Robótica. A tecnologia que vai revolucionar o mercado de trabalho

Há quem acredite que a robótica vá reduzir os postos de trabalho, mas a opinião não é unânime. O i falou com especialistas que admitem que o emprego poderá aumentar

As revoluções tecnológicas têm sempre impacto no mercado de trabalho e as perspetivas não são animadoras. De acordo com vários estudos, a introdução de novas tecnologias e a robotização do processo produtivo vão determinar uma redução significativa do número de empregos. Ainda assim, há divergências em relação ao prazo, ao número de empregos que serão afetados e até mesmo em relação à plausibilidade destes prognósticos.

Mas entre alguns dos participantes do Congresso Internacional Labour 2030 – Rethinking the Future of Work, que decorreu no final da semana, no Porto, há a convicção de que serão mais as oportunidades do que as dificuldades trazidas pela tecnologia.

“Sempre que surgem processos de industrialização surgem novas oportunidades de emprego. Acho que não há que temer esta revolução tecnológica. Tem é de se adaptar a capacidade de trabalho das pessoas à nova realidade tecnológica”, diz ao i Pedro Marinho Falcão, advogado e membro da Law Academy.

“A História é o melhor professor que nós temos. E com a História conseguimos perspetivar o futuro. Em todas as revoluções industriais e tecnológicas por que já passámos, conseguimos ver que o saldo líquido do emprego aumentou sempre”, lembra Eduardo Castro Marques, presidente da AJJ e um dos organizadores do congresso.

O responsável admite que, apesar de muitos considerarem que vem aí um “robôcalipse’ que vai terminar com os postos de trabalho, a História mostra uma realidade diferente. “Sempre que o mundo avançou, criou mais emprego. É evidente que alguns se perderam, mas sem dúvida que o saldo líquido é positivo”, acrescenta ao i.

Ewan McGaughey, académico do King’s College, tem a mesma perspetiva, recorrendo também à História para provar esse cenário. “Haverá sempre algum período de transição, mas a tecnologia trouxe sempre respostas e vai continuar a fazê-lo”, sustenta. Ao i, o investigador diz que o “exemplo mais interessante que vai ao encontro desta teoria é aquele de que não se está à espera, que é a máquina de lavar roupa”.

Segundo Ewan McGaughey, “a máquina de lavar roupa é, provavelmente, a peça mais incrível de tecnologia de poupança de trabalho no século xx” porque fez com que “dois ou três mil milhões de pessoas deste planeta, a maioria mulheres, que durante oito horas por dia todos os dias da semana tratavam da roupa, deixassem de o fazer”.

Ganhos de tecnologia O académico defende ainda que a máquina de lavar louça foi “fantástica para o desenvolvimento humano porque as pessoas em casa puderam beneficiar dos ganhos desta tecnologia”. E daí que a “política seja tão importante para assegurar que os ganhos da tecnologia sejam para todas as pessoas”.

A questão está em como conseguir esta política, uma vez que, lembra Eduardo Castro Marques, “com a robótica, em princípio, teremos mais produtividade e, com essa maior produtividade, teremos mais lucro, e só nessa altura é que irá surgir a discussão sobre a distribuição da riqueza”. Uma das soluções pode passar pela tributação dos robôs.

Aliás, esta é uma discussão que se está a fazer um pouco por todo o mundo e que neste congresso foi também central. “Sou contra a tributação do robô enquanto contribuinte, mas não me choca que haja um aumento da receita fiscal que incida sobre as empresas que empregam um maior número de unidades robóticas”, admitiu Pedro Marinho Falcão.

Já Ewan McGaughey não afasta a ideia de taxar as empresas que recorram a robôs. “Não sou um especialista e a ideia de podermos taxar os donos dos robôs poderia ser muito boa. Faz todo o sentido assegurarmos que as grandes corporações que sejam donas de robôs, ou os donos de grandes participações que detêm capital paguem uma taxa progressiva de imposto sobre empresas ou sobre ganhos de capital”, salienta.

Mas para que haja uma solução viável, Pedro Marinho Falcão defende que “haja uma convergência das autoridades comunitárias no sentido de haver uma legislação que seja uniforme para todos os países”, uma vez que é impossível para um país “tributar as empresas que têm mais robôs” quando noutro houver “uma legislação que não tributa ao mesmo nível”.

O advogado defende que “no momento em que nos encontramos, o esforço da carga fiscal que incide sobre as empresas de dimensão tecnológica mais desen-volvidas tem de ser um esforço de adoção comunitária e, depois, um esforço de adoção de todos os Estados-membros”, evitando-se assim que “haja deslocalização das empresas movida por interesses de natureza meramente fiscal”.

Proteção de dados Além da robótica foram diversos os temas que estiveram em discussão na Alfândega do Porto. Segundo Eduardo Castro Guedes, uma das questões mais requisitadas foi o regulamento da proteção de dados aprovado pela União Europeia e que vai entrar em vigor em maio de 2018.

Um dos desafios é “percebermos, entre outras coisas, se o trabalhador, no momento da cessação do contrato de trabalho, tem ou não o direito de exigir que o empregador apague todos os dados que foi deixando ao longo da relação”, diz o presidente da AJJ. “Há um rastro digital, um rastro de big data que hoje deixamos em qualquer organização por que passamos e isso é uma informação privilegiada que as entidades acabam por possuir. Portanto, essa discussão é importante”, afirma.

E a questão coloca-se também ao contrário. “Será que com esta informatização, esta gestão de informação e de dados, estará o empregador seguro com os dados que o trabalhador possui?”, questiona. “Seja para efeitos de concorrência, seja para efeitos comerciais, abre-se aqui uma caixa de Pandora muito grande, e a discussão é feita nas duas vias: seja pelos olhos do trabalhador, seja pelos olhos do empregador”, sustenta.

O grande desafio e o denominador comum são conseguir um bom enquadramento legal para o emprego futuro.