Nottingham. A magia da floresta

Um fenómeno: com um único título de campeão inglês, o Forest foi duas vezes campeão da Europa. Agora, o vencedor será outra vez inglês.

Será no Porto a decisão da Liga dos Campeões e é certo que o vencedor deste ano falará inglês, já que na disputa decisiva estarão presentes Manchester City e Chelsea. Pouco dados a misturas – por algum motivo os franceses dizem que o bom Deus os enfiou a todos numa ilha – os britânicos têm a Turquia na lista vermelha dos contactos contagiosos pelo que mandar dois clubes ingleses para Istambul seria como mandar um elefante fazer habilidades numa loja de porcelanas. No seu estilo essencialmente prático, agora que parecem ter de novo confiança em Portugal e no controlo da pandemia por parte dos portugueses, sugeriram à UEFA que a final da Liga dos Campeões se mudasse aqui para o retângulo à beira mar plantado e, assim sendo, eis-nos a receber pelo segundo ano consecutivo o jogo mais importante da Europa de clubes. 

Lembram-se os mais velhos que esta coisa de a Taça dos Campeões ser para qualquer pé rapado que se qualifique em quarto lugar de um campeonato da Europa dos ricos não fazia sentido nos anos 80. Para a Taça dos Clubes Campeões Europeus qualificavam-se os campeões de cada país e permitia-se ao vencedor da prova do ano anterior que, independentemente do lugar em que ficasse na tabela interna, se apresentasse em fato de gala para defender o título. O assunto não admitia discussões. E, por esse motivo, o Nottingham Forest é o único clube que pode apresentar na folha de serviços uma única vitória no campeonato inglês e duas na Taça dos Campeões.

Como um velho carvalho
O Forest, como lhe chamam os adeptos, é velho como os carvalhos das florestas de Nottinghamshire. Fundado em 1865, teve tempo para ver o mundo dar muitas voltas. Naturalmente, a ideia da sua existência nasceu num pub, o Clinton Arms, e os bebedolas que anunciaram a sua vinda à companhia do vizinho Notts County (1862, clube mais antigo do mundo!) decidiram que iriam apresentar-se nas reuniões de direção com uns berrantes chapéus garibaldinos, vermelhos da cor do sangue, em homenagem a esse incomparável revolucionário que foi Giuseppe Garibaldi.

A primeira grande conquista do Forest deu-se na época de 1897-98, quando arrancaram a Taça de Inglaterra das mãos dos seus grandes rivais de sempre, o Derby County, vencendo por 3-1 a final disputada no Crystal Palace, de Londres. Mas avancemos no tempo, já que o tema é outro e não o de mergulhar nas profundezas da história desta agremiação alegremente conotada com as proezas de Robin dos Bosques e sua pandilha, João Pequeno, Frei Tuck e o diabo a quatro, nomes que se perpetuam nas ruas e nas praças da simpática cidade de Nottingham.

Em 1976-77, o Liverpool dominava a Taça dos Campeões com um futebol envolvente e muito pouco conservador no que ao mítico kick-and-rush diz respeito. Tal como Mat Busby fizera no Manchester United dos anos 50 e 60 (conseguindo ressuscitar uma equipa que se perdeu quase por completo no desastre aéreo de Munique), Bill Shankly percebeu que copiar o que faziam os escoceses, ou seja, manter a bola mais tempo junto à relva do que tentar despachá-la para o mais alto e mais longe possível, iria trazer resultados aos seus moços de Anfield. Trouxe. E de que maneira.

Ora bem, nesse mesmo ano, um jovem chamado Brian Clough, que tinha tido o atrevimento de fazer do pequenino Derby County campeão de Inglaterra em 1971-72, com apenas 36 anos, trouxe de volta o Forest à divisão principal. Não contente com o feito, foi logo campeão no ano seguinte, e continuando insatisfeito, logo na primeira intervenção do Nottingham Forest na Taça dos Campeões, tratou de despachar o Liverpool (2-0; 0-0), o AEK de Atenas (5-1; 2-1), o Grashoppers (4-1; 1-1) e o Colónia (3-3; 1-0), numa caminhada até à final de Munique na qual ganhou aos suecos do Malmö por 1-0, golo da sua principal estrela, Trevor Francis.

Nunca se tinha visto nada do género – até então, o Forest passara como cão em vinha vindimada pela Taça das Feiras em 1961-62 e 1967-68 sem passar da segunda ronda.

Clough e o Forest não conseguiram repetir o êxito interno – o melhor que arranjaram foi um segundo lugar em 1978-79 – mas voltaram a ser campeões da Europa, batendo o Hamburgo por mais um 1-0 na final de Madrid, golo de um extremo-esquerdo assim para o gorducho chamado Robertson, e garantindo um lugar único na história do futebol da Europa. No Porto, daqui a 15 dias, Chelsea e City bater-se-ão pela Liga dos Campeões, sendo que nenhum foi campeão no ano anterior. Como diria o Bob Dylan: The Times They Are A-Changin’.