Colagénio. Pele de peixe e patas de galinha, o novo elixir da juventude?

Alimentos, suplementos em pó, tratamentos estéticos… São várias as formas de repor o colagénio que vamos perdendo com o passar dos anos. Segundo os especialistas, nada melhor do que as proteínas animais para colmatar essa carência, mas estaremos nós dispostos a comer pele de peixe e pernas de galinha? 

A premissa de que a alimentação é uma “moda” está cada vez mais presente. Vemo-lo, por exemplo, nas publicações das redes sociais onde influencers ou famosos, partilham restaurantes ou determinados pratos e, durante um período de tempo, as imagens se multiplicam, quase como se tivéssemos de fazê-lo e frequentá-los para nos sentirmos “a par das tendências”. O sushi, o abacate em pão, os ovos benedict, o pão preto, o salmão fumado em sandes… Mas, e se de repente a moda fosse comer pele de peixe e patas de galinha? E se olhássemos ao nosso redor numa mesa de restaurante e fôssemos confrontados com senhores a ingerir os membros inferiores de uma ave e as senhoras a pele de um peixe? A ideia pode parecer estranha, mas vemo-lo cada vez mais frequentemente, mesmo que subtilmente. E porquê? Porque, ao que parece, estes combatem o envelhecimento da pele – já que são ricos em colagénio – e por isso começam a ser vistos como a “fórmula mágica” para uma “pele perfeita”, ou um “elixir para o anti-envelhecimento”. 

A verdade é que os anos passam e a pele reduz a produção de colagénio – proteína responsável por dar suporte à pele e segunda substância mais presente no corpo humano a seguir à água. Com isso, as rugas tornam-se mais evidentes, as manchas aparecem e a pele acaba por perder gradualmente o brilho de outrora. Segundo um artigo da Annals of Medicine, existem 28 tipos de colagénio, estando cada um “categorizado na sua composição de aminoácidos” e sendo “90% do colagénio no corpo do tipo 1, encontrado na pele, tendões, órgãos internos e partes orgânicas do osso”. Já o tipo 2 é encontrado na cartilagem, e o tipo 3 está presente na medula óssea e nos tecidos linfoides. No que toca ao tipo 4 e 5, o primeiro é encontrado “em camadas finas que envolvem a maioria dos tecidos” e o segundo “no cabelo e nas superfícies das células”. Assim sendo, são cada vez mais aqueles que desejam manter a aparência da pele e a sensação de saúde e, por isso, procuram alimentos ricos na proteína, produtos à base de colagénio – como cápsulas, bebidas, pó – ou mesmo tratamentos estéticos, como aplicação de ácido hialurónico e botox.

Os alimentos com colagénio “O colagénio é a proteína mais abundante no nosso organismo, penso que ela esteja à volta dos 30% das proteínas totais que se encontram no nosso corpo. É ela a responsável não só pela elasticidade e firmeza da pele, como também das cartilagens”, reforçou a nutricionista Mária Benedito ao telemóvel com o i. Ou seja, falamos de tudo aquilo que é “sustentação”, que “nos dá suporte”. Segundo a especialista, o nosso corpo produz o colagénio “normalmente”, mas “mais em contacto com a vitamina C”: “Quando a ingerimos, o nosso organismo tem uma enorme capacidade de absorção. A partir dos 25, 30 anos começamos a não produzir tanto. Começa a haver uma diminuição dessa produção. É aí que devemos ‘abusar’ de alguns alimentos!”, explicou, fazendo referência às carnes vermelhas, brancas, aos ovos, gelatinas animais (feitas de osso), pele e ossos do porco e as cartilagens. “O frango, quanto mais velho melhor, porque tem mais cartilagens e, o melhor, são mesmo os pés, onde tem mais colagénio”, adiantou. Relativamente ao peixe, de acordo com a nutricionista, devemos comer “as peles, as espinhas e, mais uma vez, as cartilagens”. “As lulas também têm bastante, tal como o marisco. Todos servem para produzir”, sublinhou. Portanto, “é importante que isto esteja sempre tudo relacionado a um alimento com vitamina C: limão, laranja, abacaxi, kiwi, mamão, papaia”. Dessa forma, “a absorção de colagénio é mais fácil”. “Pensemos em alguém que está, por exemplo, a fazer dieta, o prato ideal seria leitão assado com laranja! Aqui conseguimos aproveitar tudo!”, exemplificou a especialista. Contudo, há também alimentos sem ser de origem animal, como é o caso do tomate, da beterraba, ou de vegetais de cor verde. “Mas melhor mesmo é a proteína animal!”, frisou Mária Benedito. 

Já Alexandre Fernandes, também especialista em nutrição, admite ao i que nunca tomou conhecimento “que eventualmente a pele do peixe seja rica para o colagénio”. “Pode ser verdade, mas até agora não tenho tido esse feedback! É mais depressa a cartilagem do frango, pato, peru ou mesmo entrecosto. Aquela parte branca do osso… Isso sim é cartilagem! Quando fazemos uma canja, por exemplo, e utilizamos mesmo uma galinha… Ao deixarmos algum tempo a arrefecer, ela acaba por criar uma camada espessa em cima. Isso sim, é um caldo rico em colagénio”, elucidou. De acordo com o mesmo, para a reposição do colagénio “é muito importante comermos três aminoácidos essenciais que provêm da nossa alimentação”: “A prolina, a lisina e a glicina”, enumerou, reforçando que estes aminoácidos “estão muito presentes nos caldos e sopas que levam carne ou peixe”. “Tem de ter na sua constituição os ossos e as espinhas dos peixes, claro!”, alertou. 

A degradação do colagénio Além desse “processo natural”, segundo os especialistas, a perda de colagénio pode ser acelerada pelo facto do nosso corpo ser exposto a processos oxidativos que aceleram a sua degradação, tais como “a exposição ao sol, maus hábitos alimentares e de vida, e a poluição”: “Tudo o que forem situações de stresse, claro que pioram a situação! Além disso, uma pessoa que não tem hábitos de alimentação saudáveis e que não consome tanto estes alimentos, é normal que tenha alguma deficiência em colagénio. Mesmo até mais novos!”, acrescentou a nutricionista. Tendo em conta que esses fatores, “influenciam muito no envelhecimento”, de acordo com Alexandre Fernandes, “as pessoas começam a querer combatê-lo mais precocemente”. “Isso acaba por depender da parte monetária de cada um. Conheço pessoas que desde cedo acedem ao ácido hialurónico e ao botox para prevenir as rugas. Agora, depende muito se a pessoa cuida muito do aspeto ou não. Há algumas que se descuidam, desleixam, não querem saber do aspeto físico, e depois temos outras que lhes dão muita importância”, explicou. Apesar disso, o especialista acredita que “as pessoas se preocupam cada vez mais com a saúde da pele”. “Vejo muitas pessoas nas minhas consultas a colocarem cremes, por exemplo. Ainda hoje falei com um rapaz a quem dei consultas num ginásio que estava a ganhar feridas entre o ombro e o peito devido ao aumento da massa muscular… Neste tipo de situações, em que pessoas praticam muito desporto e desejam o aumento de massa muscular, é também importante tomarem o colagénio para beneficiarem a elasticidade da pele. Não são, por isso, só as mulheres que o procuram. É geral”, sublinhou. 

Já Mária Benedito lamenta a falta de sensibilização para o tema, revelando que, na sua área – as dietas – o tema colagénio “é ainda uma parte difícil”, mesmo quando é em suplementação. “Hoje em dia, já há vários sabores, várias marcas em pó. Basta misturar com a água e beber. Mas eu sou defensora de que, enquanto for possível fazê-lo com comida, é melhor! Pode ser mais prático e barato, mas enquanto o pudermos fazer de forma natural, porque não? Outra coisa é eu ter uma dieta de emagrecimento em que tenho alguém que necessite de eliminar 50 quilos,… Se calhar eu vou à suplementação, porque não vou conseguir garantir que diariamente esta consuma tanto colagénio como aquilo que eu estou a precisar que a pele da pessoa recupere, ou não perca!”, elucidou. 

Efeitos colaterais? No que toca aos riscos ou efeitos secundários que o colagénio possa ter, de acordo com o nutricionista, se nós falarmos em termos dos alimentos em si e dos aminoácidos que levam à produção do colagénio, “não existe qualquer tipo de risco”. “A não ser que a pessoa, por algum motivo, comece a comer carnes mais gordas. Aí não estamos a falar apenas de colagénio, mas também de outros nutrientes, proteínas, gorduras e hidratos de carbono. Isso claro que pode levar ao aumento do peso e a todas as consequências que, eventualmente, possam daí advir”, afirmou. Segundo o mesmo, se nós falarmos da suplementação, nela podem existir outros ingredientes associados ao colagénio, como alguns açúcares, adoçantes artificiais. “Se a pessoa tiver alguma intolerância a algum desses ingredientes extra, pode ter reações adversas, claro!”, alertou Alexandre Fernandes. 

“Não há efeitos colaterais porque o nosso corpo produz essa proteína! Não são conhecidos efeitos colaterais no consumo de colagénio através da alimentação”, reforça também a especialista. “Contudo quando consumido sob a forma de suplemento e com dosagem superiores às recomendadas (a recomendação depende do objetivo, da pessoa, da necessidade, se é para a pele, unhas ou para as dores articulares, entre outras), pode ter consequências. Não deve ser suplementado mais que 10g diárias sobre o risco de sobrecarga ao rim”, explicou, acrescentando que, a toma pode, por vezes, “causar azia e sensação de enfartamento”.

Interrogada se é possível que a procura por este tipo de alimentos aumente precisamente para a reposição do colagénio, a nutricionista acredita que há muitas pessoas que podem acabar por ficar “vidradas” na ideia, já que a alimentação “é uma moda”: “Acredito que existam pessoas que só comem pernas de galinha e pele de peixe!”, brincou.