Estripador: A descrição da vítima e do local do crime

A sentença, que a cada passo atropela as transcrições, mesmo quando parece acertar, falha. Por exemplo, no rol das contradições que diz ter encontrado entre o que afirmou José Guedes ao SOL e a realidade, refere que ele cometeu um erro ao dizer que a vítima tinha cabelos compridos. Mas, se alguém se tivesse dado…

E, ao longo da argumentação, chega-se à comédia quando o tribunal se esforça para ‘expulsar’ Guedes do local do crime – quando foi esta a descrição que permitiu à PJ identificar o homicídio de que ele falava.

Diz-se, nomeadamente, que nas conversas com a jornalista José Guedes atribui à vítima uma falsa residência. Na verdade, Guedes diz que a vítima era de «ali…» – e acrescentou o nome de uma terra que, devido às más condições técnicas, é praticamente inaudível, só se chegando à palavra ‘Cortegaça’ por aproximação. Mas isto bastou para o juiz relator, cheio de certezas, afirmar: «A vítima morou sempre na Póvoa do Paço, freguesia de Cacia, em Aveiro. E ambas as povoações, de Cortegaça (em Ovar) e de Cacia (em Aveiro) distam entre si cerca de 30 quilómetros em linha recta».

Ora, na entrevista, vê-se que foi o próprio Guedes – que ficou provado que trabalhou em Aveiro – quem tentou orientar a jornalista quando esta disse que desconhecia o local: «A partir de Espinho pertence tudo a Aveiro… Você vai por Santa Maria da Feira, e S. João da Madeira, por ali a baixo, pronto. Então não passa em Cacia? Cacia é muito antes de Aveiro. Então não conhece ali, antes de chegar a Estarreja…? Tem, digamos, Ovar, Estarreja e depois é que é Cacia. Não há ali umas fábricas, como a Petrogal de Leça? Não conhecia? Pronto, tem ali aquele matagal… Eu trabalhei em Cacia. Pronto. E aquilo (referindo-se a Esguelha, que pertence a Cacia) é tudo, digamos… é campo, matagal, é uma aldeiazita pequenina. Pronto é pequenina, como qualquer zona pequenina. Pronto, foi aí».

Nesta emaranhada sentença, omite-se ainda o facto de Guedes ter referido nas entrevistas que o crime foi cometido a uma sexta-feira e durante a noite – como concluiu a investigação policial.

felicia.cabrita@sol.pt