Figuras do ano

Se tivesse que eleger a pior figura nacional do ano não optaria por José Sócrates, mas por Angela Merkel.

josé sócrates foi à televisão dizer umas palavras e a coisa não correu lá muito bem. tanto quanto me contaram, exibiu a sua enésima variante de optimismo, o que, tendo em conta a quadra natalícia, até podia resultar. o problema é que não há esperança que resulte com aquela cara – nem mesmo a que se serve de mansinho e em doses homeopáticas.

independentemente do que diga ou faça, o primeiro-ministro suscita a irritação imediata em, pelo menos, dois terços dos que o escutam. para estes, ele já só serve para más notícias ou para notícias-boas-que-não-o-chegam-a-ser. ele é, em si mesmo, a cara da desgraça sempre que surge, o que – infelizmente para ele e para nós – ocorre quase todos os dias, quando não várias vezes ao dia.

há algo de irracional e de perverso nesta relação televisiva. o primeiro-ministro não percebe que a sua imagem piora sempre que aparece e independentemente do que diga; os telespectadores ‘do contra’, pelo seu lado, concentram numa só criatura a expiação de tudo o que de mal aconteça no país – o que é, obviamente, exagerado.

certo, quem mais contribuiu para este divórcio litigioso foi o próprio josé sócrates – ele fez tudo para resumir a política nacional à dicotomia «quem não é por mim é contra mim» – mas não é menos certo que a simplificação dificulta o entendimento. sempre.

se tivesse que eleger a pior figura nacional do ano não optaria por josé sócrates, mas por angela merkel. friamente, o que mais detesto no comportamento do primeiro-ministro é a sua absoluta irrelevância no debate europeu que nos está a tramar. sucede que esta crítica é inteiramente extensiva a cavaco silva, presidente da república, como o seria a passos coelho, se fosse este a figura de plástico que o povo tivesse plantado na residência de são bento.

para mal dos nossos pecados, a senhora merkel manda mais na nossa economia, nos nossos orçamentos e na nossa dívida do que qualquer primeiro-ministro ou ministro das finanças luso. aliás, eles sabem-no e os candidatos laranjas ao lugar também – só não fica bonito reconhecê-lo. as lideranças nacionais estão de gatas ante as ordens e as recomendações de bruxelas, «porque esse é o único caminho»… mesmo que este, «o único», nos tenha trazido até aqui.

identificar o problema é começar a resolvê-lo: o país não tem saída se voltar a olhar para o seu umbigo, mas também não a encontra se continuar de joelhos nas reuniões onde se decide a política que nos atira para nova recessão.

o país precisa de uma liderança de combate e aliança para isolar a economia que dissolve em desemprego o projecto europeu – a política alemã. eis o meu voto para 2011: que o mundo do trabalho e os jovens se levantem por toda a europa contra a cegueira que a dirige.