Prosa inédita de Álvaro de Campos publicada na próxima segunda-feira

A prosa completa de Álvaro de Campos, alguma da qual até agora inédita, foi pela primeira vez reunida em livro e chega às livrarias na próxima segunda-feira, numa edição da Ática, disse à Lusa fonte do grupo Babel.

são mais de 40 textos inéditos de álvaro de campos, «talvez o mais popular heterónimo de fernando pessoa», como escreveu no prefácio da obra o coordenador da nova série de obras de fernando pessoa, jerónimo pizarro, que assina com antonio cardiello a edição deste volume, com a colaboração de outro investigador pessoano, jorge uribe.

para o investigador, a publicação, pela primeira vez, da prosa completa de álvaro de campos é «um acontecimento editorial tão relevante quanto a primeira publicação de ‘o livro do desasocego’, há exactamente 30 anos».

e porquê? porque «campos foi a personagem mais activa, interventiva e penetrante criada por pessoa e a única que deixou uma prosa de uma dimensão idêntica à que se encontra no ‘livro do desasocego’ [conforme o título original, publicado em 1982]», explica o professor da cátedra de estudos portugueses do instituto camões na universidade dos andes, em bogotá, colômbia.

«afinal – prossegue -, a prosa tardia de campos é contemporânea da prosa tardia do ‘livro’ e ambas foram escritas pelo mesmo autor quando este havia já atingido um raro domínio da sua arte. para mais, foi o próprio pessoa quem afirmou que o seu semi-heterónimo bernardo soares se assemelhava em ‘muitas coisas’ ao seu heterónimo álvaro de campos».

o que esta obra demonstra é que álvaro de campos – apesar de mais conhecido como «o ‘dandy’ de estirpe maldita que escreveu alguns dos grandes poemas metafísicos das literatura portuguesa, retratando-se como um vencido, como um falhado, como um marginalizado, como ‘um cão tolerado pela gerência’» – foi também um prosador, embora esse facto tenha sido «algo negligenciado, até pelo próprio pessoa», observa jerónimo pizarro.

segundo o investigador, «campos, o prosador, é fundamentalmente um escritor contemporâneo de [barão de] teive e [bernardo] soares, que são as outras duas máscaras sob as quais pessoa escreveu alguma da melhor prosa portuguesa do século xx».

além da publicação dos inéditos do engenheiro naval nascido em tavira, em 1890, este volume apresenta uma reorganização da sua prosa e uma nova leitura de textos anteriormente publicados, com destaque para uma nova proposta de edição das ‘notas para a recordação do meu mestre caeiro’, considerado «o projecto literário mais elaborado, extenso e de maior importância de toda a prosa de campos».

destaca-se também o texto 26 [definições], em que pessoa descreve, através de curtas definições, autores célebres, como mallarmé, rousseau, goethe, shakespeare, milton, montaigne, homero, nietzsche e camões, a que se junta a reprodução de duas folhas manuscritas pelo autor.

eis alguns exemplos: ‘rousseau: ça m’est inégal’, «shakespeare: tudo, exceto o todo’, ‘milton: a cada anjo a sua queda’ e «homero: então, júpiter poz-se de pé’.

a obra inclui igualmente uma nova leitura e organização da entrevista concedida por campos, «atendendo, primeiramente, a que este género serviu a caracterização de pessoa e seus heterónimos enquanto autores, já que pessoa, caeiro e campos deixaram entrevistas que eles próprios forjaram, com ou sem o concurso de outras pessoas reais ou sonhadas», indica jerónimo pizarro.

no mesmo dia em que chega às livrarias, segunda-feira, a obra será lançada às 18h30, no espaço fabrico infinito, no príncipe real, em lisboa, com apresentação do escritor e professor universitário onésimo teotónio almeida.