Notários recusam fazer inventários por 100 euros

A nova lei que transfere dos tribunais para os cartórios notariais a competência para elaborar processos de inventário e partilha de bens, em casos de herança ou divórcio, entra em vigor na próxima segunda-feira. Muitos notários, porém, prometem recusar esse trabalho, devido à tabela de honorários fixada pelo Ministério da Justiça, que dizem ser “complexa…

o ministério da justiça (mj) diz que a aplicação da lei vai ser avaliada, com vista a eventuais alterações, tendo sido constituído um grupo de trabalho.

a atribuição dos inventários aos notários é uma das medidas que visam retirar dos tribunais actos e processos em que a intervenção dos juízes se considera desnecessária. a partir de segunda-feira, os tribunais só intervêm em questões complexas destes processos.

segundo a lei, os cartórios terão de dar prioridade aos inventários. e, a par de toda a regulamentação para o devido processamento, prevê-se uma tabela de honorários que varia consoante o valor dos bens em causa. até dois mil euros, os notários só poderão cobrar 102 euros (mais iva) e entre 100 mil e 150 mil euros, por exemplo, os honorários serão de 1.020 euros. os notários argumentam que a grande maioria das heranças está nos escalões mais baixos, sendo que os pagamentos previstos não compensam o trabalho que terão. além disso, se os herdeiros não tiverem posses, poderão beneficiar de apoio judiciário, que terá de ser coberto por um fundo, alimentado por uma parte das receitas recebidas pelos notários nos processos de inventário.

entre os notários, está a correr uma carta aberta e uma recolha de assinaturas para uma assembleia geral extraordinária da ordem. na carta, considera-se que o novo regime é “um exercício de degradação profissional”: “o ministério da justiça não pode, unilateralmente, estabelecer os honorários de um profissional liberal, mesmo quando ele exerce funções públicas, sem o seu acordo”, afirma-se.

ao sol, o bastonário dos notários diz que a lei tem “problemas, que não terão sido intencionalmente criados pelo mj, mas que, a manterem-se, poderão representar o insucesso desta reforma legislativa”. joão maia rodrigues explica que, nas conversações com o mj, a ordem “aceitou manter os valores actualmente cobrados nos processos de inventário” nos tribunais – o que faria com que todas as despesas e honorários iriam regular-se pelo regime de custas judiciais dos tribunais. mas que o mj acabou por limitar-se a transpor os valores deste regime, “sem importar todo o quadro normativo previsto nesse regulamento das custas, o que acarretou desacertos, lacunas e dúvidas de interpretação”.

“deve ser assegurada a justa remuneração do trabalho dos notários”, reconhece o mj em nota enviada ao sol, mas salientando que desde o início “esteve sempre fora de questão que a remuneração excedesse o que actualmente é suportado pelos cidadãos”.

paula.azevedo@sol.pt