Acusação a Lula divide Brasil

‘Petistas’ denunciam cabala das autoridades, que pediram prisão preventiva para Lula de forma a evitar a pressão da ‘rede’ do PT.

Guilherme Carrasco Neto é um jovem de 27 anos que está convencido que as autoridades brasileiras estão a fazer uma «encenação para criar a imagem de bandido» ao ex-Presidente Lula da Silva. Mas em sua casa mais ninguém acredita na tese e o irmão Daniel, com mais oito anos, diz que Guilherme tem «uma visão romântica da política».

Em reportagem da BBC Brasil, Guilherme diz «não ser petista» mas baseia-se nos «avanços sociais trazidos por este Governo» para contestar a família. E em particular a cunhada: «Ela é formada em economia com bolsa do ProUni [um dos muitos programas sociais com que Lula apoiou as classes mais baixas], é negra e morava na periferia da cidade». Uma clara «beneficiada do Governo Lula» que agora desdenha o antigo Presidente.

Desde que a mega operação Lava Jato chegou ao mais icónico líder da esquerda brasileira, na última sexta-feira, esta discussão repete-se nos lares, nos jornais e nas ruas do país, onde apoiantes e críticos da gestão do Partido dos Trabalhadores (PT) se envolveram em várias escaramuças ao longo da última semana.

Na quinta-feira, três procuradores do Ministério Público de São Paulo subiram o tom ao pedir a prisão preventiva de Lula no âmbito do processo em que é  acusado de falsas declarações e lavagem de dinheiro no ‘caso tríplex’ – um luxuoso apartamento numa praia perto de São Paulo, que garante não ser seu. O MP afirma que o ex-Presidente recebeu o apartamento da construtora OAS – uma das envolvidas no esquema de corrupção da Petrobrás que está a ser investigado na Lava Jato. Estão ainda envolvidos elementos da «Bancoop [Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo] intrinsecamente ligados ao Partido dos Trabalhadores»

A acusação argumenta que a  não ser preso, Lula poderá fugir e usar a sua rede de conhecimentos para fugir à justiça, o que já fez, alega, recorrendo a «manobras» para escapar à investigação. «Movimentará toda a sua ‘rede’ violenta de apoio para evitar que o processo crime que se inicia com a presente denúncia tenha o seu curso natural, com probabilidade evidente de ameaças a vítimas e testemunhas e prejuízo na produção das demais provas do caso», escreveram.

São igualmente muito críticos para Dilma, que deixou «a sociedade civil, a imprensa livre e as instituições públicas (…) surpresas» ao assistir a uma Presidente «interromper seus caros compromissos presidenciais para vir a público defender pessoa que não ocupa qualquer cargo público, mas que guarda em comum com a chefe máxima do Governo Federal a mesma filiação partidária».

A defesa de Lula acusa um dos procuradores em particular, Cássio Conserino, de «uma triste tentativa de usar seu cargo para fins políticos».

Para Dilma, o pedido de prisão preventiva «passou todos os limites». A Presidente garantiu ontem que não renunciará ao cargo, defendendo até que «solicitar a renúncia é reconhecer que não há base para o impeachment» – e essa será a maior reivindicação das manifestações que estão marcadas para domingo nas principais cidades do país. Com vários dirigentes do PT a defender que Lula devia assumir o cargo de ministro para evitar ser julgado pelo juiz Sérgio Moro – o estatuto obrigaria o Supremo a autorizar qualquer medida –, Dilma diz que «teria o maior orgulho de ter Lula como ministro» limitando-se a recusar «discutir isso» com os jornalistas.

*com Nuno Escobar de Lima