Cuidado!

Técnico do Benfica vai a Luanda para conferência organizada pelo SOL. Há 12 anos, em conversa com o então primeiro-ministro Durão Barroso, falava-lhe das minhas preocupações sobre o futuro da economia portuguesa: as indústrias tradicionais (minas, pescas, conservas, têxteis, vidro, calçado, etc.) tinham colapsado ou entrado em declínio, o investimento escasseava, e a ascensão dos…

Respondeu-me que a situação não era tão negra como eu a pintava, pois – ao contrário desses países – tínhamos designadamente uma boa rede bancária.

A realidade não poderia contrariar de forma mais cabal o ex-chefe do Governo. 

Poucos anos depois, a banca portuguesa começaria a ruir como um castelo de cartas: o BPN, o BPP, o BCP, o Banif, todos eles, por uma razão ou por outra, entraram em dificuldades e alguns viriam mesmo a fechar.
Agora é o BES que está na linha da frente.

Os casos mais graves foram o BPN e o BCP.

O BPN foi uma grande tragédia para o Estado, mostrando que a decisão de o nacionalizar terá sido porventura mal avaliada.

O BCP foi uma tragédia para o país, mostrando como se pode destruir um grande banco em meia dúzia de meses.

E tudo aconteceu quando?

No momento da sucessão do fundador e em consequência de uma sangrenta guerra interna pelo poder.
Os accionistas, com Joe Berardo à cabeça, pegaram em metralhadoras e começaram a disparar uns sobre os outros, não deixando pedra sobre pedra.

Tresloucadamente, desvalorizaram os seus próprios capitais, perdendo centenas de milhões de euros com a queda abrupta e brutal das acções que possuíam.

Só agora, sete anos depois, o BCP começa a levantar a cabeça, recuperando a pulso o terreno perdido. 

Ora bem, o Banco Espírito Santo entrou num período crítico, que pode conduzir a um fenómeno semelhante.
Vai ter lugar a sucessão do líder executivo, que renunciou ao cargo antes do fim do mandato, e já teve início uma luta pelo poder que se arrisca a ser devastadora.

Se – como se diz – a renúncia de Ricardo Salgado foi pressionada pelo Banco de Portugal (em virtude dos problemas legais em que o banco e ele próprio estavam envolvidos), então o presidente cessante não deveria ter apontado um sucessor.

E muito menos deveria ter indicado para seu sucessor o nome do seu director financeiro.

Ricardo Salgado, sendo um homem astuto (nem poderá ser outra coisa, dado o período tão longo em que presidiu à instituição), sabe muito bem que, se o seu director financeiro efectivamente lhe suceder, duas situações poderão dar-se:

Primeira: o homem tornar-se um mero factótum seu, um duplo, fazendo o que ele lhe mandar fazer; neste caso, a sucessão será um embuste, pois Salgado continuará a presidir ao BES por interposta pessoa.

Segunda hipótese: o novo líder querer assumir de facto as rédeas do banco, recusando-se a ser um peão do antecessor – e aí os choques entre os dois tornar-se-ão inevitáveis e a história acabará mal.
Recorde-se, outra vez, o que sucedeu no BCP.

Apesar de Jardim Gonçalves se ter rodeado de muitas cautelas, escolhendo para lhe suceder um homem que tinha um superior currículo público – Paulo Teixeira Pinto –, o conflito estalou e deu no que deu.

Salgado deveria, a meu ver, ter-se abstido de apontar um sucessor.

A solução deveria ter sido apresentada como resultante de um consenso entre os accionistas – e seria sensato que a escolha recaísse sobre um nome independente, uma figura sem ligações a qualquer dos membros da família, com personalidade própria e provas dadas fora da instituição.

Portugal, neste período também crítico para o país, precisa de bancos fortes e sólidos.

Embora haja na população uma certa animosidade contra a banca (acusada, às vezes com razão, de praticar agiotagem), a verdade é que ninguém ganha com bancos fracos e muito menos com bancos falidos.

O Estado sofre, a economia ressente-se, muita gente perde os seus depósitos.

É pois importantissimo que a sucessão no BES corra bem.

Mas, para isso, os membros da família e os outros accionistas devem ter a humildade de guardar as espingardas. 

Caso contrário, tudo poderá acabar aos tiros e será mais um banco a cair na desgraça. 

E aqueles que querem ficar com o maior quinhão do poder poderão conquistá-lo – mas ele já não valerá nada.

A queda das acções do BES, que neste momento representa perdas de mil milhões de euros, é um aviso suficientemente sério. 

P.S. – A guerra de poder no PS também está a produzir episódios tristes. Há feridas que já não vão sarar, divisões irremediáveis e ódios que não irão desaparecer. Nada no Partido Socialista voltará a ser como dantes.