Grades à entrada dos prédios contra sem-abrigo

Moradores e comerciantes da Avenida Almirante Reis têm vindo a colocar gradeamentos nas arcadas dos prédios nos últimos meses para impedir a permanência dos sem-abrigo na zona, uma medida feita, por vezes, sem o licenciamento da Câmara de Lisboa.

“a tensão é antiga, mas esta reacção dos residentes acaba por ser recente. houve um ou dois que instalaram e percebeu-se que era eficaz. a questão tem sido replicada por vários prédios e advinha-se que mais o venham a fazer no futuro”, admitiu à agência lusa o presidente da junta de freguesia dos anjos, joão grave.

é na proximidade da igreja e do refeitório dos anjos, onde diariamente se concentram dezenas de pessoas sem-abrigo, que também foi colocada a maioria destes gradeamentos. joão grave admite que possam ser cerca de dez os prédios que o têm vindo a fazer, desde há dois anos.

foi depois de ser assaltada, com recurso a uma faca, que eugénia leitão, proprietária de uma loja de mobiliário na almirante reis decidiu colocar um gradeamento, castanho e com pequenas aberturas, para impedir que se abrigassem na arcada.

o assalto – e a grade – coincidem com a mudança do gabinete do presidente da câmara de lisboa, antónio costa, para o intendente, que assinala dois anos no domingo.

“o presidente da câmara só se preocupou em limpar o sítio dele. empurrou tudo cá para cima. e aí nós aqui tivemos que tapar para nos proteger um bocadinho”, afirmou a comerciante de 61 anos.

já karim badrudin e os moradores que habitam paredes-meias com a loja de electrodomésticos que dirige colocaram o gradeamento há apenas três meses. hoje, os sem-abrigo ficam de fora. na arcada há vasos com plantas e colchões à venda.

“há muitos sem-abrigo por isso é que decidimos todos em conjunto no prédio mandar pôr as grades para não interferir e prejudicar o funcionamento do estabelecimento como a passagem das pessoas no acesso ao prédio”, conta o comerciante.

karim badrudin, que gere o negócio que os pais montaram na avenida há 30 anos, admite que o gradeamento “ajuda, mas que mesmo assim a avenida está cheia de sem-abrigo”, que “do intendente passaram para a almirante reis” e afectaram o negócio.

“é muito mau para o comércio e para as pessoas que andam na rua. as pessoas estão sempre com medo de serem assaltadas. a câmara não faz nada”, afirmou.

joaquim gonçalves, 80 anos, recentemente mudado para a almirante reis, defende que as grades “resolvem o problema perfeitamente e com pouco dinheiro”.

este reformado ainda não conseguiu convencer os vizinhos, mas admite que o prédio onde reside venha a ser brevemente mais um dos que têm grades à porta.

por sua vez, bruno reis, que é proprietário de um prédio na almirante reis, opõe-se à instalação de grades, que lhe tem sido pedida por inquilinos.

“os gradeamentos não são a solução. podem ser solução pontual e pode assegurar a circulação das pessoas inquilinas do prédio, mas no fundo só arrastam um problema para a galeria mais próxima. acho que temos de encontrar, junto das entidades competentes outro tipo de solução”, disse.

uma opinião semelhante tem o presidente da junta dos anjos: “a questão não se resolve impondo obstáculos, porque se não estiverem aqui estarão do outro lado da avenida, ou numa porta mais acima que ainda não tenha grades. nós estamos a empurrar o problema e não a tentar solucioná-lo”.

para joão grave, faltam apoios para “estimular a motivação para que estas [pessoas] procurem um outro estilo de vida”, no sentido de um projecto que a junta está a desenvolver.

à agência lusa, o vice-presidente da câmara de lisboa, manuel salgado, admitiu que “alguns destes gradeamentos têm licenciamento, outros não” e disse que está a ser feito um levantamento destas situações na avenida para regularizar a situação.

por seu turno, antónio costa, presidente da câmara de lisboa, sublinhou a existência de programas de apoio aos sem-abrigo promovidos pela autarquia.

lusa/sol