Eleitoralismo em contrarrelógio…

Caro leitor: o que têm em comum municípios tão diferentes e distantes entre si como Arcos de Valdevez, Elvas, Oliveira de Frades ou Lisboa? Acertou. Têm em comum o despesismo eleitoralista.

Não há nada mais excitante para um autarca do que a proximidade de nova consulta eleitoral. Por todo o país florescem os outdoors, com frases gastas e vazias de qualquer conteúdo, desligadas da realidade das populações que é suposto servirem. Chega a ser confrangedor

Câmaras gastam milhões em ano de autárquicas, titulava o JN em edição recente. E com razão. 
Para os autarcas em exercício – e aspirantes à reeleição –, o importante é lançar ‘obra’, programando vistosas inaugurações, onde se pavoneiam, desafiando os limites do endividamento. É um fogo-de-artifício ridículo, mas que se repete. 

O benefício real para as comunidades é frequentemente irrelevante, mas confia-se que dê votos. Privilegia-se o ‘bonito’ em detrimento das infraestruturas. Aposta-se no basbaque.

O caso de Lisboa é, seguramente, exemplar desse estado de coisas em clima pré-eleitoral. Com a agravante de Fernando Medina – tal como António Costa, a quem substituiu – não se sentir legitimado no cargo. Ironicamente, partilham ambos o mesmo desconforto. 

Sem dispor dos favores de Belém, que amparam o Governo, Medina, decidiu ‘fazer pela vida’ e transformar a capital num imenso estaleiro, com obras a esmo, alheio às consequências para a vida dos munícipes. 

Desde a avenida da República ao Cais do Sodré, Campo das Cebolas, Lumiar, até ao Parque das Nações e a um sem número de outras intervenções, o caos foi distribuído com zelo. 

Em nome da modernização da cidade, Medina ‘disparou’ em várias direções, com critérios por vezes imperscrutáveis e planificação descuidada. 

Estrangulam-se eixos viários essenciais e alargaram-se passeios de uma forma absurda, cuja vantagem ninguém percebe.

A bicicleta foi eleita como prioritária, incluindo atravessamentos superiores, como na 2ª Circular, onde não se avistam ciclistas mas que serve para publicitar em permanência uma petrolífera.   

Vá lá que Medina ainda recuou na ‘reconversão’ da 2.ª Circular – um projeto de contornos insensatos –, mas promete avançar com a nova Feira Popular, reeditando uma bizarria que se arrastou penosamente, anos a fio, em Entrecampos. 
Na ressaca do imbróglio jurídico em que a Câmara se envolveu, o espaço de Entrecampos está às moscas desde 2003, entre tapumes e as ruínas de um teatro. Após o fiasco de duas hastas públicas, Medina promete pôr o terreno à venda «em momento oportuno». Estamos conversados.

Se a penalização nas urnas fosse proporcional aos incómodos sofridos pelos munícipes, Assunção Cristas ou Teresa Leal Coelho poderiam cantar vitória em Lisboa. Na dúvida, cabe-lhes, ao menos, escrutinarem o frenesim das obras, já que é improvável que os candidatos à esquerda da ‘geringonça’ o façam. 

Contas feitas, Medina deve achar que os impactos negativos ficarão esquecidos, à medida que chegue o Verão, as Festas da Cidade e os palanques para botar discurso.   

É estranho, porém, que ninguém se interrogue sobre a fatura que recairá, hoje e no futuro, sobre os cofres municipais. 

Otimista quanto à ‘concorrência’ em Lisboa, o PS enfrentou o seu primeiro grande revés pré-eleitoral no Porto. O afastamento súbito de Rui Moreira deixou o partido de ‘calças na mão’.  

Ao bater com a porta em vésperas da Convenção Autárquica socialista, Moreira rompeu com um apoio que estava a embaraçá-lo. As declarações imprudentes de Ana Catarina Mendes deram-lhe o pretexto para sair sem pedir licença.

Claro que tanto bastou para, no dia seguinte, ser alvo dos mimos habituais de gente do partido, desde ‘partido fóbico’ a senhor de um ‘ego galáctico’. 

Jorge Coelho avisou há muito que «quem se mete com o PS leva». Por isso, não será de estranhar. O que dói ao PS é saber que Moreira é, de momento, o ‘dono do baralho’ – e Manuel Pizarro é um recurso de última hora que não fará sombra a ninguém. 

Com este desaire nos preliminares da segunda cidade do país, Costa já percebeu que as próximas autárquicas não serão, afinal, um passeio. E que Passos Coelho está de pedra e cal.

A vida dos socialistas não está fácil. Por cá, estão amarrados à ‘geringonça’. Pela Europa, os ventos não sopram de feição. Após o declínio dos partidos comunistas, os socialistas já conheceram melhores dias.  Em França, Manuel Valls, o ex-primeiro-ministro do Governo de Hollande, declarou, urbi et orbi, que «este PS está morto». 

Nada que faça António Costa perder o sorriso. Ou, como diria Marcelo Rebelo de Sousa, «ele todos os dias, mesmo quando chover, abre persianas e está um sol radiante». O pior são as trovoadas de maio…