Antirracismo contraproducente

A propaganda antirracista, as acusações de racismo a propósito de tudo e de nada, estão a estimular os conflitos entre brancos e negros

O centro comercial Oeiras Parque, em Oeiras, nos arredores de Lisboa, esteve tempos sem fim em obras, que afastaram muitos clientes. O edifício cresceu em altura, e os restaurantes, que antes se encontravam no piso principal, foram relegados para o 3º piso, através de um acesso tortuoso, com duas escadas rolantes pelo meio.
Mas o pior nem foi isso – mas sim o desaparecimento de todos os restaurantes que serviam cozinha portuguesa. Há restaurantes de pizza, de hambúrgueres, de sanduíches, de cozinha israelita, argentina, italiana… mas cozinha portuguesa nem vê-la. Sobrevive a Portugália, que não é propriamente um restaurante mas uma cervejaria, especializada em bifes com um molho característico.

E foi mesmo na Portugália que aconteceu a cena que vou contar. Já passava das três da tarde quando entrou uma família de seis pessoas, presumivelmente angolanos. Um homem, duas mulheres adultas, e três filhos: uma rapariga quase adolescente e duas mais pequenas, dos seus oito ou nove anos, gémeas.
Admito que as duas mulheres vivessem com o homem, pois é vulgar isso acontecer em Angola (e noutros países africanos). Tive um motorista em Luanda que me dizia só ter «infelizmente» uma mulher, pois não tinha dinheiro para mais. E outros homens com quem contactei tinham duas ou três mulheres, a viverem em casas separadas ou debaixo do mesmo teto.

Na sala do restaurante, dado o adiantado da hora, havia várias mesas livres. O empregado indicou-lhes uma para 6 pessoas, que já estava posta, mas o chefe de família preferia outra. Apontou nessa direção, mas o empregado disse-lhe que estava «reservada». O homem continuou em pé, hesitante, e acabou por se dirigir para o terraço, sendo seguido por toda a família. Parlamentaram por alguns momentos e acabaram por concluir que não estava frio e podiam ficar ali.
Uns minutos depois, porém, o homem levantou-se e veio para dentro, sentando-se na dita mesa que o empregado lhe dissera estar reservada – e ali ficou a consultar o telemóvel. O resto da família permaneceu na varanda.

Um tempo depois, as duas meninas gémeas também vieram para dentro e sentaram-se ao lado do pai. A família ficou assim durante longos minutos dividida – com metade dentro e outra metade fora, na esplanada. Até que as duas mulheres e a rapariga mais velha vieram juntar-se aos outros – e sentaram-se os seis na tal mesa ‘reservada’.
Pensei que aquilo ia dar discussão.
Mas não deu: o empregado conformou-se.
Pôs a mesa e entregou as listas. Tudo parecia pacificado. Até que, passados alguns minutos, levantaram-se todos e saíram porta fora. Não sei o que se passou, pois não ouvi qualquer discussão nem palavras proferidas num tom mais alto. Sei que se foram embora, perante a deceção dos mais pequenos, que deviam estar esfomeados.
Dois casos se podem ter dado. Ou não gostaram da lista ou implicaram com o empregado por não os vir atender logo.
Devo dizer que o empregado era algo lento. Eu próprio já o tinha notado. Mas enquanto eu não atribuí qualquer significado ao facto – há empregados mais despachados e outros mais pachorrentos – eles possivelmente associaram isso a qualquer discriminação racial. Aliás, o facto de se terem sentado à mesa que lhes tinham dito estar reservada já mostrou um certo espírito de desafio, de forçar a nota, a experimentar a reação do empregado.

Este será mais um exemplo do que venho a dizer há muito: o antirracismo militante de certos grupos de extrema-esquerda está o fomentar o racismo. A ministra da Justiça prestou há meses, aliás, um péssimo serviço à causa, ao dizer que há racismo em Portugal.

Estas afirmações repetidas levam as pessoas de outras paragens, designadamente os africanos, a ter uma atitude de desconfiança, partindo para certas situações de pé atrás, e à menor suspeita julgam-se vítimas de racismo e reagem intempestivamente.

Noutros tempos, aquela família não atribuiria qualquer significado ao atraso do empregado e tudo correria normalmente. Agora, é o contrário.

Repito: a propaganda antirracista, as acusações de racismo a propósito de tudo e de nada, estão a estimular os conflitos entre brancos e negros – e portanto, objetivamente, estão a promover o racismo. Não duvido de que muitos dos propagandistas da causa sejam bem-intencionados. Só que, como diz o provérbio, de boas intenções está o inferno cheio.