Romano Prodi: ‘Porque se ataca o euro e não o dólar?’

A crise da dívida europeia é sistémica mas isso deve-se à falta de implementação de uma política económica comum e à mudança do ambiente político europeu, hoje mais «populista», afirmou Romano Prodi.

«quando fizemos o euro era nossa vontade implementar decisões comuns de política económica, mas isso não foi feito», disse o antigo dirigente, questionado pela lusa em barcelona sobre a actual crise na zona euro.

ao mesmo tempo, afirmou, o ambiente político mudou, tornando-se «mais populista», esquecendo-se de dar os passos necessários para «proteger o euro como tem que ser protegido».

prodi está hoje em barcelona onde, à noite, apresenta o novo livro de jordi pujol, o ex-presidente da generalitat (governo regional da catalunha), intitulado semear, trabalhar e colher – escritos de reflexão e de agitação que reúne textos que escreveu entre 2005 e 2011.

os dois ex-líderes mantiveram hoje um encontro prévio à apresentação, com um pequeno grupo de jornalistas, com quem analisaram a situação europeia, tendo prodi deixado duras críticas à falta de solidariedade e de acção conjunta na europa.

prodi recordou que quando participou nos debates de criação do euro, ele próprio defendeu a criação de estruturas de controlo das contas públicas dos estados da zona euro – «que pelo menos o eurostart controlasse a aritmética das contas, mesmo que não o conteúdo».

«mas foram a frança e a alemanha que disseram que não. que isso seria controlar a sua soberania. essa é a verdade», afirmou.

hoje a situação agravou-se ainda mais, por ter «começado o medo» e porque a europa «não criou instrumentos que sempre se disse seriam indispensáveis».

«há medo de tudo: do imigrante, da globalização, dos chineses, de tudo. e agora a liderança europeia tem, acima desses medos todos, o outro medo, de perder eleições», afirmou.

para prodi é vital que a europa crie mecanismos mais fortes – como as ‘eurobonds’ [títulos de dívida europeus] ou algo equivalente – e um grande fundo que sirva de barreira de defesa.

«porque se ataca o euro e não o dólar? porque estamos divididos», afirmou, recordando que quando era presidente da comissão europeia já disse que «o pacto de estabilidade é estúpido, se não tiver outros instrumentos».

o ex-primeiro-ministro visou ainda directamente a alemanha, considerando que hoje é o país mais interessado na protecção do euro «não por caridade, mas por mera sobrevivência».

«a verdadeira china do mundo é a alemanha, proporcionalmente, claro. a alemanha tem 197 mil milhões de excedente. nunca tiveram isso antes porque nós estávamos sempre a desvalorizar as nossas moedas», considerou.

questionado sobre o porquê dos países com maiores problemas financeiros não saírem do euro, prodi insistiu que continua a sentir «orgulho» de ver a criação do euro e a entrada da itália na moeda única.

«poderíamos desvalorizar a moeda. mas economias baseadas na desvalorização das suas moedas estarão sempre viradas para o passado, sem inovação», considerou.

«para que o euro funcione continuamos a ter que ter instrumentos que defendam o euro», concluiu.

lusa/sol