Superior. Alunos do profissional canalizados para politécnicos

Alunos que terminem o 12.º ano no profissional e queiram entrar nos politécnicos vão ter novo concurso de acesso com provas de ingresso e vagas específicas. A sugestão vem do grupo de trabalho que está a rever as regras de entrada no Ensino Superior.

Os alunos que terminem o 12.º ano através do ensino profissional vão ter um novo concurso, com vagas e exames diferentes, para entrarem no ensino superior politécnico. As novas regras deverão entrar em vigor no próximo ano e serão aplicadas também aos alunos do ensino artístico.  

Desta forma os institutos politécnicos passam a ter regras diferentes das universidades no acesso ao Ensino Superior.
Esta é uma das principais propostas que consta no relatório que avalia e sugere alterações no acesso ao ensino superior – a que o SOLteve acesso – que foi redigido pelo grupo de trabalho nomeado pelo ministro da Ciência e do Ensino Superior, Manuel Heitor.

Na prática, os alunos que terminem o secundário na via de ensino profissional e que queiram entrar num politécnico vão deixar de realizar os exames nacionais. Estes alunos passam a ser selecionados através de outras provas de ingresso que, à partida, serão aplicadas a nível nacional. Mas há ainda a possibilidade – está em discussão – de atribuir liberdade a cada politécnico para desenhar parte da prova aplicada a estes estudantes, com questões de contexto local. 

Além disso, estes estudantes vão ter um contingente de vagas específico em cada curso, um número que será definido por uma quota do total de lugares disponíveis para cada licenciatura. 
Caso os alunos do profissional queiram candidatar-se a uma universidade mantém-se as regras em vigor: terão de realizar os exames nacionais que são aplicados aos estudantes da via regular de ensino e sem o contingente específico de vagas.     

O presidente da Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNAES), João Guerreiro, responsável pelas regras no acesso ao Ensino Superior, reconhece ao SOLque «há uma canalização» de alunos do profissional para os politécnicos mas, «que não é obrigatória». E a adaptação das regras apenas para os politécnicos passa pela «clara vocação profissionalizante» destas instituições de ensino superior, acrescenta João Guerreiro, que é também o coordenador do grupo de trabalho.  

Com estas novas regras, ficam «definidas condições específicas para cada percurso e perfil dos alunos», sublinha o presidente da CNAES. 

Nos últimos anos, explica ainda João Guerreiro, o número de estudantes do profissional «tem vindo a aumentar e, hoje, representam cerca de 45% do fluxo de alunos que terminam o secundário» com uma «tendência de chegar a 50%». Menor expressão têm os alunos do ensino artístico: em média «apenas 500 seguem para o ensino superior». 
Mas é, por isso, necessário «aumentar a equidade no acesso ao Ensino Superior e adaptar o concurso nacional que está formatado para a formação científico-humanística, não tendo havido uma preocupação em ajustar os percursos dos alunos», justifica João Guerreiro.  

Quanto às provas de acesso para estes alunos, o presidente da CNAES lembra que, apesar de estar em debate a possibilidade de cada politécnico poder adaptar parte da prova, a Lei de Bases do Sistema Educativo prevê que «tem de haver uma articulação a nível nacional» das provas de ingresso. Qualquer alteração «implica uma alteração à Lei de Bases», salienta.

O relatório do grupo de trabalho será agora alvo de discussão pública durante os próximos meses e na próxima semana o grupo vai ao Parlamento debater as sugestões que constam do relatório. 
O ministro já fez saber que só irá fazer alterações às regras no acesso ao ensino superior caso exista «um consenso alargado na sociedade». Apesar de Manuel Heitor lembrar que o seu compromisso foi apenas de «lançar a discussão» pública sobre o regime de acesso às universidades e politécnicos, o governante não descarta a possibilidade de fazer «ajustes específicos» sem «tocar no regime de acesso que está estabilizado e consensualizado». 
Entretanto, o ministro já solicitou pareceres ao Conselho Coordenador dos Politécnicos (CCISP) e ao Conselho de Reitores (CRUP). 

Contactados pelo SOL, tanto os reitores como os presidentes dos politécnicos escusam-se a comentar o documento. 

Nota mínima de 9,5 valores Há três anos que os politécnicos têm vindo a reclamar a  alteração das regras ao Ensino Superior e chegaram, mesmo, a apresentar propostas ao anterior Governo que geraram polémica. 

A sugestão dos politécnicos previa eliminar a nota mínima de 9,5 valores exigida aos alunos para a candidatura ao Ensino Superior. Regra que se iria aplicar apenas aos politécnicos de forma «facultativa». 

Caso a proposta fosse aprovada, passaria a ser possível que um aluno entrasse num politécnico com nota negativa no exame nacional, da disciplina específica para a área do seu curso. Ou seja, no caso das Engenharias, por exemplo, um estudante que se candidate a um politécnico poderia ter menos de 9,5 valores nos exames nacionais de Matemática ou de Física. Desta forma, a nota final de candidatura do aluno passa a ser calculada entre a média do secundário, com uma ponderação de 50%, e a do exame nacional com os restantes 50%. Regra que, aliás, os politécnicos também queriam alterar para aumentar até aos 65% o peso da nota média do secundário.

Na altura, a proposta foi alvo de duras críticas e provocou uma rutura dentro do Conselho Coordenador dos Politécnicos (CCISP). De forma inédita, os três maiores politécnicos do País – Porto, Lisboa e Coimbra – bateram com a porta e pediram a suspensão da participação daquele que é o órgão máximo destas instituições. 
Também, na altura, os reitores avisaram que caso caísse a nota mínima de 9,5 valores teria de existir uma diferenciação de grau. Ou seja, os cursos deixariam de ser considerados como licenciaturas.   
Por tudo isto, João Guerreiro garante ao SOL que as sugestões dos politécnicos não foram acolhidas pelo grupo de trabalho e que não constam do relatório. «Era um tema polémico que foi muito criticado e não fazia sentido», diz o presidente da CNAES.

Justino defende critérios diferentes Para o ex-ministro da Educação e atual presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), David Justino, as notas dos exames nacionais do secundário não devem ser a porta de entrada nas universidades e politécnicos. A alteração às atuais regras e práticas no acesso ao ensino superior foi uma das doze recomendações do CNE dirigidas ao anterior ministro Nuno Crato para travar os «efeitos perversos da inflação de notas no secundário» e a «excessiva cultura da nota» pelas escolas e pelas famílias. Uma tendência que acaba por anular os «processos que promovem as aprendizagens». Na altura, David Justino alertou Nuno Crato para a natureza dos exames nacionais: «De acordo com a lei [da qual foi autor enquanto ministro da Educação] os exames nacionais servem para concluir o secundário e não foram concebidos para o acesso ao ensino superior». Por isso, continua, nas regras de seleção e de acesso dos alunos às universidades e politécnicos «deviam ser tidos em conta outros critérios». Um assunto, aliás, que está a ser analisado e discutido pelo CNE.