Arte com lixo é exemplo de sustentabilidade

Convidado especial para discursar no próximo Green Project Awards, em Portugal, o artista plástico brasileiro Vik Muniz admite que não imaginava a relevância ambiental que seu projecto ‘Lixo Extraordinário’ acabaria por conquistar.

Segundo o artista, que actualmente vive entre Nova Iorque e o Rio de Janeiro, foi a possibilidade de trabalhar com um material tão improvável para uma obra de arte o que o atraiu em primeiro lugar.

«O lixo apareceu inicialmente como material, pela razão de ter, falando como artista, essa tendência à invisibilidade. O lixo está sempre sendo escondido, guardado. Ninguém quer vê-lo porque ele remete a uma série de referências negativas, como a morte e a passagem do tempo», explicou à Lusa.

Para o artista, que terá uma retrospectiva da obra exposta no Museu Berardo, em Lisboa, a partir do dia 21 de Setembro, a impossibilidade de preservar um trabalho realizado com uma matéria-prima perecível tornou o processo ainda mais fascinante.

«O lixo traz a história daquilo que a gente não quer preservar, a própria evanescência, o estar sujeito a uma eterna transformação, porque nada daquilo fica, e isso já traz em si uma atitude completamente não-artística», afirma.

Em ‘Lixo Extraordinário’, Muniz reproduziu fotos do aterro sanitário de Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, a partir de material reciclado comprado aos próprios homens que trabalhavam no local. Todo o processo foi filmado e transformou-se em filme, que foi nomeado para Óscar de melhor documentário estrangeiro.

«Quando eu faço um trabalho não estou realmente pensando no que eu vou fazer com aquilo. Geralmente estou tentando criar uma situação para observar o que acontece quando aquilo é feito, é muito empírico», observa.

Nos últimos anos, Muniz já realizou trabalhos com arames, açúcar, geleia e até xarope de chocolate – material com o qual recriou ‘A Última Ceia’ de Leonardo da Vinci.

«Eu já havia começado a trabalhar em grupo, a tentar incluir pessoas ajudadas por uma ONG, por exemplo, que é uma coisa que me dá muito prazer, porque faz com que o trabalho transcenda minhas próprias expectativas», explica, entusiasmado.

Segundo Muniz, se o lixo como material foi o que primeiro lhe levou até Jardim Gramacho – o que realmente o impressionou foi as pessoas que encontrou.

«Quando você chega [no aterro sanitário] vê aquele monte de coisas, que não se consegue perceber direito o que é, pontuado pelo movimento dessas centenas de pontinhos andando como formiga. E quando vai se aproximando, fica impressionado, porque vê que aquilo é gente. Gente como eu, como você. Não é ‘subgente’, é gente», reforça.

Muniz envolveu-se directamente com várias pessoas no local de quem ficou amigo e chegou a levar um deles – Tião Santos – à cerimónia dos Óscares. Destinou também o dinheiro arrecadado com a venda das fotografias para a associação dos apanhadores de lixo da qual Tião é o presidente.

O filme trouxe uma enorme visibilidade ao trabalho realizado pelos homens do lixo, que desde então já obtiveram conquistas importantes, entre elas a aprovação da lei que regulamenta a profissão no Brasil.

O Green Project Awards, que chega este ano à quarta edição, tem como objectivo premiar e reconhecer iniciativas ligadas à preservação e sustentabilidade do meio ambiente. Durante a cerimónia, que ocorrerá no próximo dia 15, em Lisboa, serão conhecidos os premiados de 2011.

Lusa/SOL