Gatos pretos torturados em rituais

 “Durante estas duas semanas [antes e depois do Halloween], não dou gatos nenhuns porque sei que acontecem situações estranhas”. As declarações são de Ema Cardoso, da Associação Entre Gatos, e as ‘situações’ a que se refere são a tortura e morte de animais – nomeadamente gatos todos pretos – em cenários ritualísticos.

Desde que fundou a Entre Gatos há seis anos, na Portela de Sintra, que Ema foi alertada para os riscos das adoções destes animais, com especial incidência em algumas alturas do ano, nomeadamente na véspera do Dia de Todos os Santos, mais conhecida por Dia das Bruxas, celebrado amanhã. “As outras associações avisaram-me logo para não dar gatos em algumas alturas do ano, especialmente nesta”.

Embora tenha a convicção de que nenhum dos felinos adotados através da Entre Gatos tenha sofrido um fim deste género, Ema Cardoso admite que nesta época a afluência de chamadas de potenciais adotantes aumenta bastante. “Há pessoas que ligam especificamente a pedir gatos pretos e, creio que desde há dois anos, também todos brancos”.

Patrícia Cidade, uma das fundadoras da Associação P.A.T.A.S., em Almada, confirma essa tendência. “Há superstições com estes animais, tanto para a sorte como para o azar”, diz, explicando que por isso há mais pessoas a tentar adotar gatos nesta altura.

Apesar de considerar que estes crimes ficam normalmente ocultos porque se realizam em sítios menos acessíveis, recorda que, em 2012, se deparou com um gato preto morto numa espécie de altar no parque de estacionamento do Modelo da Carrasqueira, em Sesimbra. “Era um ritual de bruxaria. Foi cometido um crime contra aquele animal e deixado ali à vista de todos”.

Associações reforçam controlo nas adoções

No entanto, Patrícia acredita que quem procura os gatos para os torturar o faz cada vez menos em associações de animais, porque há mais controlo nas adoções. “Acredito que estas situações continuam a ocorrer, mas os animais provêm de particulares de ninhadas indesejadas”.

Também Ana Santos, presidente da Associação dos Amigos e Animais Abandonados da Moita (AAAAM) e responsável pelos gatis desta instituição, tem histórias para contar. “Quando se aproximam estas datas e as sextas feira 13, as pessoas chegam aqui e exigem um gato todo preto. Se eu disser que tem uma manchinha branca já não querem”. Ana admite que “não fecha a porta às adoções” porque tem “neste momento 30 bebés para adotar, a maior parte de cor preta”, mas garante que redobra os cuidados e só deixa sair os animais para pessoas referenciadas. Este cuidado é transversal a outras instituições, que fazem circular mensagens de alerta entre si. Apesar disso, a presidente da AAAAM diz já ter presenciado situações estranhas.

“Há uns anos, uma senhora chegou aqui desesperada a pedir-me um gato preto. No meio da aflição, começou a chorar e contou-me que precisava de pelos de um gato todo preto, para lhe pararem de extorquir dinheiro. Eu disse-lhe que até lhe dava os pelos, mas o gato para adotar não. Conclusão: ficou tão agradecida que até doou 50 euros à associação”.

De acordo com o Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA), as denúncias relativas a sacrifícios de animais “são pontuais e quase sempre envolvendo gatos e galinhas”, com incidência em matas menos frequentadas nos concelhos de Sintra, Braga e Coimbra. Até agora, o SEPNA não foi chamado a resgatar nenhum animal, pois, segundo fonte oficial do organismo, as “denúncias são efetuadas após a consumação destes rituais e as equipas mobilizadas ao local efetuaram apenas a recolha de vestígios (sangue, partes do animal e velas)”.

mariana.madrinha@sol.pt