford Escort arromba o portão da embaixada para entrar. No primeiro andar, um segurança turco neutraliza os dois homens que, conforme se saberia mais tarde, pertenciam a um comando arménio. Numa segunda viatura, dois elementos do grupo, ao perceberem que os outros foram abatidos, rebentam outro portão que dá acesso à residência oficial, onde se encontra a família do encarregado de negócios, que toma como refém.
Entrincheirado nas ombreiras das janelas, o grupo arménio faz pontaria à embaixada. A obrigação de Túlio é deter qualquer bala disparada contra Mustafá – o qual tenta rebelar-se às instruções do segurança para ir salvar a mulher e o filho que estão nas mãos dos arménios: «Eu tinha de olhar apenas pela vida dele, fui treinado para isso. O resto não importava. Mas os terroristas tinham dinamitado a residência e, a dada altura, a casa começa a arder. Só se ouviam os gritos da mulher do senhor conselheiro. Morreram todos queimados. Ele consegue-me fugir, atira-se por uma janela para ir salvar a família. Partiu um pé. A partir daí, nunca mais foi o mesmo, sentia-se culpado. E eu pedi férias e estive um mês na terra a pensar se devia mudar de vida. Fiquei».