Políticas activas de desemprego

Uma sociedade só é mais justa se não condenar partes importantes da população em idade activa ao desemprego.

os actuais dirigentes do partido socialista detêm uma vastíssima experiência política e governativa, só comparável à correspondente responsabilidade da situação catastrófica a que conduziram portugal.

de facto, são as mesmas pessoas que se gabavam, já lá vão dez anos, de ter conseguido para portugal uma taxa de desemprego de 4%, virtualmente (acima) de pleno emprego, função das suas políticas de estímulo permanente do consumo público e privado. quando eu e uma série de outros economistas apontávamos a insustentabilidade da trajectória de evolução salarial bem acima do crescimento de produtividade e a necessidade de ajustar as regras do mercado de trabalho aos imperativos da concorrência internacional e do interesse das novas gerações de trabalhadores, respondiam sempre com a façanha (transitória, como se provou) da baixa taxa de desemprego conseguida. apesar dos avisos, da teoria económica, da prática dos nossos concorrentes, da crescente dualidade do mercado de trabalho e da perda de competitividade espelhada no défice externo crescente.

7 pontos percentuais mais tarde, e com mais umas centenas de milhar de desempregados no curriculum, o executivo socialista vê-se finalmente forçado a admitir o que sempre recusou. mesmo que se trate de mero fingimento (espero, por uma vez, que não), o facto é que assinou o compromisso de, finalmente, pôr em prática o que tantos têm, ingloriamente, recomendado.

o acordo celebrado entre o executivo socialista e o triunvirato representativo dos nossos credores contempla, de entre um conjunto de profundas alterações estruturais, uma série consistente de iniciativas dedicadas ao mercado de trabalho, reflectindo a percepção de muitos de nós sobre a dualidade do mercado de trabalho português.

a rigidez da legislação laboral levou o nosso país a estabelecer vários máximos pouco honrosos: de facto, portugal é o país da união europeia em que a duração média do desemprego é a mais longa, tem a mais baixa taxa de criação de ofertas de emprego e regista o maior peso de trabalho temporário. este péssimo resultado decorre do conservadorismo com que os políticos abordaram o tema das relações de trabalho. só com a assinatura do memorando de entendimento se aproxima, ainda que de forma contida e gradual, a legislação portuguesa à legislação europeia.

por outro lado, há no memorando de entendimento uma preocupação transversal em conter ou diminuir os custos do trabalho, tendo em conta que o seu desalinhamento face à produtividade gerou um aumento permanente de desemprego ao longo da última década. concretamente, impõe a redução da taxa social única, a redução da remuneração das horas extraordinárias, o congelamento do salário mínimo e dos aumentos salariais dos funcionários públicos, redução das indemnizações por despedimento e redução do montante e duração do subsídio de desemprego.

espera-se que a desvalorização fiscal tenha um efeito benéfico sobre o emprego. como indicou o professor pedro portugal na avaliação do plano de reforma estrutural subscrito pelo governo e parte da oposição, tomando um valor consensual para a elasticidade da procura de trabalho, uma diminuição real dos custos de trabalho de 10% poderá, no longo prazo, representar um crescimento de (até) 5% do emprego. uma sociedade só é mais justa se não condenar partes importantes da população em idade activa ao desemprego. é por isso que não entendo porque é que a nossa esquerda – quer a ‘moderna’, quer a festivo-caviar, quer a jurássica – insista no oposto, isto é, em verdadeiras políticas activas de desemprego.