Daytona. Uma arena com novos gladiadores

As 24 Horas de Daytona marcam o primeiro “confronto” entre EUA e Europa na era Trump. Construtores americanos e europeus medem forças, este fim de semana, na mítica corrida de endurance, obrigatória no currículo de qualquer marca e piloto. Os portugueses estão presentes, e para ganhar! Quer Trump goste quer não

Daytona International Speedway é a arena dos tempos modernos, onde os pilotos lutam sob o olhar extasiado de mais de 100 mil espetadores. Os aficionados das corridas de endurance só conhecem dois santuários: Le Mans e Daytona.

Construída em 1959, a pista fica no estado da Florida, tem configuração tri-oval (oval de forma triangular) e banking com 18 graus de inclinação, e utiliza o traçado sinuoso do interior da oval (infiled). No total, são 5,7 quilómetros de pura adrenalina. Nenhum outro circuito do mundo apresenta estas características. É um símbolo das corridas americanas e serve também para a NASCAR, o desporto nacional dos americanos.

Nesta pista anda-se verdadeiramente depressa. A pole position é feita à média de 220 km/h e a velocidade máxima ultrapassa os 300 km/h!

Os americanos fazem ponto de honra em valorizar os fãs e dar-lhes condições para apreciarem o espetáculo. Das bancadas consegue ver-se 90 por cento do traçado, pelo que aqui não há ecrãs gigantes para acompanhar a corrida. Os bilhetes para dois dias são bastante acessíveis, variando entre 40 e 60 dólares (37 a 56 euros) – também aqui, os organizadores europeus têm muito a aprender.

Seguindo o exemplo de outras modalidades, o espetáculo vem em primeiro lugar, deixando os aspetos desportivo e tecnológico para segundo plano. Os organizadores fazem tudo para que o espetador esteja no coração da ação – o conceito “American way of life” no seu melhor.

É nessa lógica que, uma hora antes da partida, a pista está aberta ao público, que aproveita para tirar selfies com pilotos e carros e passear pelo impressionante banking – o bilhete postal de Daytona. É um ambiente descontraído, radicalmente diferente das corridas na Europa, onde pilotos e fãs quase não convivem.

A cerimónia oficial começa com o hino nacional e a mão sobre o peito. Depois, as 24 Horas de Daytona podem começar. Desde a primeira edição, em 1966, que os grandes construtores e os melhores pilotos vêm à conquista de Daytona e do seu banking, e esta é uma vitrina privilegiada para criar uma imagem positiva. Aqui se travaram lutas memoráveis entre Ferrari, Porsche, Ford e Jaguar, e viveram-se momentos dramáticos. Tal como em Le Mans, a Porsche é a marca mais vitoriosa, com 18 triunfos.

Portugal já ganhou

João Barbosa venceu as 24 Horas de Daytona por duas vezes (2010 e 2014) e volta a estar entre os favoritos este ano. Vai conduzir o Cadillac DPi, protótipo com motor V8 6.2 litros, de 600 cv, e tem como colegas de equipa Filipe Albuquerque e Christian Fittipaldi.

Correr em Daytona “é especial, é uma bela ocasião para mostrar o nosso valor”, começou por dizer João Barbosa, que vive a 15 minutos do circuito. “É uma corrida histórica que todos querem vencer, mas extremamente desgastante a nível físico e psicológico. Ter 55 carros em pista, com andamentos muito diferentes, torna a tarefa dos pilotos mais rápidos um inferno, sobretudo à noite. É normal ultrapassar mais de dez carros por volta.” Refira-se que há uma diferença abismal de oito segundos por volta entre os protótipos e os carros mais lentos!

A edição de 2017 marca o início do campeonato norte-americano de Endurance – IMSA, disputado com novos protótipos, que têm a particularidade de serem mais rápidos que os protótipos do Mundial de Endurance (WEC). “Devido à alteração dos regulamentos, há uma grande incógnita sobre o potencial dos carros. As equipas tiveram pouco tempo para preparar esta corrida. Quem conseguir o melhor acerto e fiabilidade será o vencedor. Nos treinos estivemos sempre entre os quatro mais rápidos, o que me deixa confiante”, referiu o piloto português.

O segredo para obter um bom resultado “é ter boa estratégia e disciplina, para não cometer loucuras. Numa corrida de 24 horas, não basta ter o carro mais rápido, é importante passar o menor tempo possível nas boxes. É mais fácil de dizer do que fazer”, alertou o piloto da Cadillac, sobre quem recai a responsabilidade de iniciar e (espera–se) terminar a corrida.

O interior da oval é um enorme camping e o ambiente à volta da corrida é de extravagância total, para comodidade dos espetadores. “Eles levam gigantescas caravanas e pick-ups que depois transformam em bancadas. Montam piscinas, realizam jogos tradicionais, fazem os indispensáveis barbecues e têm animações noturnas, tudo isto a escassos metros da pista onde os pilotos passam a mais de 300 km/h. O ambiente é de festa total durante três dias.”

A noite em Daytona é longa e tem um ambiente especial. Na Florida, em janeiro, o sol esconde-se antes das 18h e os primeiros raios de sol surgem pelas 7h15 da manhã, ou seja, grande parte da corrida é feita de noite, numa pista (mal) iluminada por 2 mil holofotes.

É também de noite que as coisas começam a acontecer, que surgem os primeiros problemas mecânicos, e a falta de concentração leva a cometer erros. “A condução é ainda mais difícil. Temos de nos concentrar nos pontos de travagem e na abordagem às curvas, mas temos também de perceber onde a pista tem mais aderência. É a altura em que a experiência e a determinação fazem a diferença” disse João Barbosa.

A corrida tem início sábado às 19h30 (hora portuguesa) e pode ser acompanhada em http://www.imsa.com/events/rolex-24-daytona-0.