Maduro à espera do embate

Depois de a coligação dos partidos da Oposição, Mesa da Unidade Democrática (MUD), ter rejeitado o convite de Nicolás Maduro para uma conferência nacional de paz na quarta-feira, este escuda-se em comícios com operários, camponeses, pescadores. As classes mais humildes da sociedade venezuelana ainda não deixaram cair o Presidente, fortemente contestado nas ruas nas últimas…

“Não é o momento nem para ouvir discursos nem sequer para que apareçamos num torneio de retórica, perante o olhar de um país que se debate entre a ira e a angústia”, anunciou em comunicado a MUD.

A reunião no palácio presidencial juntaria Governo, oposição, presidentes de Câmara, governadores, juristas, empresários, Igreja Católica, mas apenas estes dois últimos grupos confirmaram a presença.

Com Leopoldo López, dirigente do partido Vontade Popular, detido há mais de uma semana numa prisão militar acusado de destruir bens públicos, outro líder da oposição reforçou o porquê da ausência no encontro com Maduro: “Estamos a favor da paz e do diálogo, mas não vamos fazer parte de uma farsa”, sublinhou à Rádio União Henrique Capriles, do partido Justiça Primeiro.

A oposição não fecha a porta ao diálogo mas exige, em persistentes manifestações, a libertação de centenas de detidos nos protestos, o desarmamento das milícias pró-Governo, a presença de um mediador nacional ou internacional – a juntar aos motivos iniciais da contestação: inflação galopante, escassez de bens de primeira necessidade, criminalidade, desemprego.

No dia da conferência nacional de paz, Nicolás Maduro falou para centenas de camponeses num comício. Alertando para a tentativa de um golpe de Estado que diz estar em curso no país, orquestrado por grupos “fascistas”, o Presidente inflacionou o número de vítimas mortais das últimas duas semanas, garantindo haver “mais de 50 mortos em resultado dos bloqueios de estradas e barricadas”.

A que fonte o chefe do Estado foi buscar estes dados ele não revelou. A oposição diz haver pelo menos 15 mortos e a procuradora-geral Luisa Ortega fixou o número em 13 na segunda-feira. A ONG de direitos humanos Foro Penal Venezuelano documentou 18 casos de tortura sobre jovens detidos nas manifestações.

Mas a maré pode estar a mudar. Oito agentes do Sebin, Polícia política, foram presos esta semana, acusados de matar manifestantes durante os protestos – mortes inicialmente atribuídas pelo Governo aos agitadores. Um veterano do Partido Socialista Unido da Venezuela, no poder, criticou abertamente o modo como Caracas está a lidar com a contestação: o governador do estado de Tachira considerou “inaceitável” o envio de tropas para a região e condenou “o uso de armas e o comportamento abusivo em manifestações pacíficas”.

Em resposta à ordem de Maduro para expulsar três diplomatas americanos, os EUA deram o troco na mesma moeda esta terça-feira, refutando acusações de instigar os protestos na Venezuela. Ontem estava marcada uma reunião da Organização dos Estados Americanos – a que pertencem os países de Maduro e Obama – em que seria debatida a violência na Venezuela. Caracas já fez saber que quer resolver o problema à sua maneira e que a OEA, dominada por Washington, não é o foro indicado para discutir a questão.

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