Juiz ‘absolvido’ de copy-paste

O Conselho Superior da Magistratura (CSM) recebeu, em Junho do ano passado, uma participação surpreendente: Filipe Fraústo da Silva, advogado especialista em Direito do Trabalho, deparara-se com um artigo assinado pelo juiz desembargador, Jorge Loureiro, da Relação de Coimbra, que era uma cópia de um texto seu, sobre o mesmo tema.

Fraústo da Silva, advogado há mais de 20 anos, já foi membro do Conselho Superior do Ministério Público, além de formador e júri em provas de acesso ao Centro de Estudos Judiciários (CEJ). Em Junho de 2013, deu conta que um artigo assinado por Jorge Loureiro – 'O controlo jurisdicional da decisão do despedimento colectivo', publicado no site do CEJ e no Prontuário de Direito do Trabalho desta escola, com data de 2012 – era em grande parte (40%) uma cópia de um estudo seu, de 2009, intitulado 'Observações acerca da selecção social no procedimento de despedimento colectivo', publicado no site do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e numa revista da especialidade.

O texto do magistrado tinha longas transcrições de partes do artigo de Fraústo da Silva (inclusive notas de rodapé, algumas destas com dados alterados, como datas e remissões), sem nunca referenciar o seu nome. 

O advogado alertou Barbas Homem, director do CEJ (que entretanto retirou o artigo do site), e levou o caso ao Conselho da Magistratura. Este órgão instaurou um processo disciplinar e deu conhecimento do caso à Procuradoria-Geral da República, que abriu um inquérito no STJ, por estar em causa eventual crime de contrafacção. Em ambos os processos, concluiu-se que, de facto, estava-se perante uma cópia – mas que não há razões para sancionar o desembargador, aceitando-se como boas as suas explicações.

No processo, Jorge Loureiro, que é um dos responsáveis pela Colectânea de Jurisprudência, invocou que estava “convicto” de que o artigo era de um juiz seu amigo, Azevedo Mendes, que o autorizara a usá-lo. Tudo começara, alegou, quando este seu colega – com quem tem uma relação profissional e de amizade há muitos anos – o convidara a ser orador numa acção de formação para magistrados, em Coimbra. Para elaborar o texto da intervenção, recolheu “diversos elementos de estudo”, entre os quais “um texto incompleto que lhe foi facultado por Azevedo Mendes”, com anotações deste “nas margens” – que o levaram a pensar que era da sua autoria e que este o autorizava a utilizá-lo na sua intervenção, “sem necessidade de especificamente o indicar como autor”. E, face à “sobrecarga de trabalho” que tinha nessa altura, “optou praticamente por utilizá-lo, por copy & paste”. Azevedo Mendes corroborou a versão, dizendo que “em momento algum lhe referiu que o texto era de Fraústo da Silva ou de qualquer outro autor”.

Tudo conjugado e tendo em conta até as “regras da experiência comum”, o inspector do CSM  propôs o arquivamento do caso – o que seria aceite por aquele órgão, depois de o Ministério Público no STJ ter arquivado o seu inquérito (concluindo que não houve dolo por parte do juiz). O Prontuário de Direito do Trabalho do CEJ publicou, entretanto, um pedido de desculpas de Jorge Loureiro.

paula.azevedo@sol.pt