CC Stop: a Cultura tem de ter solução!

Parece indiscutível que o CC Stop carece de obras que custarão, ao que li, cerca de 6 M€ e, sem ser adivinho, não creio que os proprietários alinhem nisso

Estamos a chegar ao Verão, falemos de outros temas, igualmente importantes, mas menos badalados do que a política e a economia. Estes dois temas já constituem matéria mais que suficiente para todo o ano, pelo que variar um pouco só nos faz bem a todos.

Por exemplo, abordemos o tema do recente encerramento de diversas lojas no Centro Comercial Stop no Porto, um ícone da cidade nos anos 80, depois abandonado (ou degradado) e que nos últimos 20 anos tem sido basicamente ocupado por músicos e sonoplastas que ali desenvolviam as suas atividades. Mas antes, tenho de fazer um introito, explicando um pouco porque estas matérias de artistas me dizem muito.

 

Tenho de regressar à minha meninice, ao Jardim da Estrela, onde brincava com quem aparecia, levado pela mão da minha avó Alda, que vivia connosco. Entre tantos meninos/as que por ali andavam, sobrou o João Jorge, que morava na Calçada da Estrela. Se no tempo de meninos éramos inseparáveis, assim continuámos pela adolescência até à idade adulta, com estórias de criança como jogar à bola e fugir do guarda Tomás, de adolescentes em que diariamente íamos a casa um do outro e mais tarde a festas juntos, até que chegámos a adultos e ambos casámos. Desde então que nos vemos menos, mas a amizade, essa é eterna!

 

Tudo isto para dizer que se eu fui para ciências, ele (João Jorge) foi para as artes, mais tarde para a Faculdade de Belas-Artes, a estudar desenho, escultura e as nossas estórias também envolveram levarmos as suas obras para exposições, na grande Lisboa, na altura no meu VW Karmann Guia de 1957, adquirido por 12 contos (!) e comprado com o dinheiro que angariei a fazer entrevistas durante meses para o INE. Nesta altura já era o João Duarte, escultor, mais tarde medalhista, hoje de renome internacional (em 2011 ganhou o Prémio J. Sanford Saltus da American Numismatic Society) e membro da Academia das Belas Artes.

Nesta sua carreira, a partir de certa altura, teve um estúdio (com Feliciano Morgado) no Palácio dos Coruchéus, onde ficou 36 anos, cedendo depois lugar aos mais novos, por acordo com a Câmara Municipal de Lisboa. Neste local, onde ainda hoje existem estúdios (ao que sei), também estiveram outras figuras da cultura nacional, como por exemplo Dorita Castel-Branco, Manuela Madureira ou Laranjeira Santos. Ou seja, um exemplo de apoio à cultura.

 

Regresso ao Porto. Andei profissionalmente por esta cidade nos anos 80 e recordo-me bem do CC Stop. Um centro acanhado, mas como disse icónico, sobretudo pela novidade que constituía na cidade. Depois a própria evolução da cidade veio trazer novas centralidades, também comerciais e o CC Stop, depois de cristalizar, definhou e degradou-se acentuadamente. Os artistas vieram depois animar este Centro e tornou-se um símbolo da importância cultural na cidade, apesar das péssimas condições de funcionamento.

Falemos claro: o CC Stop não tinha, nem tem, condições mínimas de segurança! Infelizmente, já sucederam incêndios (pelo menos dois) no local, as saídas de emergência são escassas, as lojas estavam sem licença e… o espaço é muito apetecido na cidade, ainda para mais sendo de propriedade privada, o que dificulta qualquer opção de continuação dos artistas no local. Dizem que provisoriamente (ou não) serão colocados bombeiros (apenas 12 horas por dia), mas isto não é solução.

Parece indiscutível que o CC Stop carece de obras que custarão, ao que li, cerca de 6 M€ e, sem ser adivinho, não creio que os proprietários alinhem nisso. Assim, creio que a solução terá de passar pela Câmara Municipal e, embora já se tenha falado em alternativas, a Escola Pires de Lima ou os últimos andares do Silo-Auto, julgo que terá de se passar por algo mais definitivo.

 

Fica então aqui o meu apelo ao Dr. Rui Moreira, que tenho o privilégio de conhecer, apesar de não nos vermos há uns anos: acredito que haja terrenos municipais disponíveis, pelo lhe peço que construa nalgum deles uma qualquer réplica dos Coruchéus e, nos entretantos, reabilite urgentemente qualquer edifício que dê guarida a todos estes músicos, pelas razões mais simples de todas: porque sem cultura nada somos e… porque os artistas merecem!

 

P.S. – Li que Costa deixou mais cedo o Conselho de Estado para ir assistir a um jogo de futebol do Campeonato do Mundo Feminino da Seleção de Portugal que se realizaria 36 horas depois, pelo que o Presidente Marcelo determinou a respetiva continuação em setembro. Dando de barato que o primeiro-ministro de Portugal dê a entender que um jogo de futebol é mais relevante do que participar num Conselho de Estado (sobretudo quando consta ter ‘ouvido das boas’), pergunto: permanecer mais um par de horas faria diferença (até porque teria a vantagem de evitar ficar a ideia de uma manifestação de desprezo por todos os presentes, a começar pelo Presidente Marcelo)?