Incertezas – a única certeza no OE 2023 (e… na bola!)

A ‘cereja no bolo’ é o ministro Medina referir que tem margem para acomodar imprevistos. Sinceramente, não sei se já contava com as previsões do FMI para 2023, publicadas no passado dia 11, e que considero serem um autêntico ‘balde de água gelada’ ao referirem que o crescimento será de apenas 0,7% do PIB e…

1. Conforme prometido, o OE 2023 apareceu dentro dos prazos devidos e foi com alguma surpresa que se constata que os principais responsáveis pela sua elaboração tiveram presentes objetivos altamente ambiciosos que a direita não desdenharia subscrever, sobretudo em dois items (i) redução da dívida pública para 110,8% do PIB; e (ii) défice em 2023 de 0,9% do PIB. Pelo meio, a dupla Costa/Medina ousou considerar pressupostos tão agressivos como os 4% de inflação e o crescimento do PIB em 1,3%, vetores fundamentais para se atingirem os objetivos globais propostos, como se nota pelo saldo primário estrutural, o qual, segundo o ECO, irá ficar em 1,6%.

Os analistas profissionais falam em orçamento de contração e até o Público titulou que o ‘alívio fiscal será pago com poupanças nos apoios sociais’. Nos entretantos e para minha surpresa que julgava conhecer o mundo empresarial onde estive tantos anos, o Governo conseguiu, com alguma facilidade, assinar um Acordo com os seus parceiros sociais (exceção óbvia à CGTP que quer ter as ‘mãos livres’ para as suas incessantes lutas de rua), mesmo com aumentos salariais até 2026 que assustam qualquer PME, mas que os representantes das confederações patronais não tiveram pejo de assinar e cujas consequências conheceremos a prazo.

Tudo junto, um cenário idílico nos seus grandes números, com inequívocos apoios às famílias e empresas quantificados em Eur 4,5 MM, novos apoios à habitação ao permitir renegociações contratuais em certas situações quando as famílias terão ultrapassado a chamada ‘taxa de esforço’ e, pasme-se – um investimento superior ao de 2022 em quase 37% (Eur 8,6 MM), porventura a considerar as verbas do PRR. Como não há ‘bela sem senão’ a constatação de que os juros irão mesmo subir ao se considerar um gasto de Eur 6,8 MM (mais 8,2% do que em 2022 e veremos se ficarão por aqui).

A ‘cereja no bolo’ é o ministro Medina referir que tem margem para acomodar imprevistos. Sinceramente, não sei se já contava com as previsões do FMI para 2023, publicadas no passado dia 11, e que considero serem um autêntico ‘balde de água gelada’ ao referirem que o crescimento será de apenas 0,7% do PIB e a inflação será de 4,7%. A estes números, o FMI veio estimar a taxa de desemprego em 6,5% em 2023, face aos 5,6% estimados pelo Governo no OE e todas as diferenças terão de ter consequências. Adonde irá Medina buscar verbas para acomodar estas péssimas notícias?

Daqui até à aprovação final em 25 de novembro ‘muita água vai correr debaixo da ponte’, mas não acredito que esta versão sofra grandes alterações, até porque já foi um exercício de equilíbrios até aqui e o PS tem uma maioria no Parlamento. Talvez umas propostas da esquerda possam passar, a acalmar as ruas que são o grande receio deste Governo, mas, seguramente, das bancadas à direita tudo o que propuserem irá direitinho para o caixote do lixo. Vale uma aposta?

 

2. Umas breves linhas, num comunicado conjunto entre a Sporting de Braga SAD (Braga SAD) e a Qatar Sport Investments (QSI), anunciaram a compra de 21,67% do capital da Braga SAD e causaram estupefação, para não dizer enorme sobressalto, ao futebol indígena e, sobretudo aos grandes clubes portugueses, todos a tremer com esta notícia que pode mudar significativamente o panorama, leia-se ‘supremacia’, nos próximos anos.

Dinheiro não falta na QSI, como todos sabemos pelo investimento feito no PSG, pelo que os clubes nacionais, sempre aflitos com a escassez de recursos financeiros e, em particular, desde que o BCE ‘fechou a torneira’, olham com redobrado receio para este novo parceiro da Braga SAD. Será que a razão predominante desta decisão foi a de, realmente, a QSI ter um clube satélite do PSG ou, pelo caminho, já que aqui estão, metem mais uns dinheiritos (trocos para eles) e garantem presença certa na Europa e uns títulos pelo meio, intrometendo-se com facilidade na hegemonia partilhada atual do nosso futebol?

Os adeptos da Braga SAD rejubilam com a perspetiva de, finalmente, poderem ter meios para sonhar mais alto. Os adversários perguntam-se, muitos deles, quiçá os adeptos dos grandes também, porque não foram os escolhidos? Uma coisa é certa: os próximos tempos serão de curiosidade e receios (ou triunfalismo, consoante a perspetiva) e, então se a moda pega e vêm outros investidores a optar por investir em clubes fora dos três grandes, mas com massas associativas aguerridas, cada vez serão maiores as dificuldades de Benfica, Porto e Sporting.

 

P.S. 1 – Em entrevista ao Expresso, Francisca Van Dunen veio dizer algo que há muitos anos tenho dito e parece constituir pecado mortal ser referido, apesar de ser objetivamente uma verdade dura como punhos: «Um ministro não ganha para o que faz!». Obviamente que tem razão, assim como teria razão se alargasse esta verdade a tantos autarcas pelo país fora ou se se referisse aos deputados que trabalham (mesmo) em ‘full time’ no Parlamento e acrescentam valor ao país. Infelizmente, esta realidade de baixos salários na política é verdadeiramente endémica e ninguém parece querer corrigir por forma a que a carreira, de si tão nobre, se torne verdadeiramente atrativa para os talentos portugueses.

 

P.S. 2 – Quem conhece o Presidente Marcelo sabe que é um comunicador nato, mas pessoa cujo caráter é inquestionável e ‘à prova de bala’. Infelizmente, na sua ânsia de tudo comentar (quantas vezes a propósito de nada), de vez em quando saem frases altamente infelizes, como recentemente sucedeu no caso dos lamentáveis abusos sexuais, suscitando interpretações que são autênticos insultos à sua pessoa, com muito bem referiu António Costa. Será que lhe serve de emenda e o torne mais contido no verbo?